Rui Sá* | Jornal de Notícias |
opinião
Causou polémica, nas últimas
semanas, a injeção de mais 850 milhões de euros no Novo Banco.
A meu ver, pelas razões erradas:
o foco da polémica passou a ser a "mentira" de Costa, a
"traição" de Centeno, a "acusação" de Marcelo, e não o
essencial - mais 850 milhões de euros de dinheiros avalizados pelo Estado para
alimentar um banco privado, verba que entra diretamente nas contas do nosso
défice.
Naturalmente que, para os
responsáveis por este negócio (foram o PSD/CDS que decidiram a resolução do
BES) e PS (que vendeu, a preço zero, ao fundo norte-americano Lone Star, 75% do
banco), importa que a discussão seja em torno das questões paralelas - já me
custa mais ver o BE, na ânsia de cavalgar a espuma mediática, a também
valorizar o acessório.
Mas a pergunta de um milhão de
dólares é outra: se o Estado português tem de injetar no Novo Banco, todos os
anos (sim, ainda não terminou e para o ano há mais!...), centenas de milhões de
euros, então porque não assume o controlo do banco? Ou seja, pagamos para os outros
gerirem e, ainda por cima, e como se viu, para pagarmos salários pornográficos
aos seus gestores!
Mais vale, então, pagarmos,
gerirmos e impormos regras de gestão. Pelo que considero muito pertinente e de
enorme bom senso o facto de o PCP ter apresentado, mais uma vez, a proposta
para que o Novo Banco seja nacionalizado. Embora esteja cético relativamente
aos resultados, importa que cada um assuma, mais uma vez, as suas
responsabilidades.
Mas a pandemia pôs a nu outros
privilegiados para além dos bancos - os proprietários dos alojamentos locais! É
o que se depreende do programa Porto com Sentido que Rui Moreira, com o apoio
do PS, aprovou para salvar o alojamento local na cidade. Já aqui o abordei, mas
o que agora sei do mesmo ainda choca mais.
De facto, a Câmara vai alugar
alojamentos locais e, depois, subarrenda-os àquilo a que chama "classe
média". Na verdade, os apoios não serão dados às famílias, mas sim aos
proprietários de alojamentos locais, independentemente de estes serem pequenos
ou grandes proprietários, de terem recuperado fogos devolutos ou terem
expulsado os seus antigos arrendatários.
De facto, para estes, são só
benesses: um inquilino credível como a Câmara, o pagamento antecipado de rendas
(que pode ir até 60 meses), a isenção de IMI e a possível isenção de IRS e IRC
durante o período de aluguer. Para as famílias da "classe média" não
haverá apoios: um casal, se alugasse um T1 no centro do Porto a 520€ (valor de
referência máxima definida pelo município), só teria direito a subsídio de
renda se, em termos brutos, o seu rendimento mensal conjunto fosse inferior a
1274€ (ou seja, o salário mínimo para ambos)!... Uma vergonha, como a do apoio
aos bancos.
*Engenheiro