"MADEM-G15 está a provar do próprio veneno"
O Parlamento guineense não vai discutir o suposto aliciamento dos deputados da coligação governamental. Para a sessão extraordinária desta terça-feira não foi agendada a guerra aberta entre o PR e os órgãos de soberania.
Os deputados da Assembleia Nacional popular da Guiné-Bissau (ANP) voltam a renuir-se, nesta terça-feira (28.12), em sessão extraordinária para retificar e votar na globalidade o Orçamento Geral do Estado (OGE), já aprovado na generalidade a 9 de dezembro, apurou à DW.
A Comissão Permanente do Parlamento deixou de fora um eventual debate sobre a crise política e a crescente tensão entre o Presidente da República e o Parlamento, disse à DW África o vice-líder da bancada parlamentar do Movimento para a Alternância Democrática (MADEM-G15).
Nelson Moreira esclarece que a sessão extraordinária não é convocada para discutir a crise política e a "guerra aberta" entre o Presidente da República e os principais órgãos de soberania da Guiné-Bissau.
"Está fora de hipótese discutir outros temas. O Orçamento quando é agendado tem prioridade sobre os outros pontos. Além disso, único ponto que agendamos é a aprovação global e final do Orçamento Geral do Estado", disse o também membro da Comissão Permanente da ANP.
"Cabaz de Natal"
Assim, o Parlamento deixará de fora o debate sobre a denuncia feita pelo deputado do MADEM-G15, conhecido por "Nhiribui", de que alguns parlamentares dos partidos que formam a coligação governamental receberam o equivalente a quatro mil euros, supostamente dados pelo primeiro-ministro, Nuno Gomes Nabiam, como "Cabaz de Natal", depois de terem aprovado o OGE, evitando a queda do Governo.
O vice-líder da bancada de MADEM-G15, Nelson Moreira, estranha a atitude dos deputados que foram fazer queixa ao Presidente da República e alegadamente devolver o dinheiro em causa à Umaro Sissoco Embaló.
"Não vejo a necessidade dos deputados de partidos que estão a apoiar o Governo serem corrompidos, aliciados ou premiados para aprovar o Orçamento", afirmou Moreira que põe em causa a veracidade da denúncia dos parlamentares do seu próprio partido.
"Se fossem deputados da oposição talvez faria mais sentido a denuncia. Mas agora deputados que suportam a maioria? Duvido", disse.
Primeiro-ministro em silêncio
O primeiro-ministro, Nuno Gomes Nabiam, e o Partido da Renovação Social (PRS), um dos partidos acusados, não reagiram as acusações dos deputados afetos ao partido no poder.
Para o analista político, Rui Jorge Semedo, o Ministério Público (MP) e a Polícia Judiciária (PJ) deveriam investigar e responsabilizar criminalmente os infratores. Semedo diz ainda que Nuno Gomes Nabiam deveria prestar esclarecimentos.
"Se o primeiro-ministro não se pronunciar, como diz a língua, quem cala consente, tudo indica que realmente houve, sim, a compra de consciência. Daí que não ficar só no diz que diz. É preciso investigar o caso", defende o sociólogo guineense Rui Jorge Semedo.
No entender do analista, devido as fragilidades da justiça, o caso será esquecido e engavetado como tantos outros.
O Chefe de Estado ainda não disse que destino deu ao dinheiro supostamente devolvido pelos deputados. E os parlamentares não conseguiram responder porque aceitaram receber o dinheiro e só depois fizeram a denúncia e também não explicaram porquê que foram entregar o dinheiro ao Presidente da República e não à polícia de investigação criminal.
Sissoco vs. MADEM-G15
A verdade é que Sissoco Embaló está de costas voltadas com o partido que diz que ajudou a fundar e que suportou a sua candidatura à Presidência. Vários dirigentes e militantes do MADEM-G15 acusam o Chefe de Estado de traição e de abrir guerras desnecessárias contra o seu próprio partido.
O também conselheiro do Presidente da República, Nelson Moreira, é conotado com a ala do partido no poder que apoia Sissoco Embaló. Moreira sublinha que Sissoco não traiu o MADEM-15.
"Não sei se a traição é a palavra bem colocada para esta situação. Há desentendimento, há interpretações sobre determinados assuntos de forma diferente. O Presidente da República é um dos mentores do partido, por isso, não há como trabalhar de costas voltadas com o MADEM", afirmou o deputado do partido no poder.
A troca de acusações públicas entre o MADEM-G15 agravou-se no dia 14 de dezembro, quando o partido juntou-se a oposição para aprovar no Parlamento a resolução que declarou "nulo e sem qualquer efeito" o Acordo de Exploração da Zona Conjunta entre a Guiné-Bissau e o Senegal, assinado unilateralmente por Sissoco Embaló com o seu homologo senegalês Macky Sall.
Para o analista político Rui Jorge Semedo, o MADEM-G15 está a provar do próprio veneno.
"Foi o que aconteceu com o PAIGC, que resultou na dissidência dos 15 deputados que formaram o que hoje é o MADEM-G15. Há deputados do MADEM que aparentam ser mais fiéis às estratégias do Presidente da República, Sissoco Embaló, do que na verdade, ao compromisso com o partido. Foi o que aconteceu no passado quando os 15 deputados eram mais fiéis ao ex-Presidente José Mário Vaz do que a direção do partido".
Rui Jorge Semedo lembra que a infidelidade partidária não é de hoje na Guiné-Bissau e faz parte da falta de coerência política dos atores. Semedo diz é um dos fatores da crónica instabilidade governativa e alerta que poderá provocar a queda do Parlamento muito em breve.
Braima Darame | Deutsche Welle
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