quinta-feira, 9 de junho de 2022

Angola | A Alternância Política e os Golpistas Palacianos – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

As eleições estão marcadas para o dia 24 de Agosto. A UNITA e seus aliados andaram quase toda a legislatura dizendo que o MPLA não queria eleições. Disseram mesmo que não teríamos eleições. Estão marcadas. A Oposição que temos é péssima. Isso não me dá nenhum conforto, pelo contrário, pode levar o MPLA a ser menos exigente na sua prática política, na defesa intransigente dos interesses do Povo Angolano, como faz desde a sua fundação, em 10 de Dezembro de 1956. O líder da UNITA, pior do que ter outras nacionalidades, é defender interesses estrangeiros inconfessos e sentir-se bem nesse papel.

As eleições estão à porta. E o panorama político é ainda mais sombrio do que antes de ser anunciada a data, pelo Presidente João Lourenço. Toda a espécie de oportunistas que perderam mundos e fundos nos últimos cinco anos, apresentam-se como políticos de primeira linha e atacam o MPLA desalmadamente. Sem fundamentos. Sem razão. Essa tropa de choque fala por desespero. Alinhou-se à esquina da UNITA numa fraude chamada Frente Patriótica Unida (FPU). Hipotecaram a honra por ninharias. Abdicaram da dignidade bem sabendo que assim estão a cometer a derradeira traição ao MPLA, partido que os inventou, criou e promoveu. 

Marcolino Moco era um menino, militante da JMPLA no Huambo, quando o conheci. Nessa época eu já era um trintão pai de filhos e extremoso amante de senhoras prendadas com grande apetência para aventuras amorosas. O que se leva desta vida é a vida que se leva. Ficámos amigos. Quando ele chegou a secretário-geral do MPLA foi um dos momentos mais felizes da minha vida. E quando foi indigitado primeiro-ministro do Governo do MPLA, que tinha ganho as eleições com maioria absoluta, fiquei comovido. Aquele menino de Chitué, nascido e criado no seio do meu partido, tinha chegado ao topo da sua carreira política.

Eu costumo dizer que faça o que fizer pelo MPLA, ainda fico em dívida, porque nas fileiras do MPLA aprendi tudo o que sei. Quando me dizem que naqueles anos de brasa de 1974 e 1975 fizemos muito pela Independência Nacional e pelo Povo Angolano eu digo que nada fiz, em comparação com o que recebi. Devo ao Povo Angolano tudo o que sou. Claro que nunca fui mais do que um repórter formado na velha escola da notícia. E atendendo aos anos de experiência, aos cabelos brancos que me nasceram nas Redacções da Rádio e da Imprensa, ensinei a quem iniciou a sua carreira profissional, tudo o que sei.

Em 1992, ano das primeiras eleições gerais multipartidárias, o MPLA entregou a direcção da campanha eleitoral a Daniel Chipenda. Esse mesmo, o que capitaneou a revolta tribalista do Leste e depois se aliou à FNLA. O que serviu galhardamente os serviços secretos da África do Sul na sua guerra contra a Independência Nacional e a integridade territorial. Pouco tempo depois foi substituído pelo meu querido e saudoso amigo, Manuel Pedro Pacavira. 

O novo director de campanha foi ter comigo e disse para me preparar pois tinha que regressar com  ele a Luanda. Nessa altura era da direcção da revista Sábado (primeira série) e a minha vida corria bem como nunca correu. Não me dava jeito nenhum deixar tudo. Pacavira, naquele tom de voz baixinho que sempre usava só disse isto: É a missão que temos para ti. Dois dias depois estava em Luanda. Partimos a loiça toda!

Antes da partida ainda assisti a uma conferência de imprensa do padre Joaquim Pinto de Andrade, em Lisboa. Ele era cabeça de cartaz do Partido da Renovação Democrática (PRD), que juntou os golpistas de 27 de Maio de 1977 e os restos da Revolta Activa. Disse que o seu partido ia ganhar as eleições, a UNITA ficava em segundo lugar e o MPLA, com sorte, ficava em terceiro. Manuel Pedro Pacavira tinha razão. O nosso partido precisava de cerrar fileiras.

Em Luanda fiz o que pude e soube. A campanha eleitoral passou a ser acompanhada por Marcolino Moco, Kundi Paiama e Lopo do Nascimento. Pacavira passou a pasta por não se sentir competente para a missão. 

Na época, os Media nacionais e internacionais davam como certa a derrota do MPLA. A UNITA sim, ia esmagar. E depois vinha o partido dos golpistas de 27 de Maio associados à Revolta Activa. O MPLA estava condenado a uma votação residual. Um comendador do Mário Soares escreveu no jornal “Público” que só um milagre salvaria o MPLA do desaparecimento da cena política angolana.

O MPLA ganhou as eleições, com maioria absoluta. Mérito para a “troika” da diredcção da campanha mas também para João Lourenço, o motor da campanha, do seu braço direito, Mário António, de Rui de Carvalho, do Álvaro Macieira, do César Barbosa mais tantas e tantos camaradas abnegadas e abnegados que deram tudo pela vitória eleitoral. O PRD, partido dos golpustas do 27 de Maio de 1977 e dos restos da Revolta Activa elegeu um deputado!

O meu amigo Marcolino Moco, que deve ao MPLA tudo o que é, deu uma entrevista à Deutsche Welle (DW) e usou os mesmos argumentos dos propagandistas da UNITA que cobriam a campanha eleitoral de 1992. Esses actuavam movidos a dinheiro, muito dinheiro. Quando os resultados eleitorais desmentiram as suas falsidades, apressaram-se a fazer passar o argumento da “fraude eleitoral”. O antigo secretário-geral do MPLA e primeiro-ministro do governo saído das eleições multipartidáriasesgrime argumentos ainda mais falsos e insultuosos.

Disse Marcolino Movo à rádio de propaganda alemã: “Imaginar que o MPLA vai ganhar as eleições gerais é qualquer coisa de miraculoso”. Portanto, o MPLA só ganha as eleições se houver um milagre”. E insistiu: “Se houver transparência eleitoral haverá alternância de poder em Angola. Será um milagre se o MPLA ganhar as eleições gerais de 24 de Agosto”.

Em nome da nossa amizade, quero dizer a Marcolino Moco que, provavelmente por distracção, desceu ao nível dos mais repugnantes leprosos morais. Assumiu o discurso da fraude eleitoral de uma forma acéfala, colocando-se de joelhos ante os sicários da UNITA. Foi mais longe do que eles. O MPLA só tem um resultado nas próximas eleições: A derrota. Se ganhar houve fraude ou é milagre de Nossa Senhora da Muxima.

Alguém tem de explicar a esta tropa de choque uma coisa muito simples. A alternância só existe quando os eleitores assim o desejarem. Não é uma obrigação. Não é um a imposição. A alternância não quer dizer mudança de regime. Muito menos o espezinhar da Constituição da República. A UNITA e seus parceiros de esquina, na fantasia política chamada Frente Patriótica Unida, não são alternativa porque querem destruir o regime político e são inimigos da Lei Fundamental. Entre a legalidade democrática e o golpismo, os eleitores angolanos, no dia 24 de Agosto, como em Setembro de 1992, não vão ter dúvidas. Mesmo que Marcolino Moco faça figura de criado às ordens dos golpistas.

Rafael Marques acaba de pagar a condecoração que lhe penduraram ao pescoço. Escreveu isto: “No ano em que se celebra com pompa e circunstância o centenário de Agostinho Neto, a crueldade do seu poder sobrepõe-se a qualquer outro legado. Por isso, não deixa de ser arrepiante quando Neto é tratado como um humanista” O servente de George Soros, apoiante e financiador de assassinatos em massa, e outros donos conta que conheceu Joaquim Pinto de Andrade e Domingos Coelho da Cruz. Tomava café com eles., E Coelho da Cruz contou-lhe que escapou por milagre do fuzilamento no dia 27 de Maio de 1977. As aldrabices do costume.  

Mas nem tudo é mau. Sua excelência o senhor ministro da Justiça e dos Direitos Humanos descobriu as ossadas de membros da direcção política e militar do golpe de estado de 27 de Maio de 1977. Francisco Queiroz garante que o processo das ossadas não vai parar, para que as famílias possam fazer as exéquias fúnebres dos que morreram. Estou muito feliz. Os ossos dos milhares e milhares de jovens angolanos e angolanas que morreram na guerra, de Norte a Sul, do Lobito ao Luau, muitos sem sepultura, vão ser entregues às famílias. 

Na berma da estrada entre Cuito Cuanavale e Menongue, à saída da vila, há dezenas de cruzes implantadas em montes de terra. Sem qualquer identificação. O general Nando Cuito explicou-me por que motivo existe aquele cemitério:

“Os sul-africanos introduziram na sua artilharia de longo alcance as coordenadas do cemitério do Cuito Cuanavale. Quando eles viam os ajuntamentos dos funerais, disparavam. Para enterrarmos um camarada, morriam oito ou dez. Deixámos de usar o cemitério e começámos a enterrar os nossos mortos na berma da estrada. Aqui não chegavam os obuses dos invasores.”

Como o processo das ossadas não vai parar, os milhares de heróis que morreram na defesa da soberania nacional e da integridade territorial vão ter um funeral digno. Como todos e todas tiveram pai e mãe, os ossos serão entregues aos familiares que previamente deram sangue e saliva para identificação do ADN.

Até aqui só havia exéquias fúnebres para assassinos golpistas, parceiros do senhor ministro. A partir de agora, os Heróis também vão beneficiar. Já não era sem tempo.

*Jornalista

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