Pedro Araújo* | Jornal de Notícias | opinião
Os portugueses gostariam de poder confiar nos seus políticos? Não tenho dúvida que sim. Mas podem confiar sem reservas? A realidade dos últimos tempos tem demonstrado à saciedade que, infelizmente, não é possível fechar os olhos e esperar que tudo corra dentro de um quadro mínimo de respeito por princípios éticos ou até legais.
Não havendo confiança, qual é a alternativa que resta a uma sociedade aberta, em que vão funcionando os pesos e contrapesos, nomeadamente a Comunicação Social, os reguladores, os supervisores e os tribunais, entre outros? A alternativa à confiança perdida é a vigilância. Ora, como afirma o filósofo Byung-Chul Han, "a sociedade da transparência é uma sociedade da desconfiança e da suspeita, que, devido ao desaparecimento da confiança, assenta sobre o controlo". Han explica ainda a raiz do problema: "a força da exigência de transparência indica que o fundamento moral da sociedade se tornou frágil, que os valores morais, como a honradez e a lealdade, perdem cada vez mais a sua significação".
Chegados a este ponto, e tendo como pano de fundo os "casos e casinhos" que brotam como cogumelos no interior de um Governo de maioria absoluta, é legítimo perguntar se os políticos gostam de ser controlados. Quem está no poder preferia não ser vigiado de forma intensa, uma vez que precisa de liberdade para agir, sem perder tempo a justificar tudo e mais alguma coisa. Ao longo da história democrática, houve períodos em que relativa rédea solta dada aos políticos assentou na confiança. No entanto, em muitos países foram sendo criadas sucessivas regras de controlo com o beneplácito dos próprios políticos. Porquê? Porque quem sente que a estadia no poder é temporária procura sempre criar mecanismos de controlo dos futuros governos de outra cor política. Por outro lado, fazer o discurso da transparência, mesmo que a contragosto, rende votos numa sociedade informada, exigente e fã da comunicação voyeurista.
*Editor-executivo-adjunto
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