Cândida Almeida | Jornal de Notícias | opinião
O processo BES entrou na fase de instrução a requerimento de alguns dos arguidos. Os advogados, que genericamente preenchem bem a sua quota de críticas à morosidade do processo criminal, acabam também por contribuir para essa demora ao requererem, para a fase de instrução, múltiplas diligências irrelevantes e que os juízes aceitam com uma dose excessiva de complacência, excedendo a finalidade desta fase processual.
Com efeito, a instrução visa exclusivamente a comprovação ou infirmação da decisão acusatória (ou de arquivar o inquérito) em ordem a submeter, ou não, a causa a julgamento. Como expressamente dita a lei, o requerimento de abertura de instrução, não obstante não obedecer a formalidades especiais, deve conter, em síntese, as razões de facto e de direito da discordância relativamente à acusação, indicando os meios de prova que não tenham sido considerados no inquérito, bem como os factos que se pretende provar contrariando a decisão acusatória. Não podem ser indicadas mais de 20 testemunhas, mas por cada arguido, o que, nos casos dos processos mais complexos, com dezenas de arguidos, arrasta por meses o prazo previsto para a realização da instrução. Também não são admissíveis testemunhas de abonação, mas, por vezes, são inquiridas algumas, não obstante nada saberem sobre os actos criminosos. Neste contexto, cabe ao juiz filtrar rigorosamente as diligências requeridas pelos arguidos, impondo-se-lhe o indeferimento daquelas que entenda não interessarem à decisão instrutória, ou servirem apenas para protelar o andamento do processo. A lei proíbe, ainda, a repetição de actos e diligências de prova já realizados na fase do inquérito, excepto quando se mostrarem indispensáveis à descoberta da verdade ou se não tiverem obedecido às formalidades legais. No caso BES, cuja fase de instrução contempla novos interrogatórios dos arguidos e um número alargado de diligências, importará que o juiz cumpra escrupulosamente o seu poder-dever de indeferir todos os actos e diligências dilatórios e desinteressantes para a sua decisão final, delimitando-os ao essencial e imprescindível. Tanto mais que o MP já alertou para o risco de prescrição do procedimento criminal relativamente a alguns crimes constantes da acusação. O assistente BES, colaborador do MP, requereu fosse fixada a urgência do processo, o que significaria que este seguiria o seu percurso, sem paragens para férias, sem suspensões ou interrupções. Neste momento, o Sr. Juiz indeferiu aquele pedido. Aos magistrados judiciais e do MP impõe-se-lhes um cuidado e preocupação ética e deontológica de evitar e impedir a prescrição dos crimes. Sobretudo em áreas tão sensíveis, graves e socialmente censuráveis, como são os crimes de natureza económico-financeira. A bem e prestígio da Justiça, espero e desejo uma reconsideração daquela decisão judicial.
*Ex-diretora do DCIAP
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