sábado, 13 de maio de 2023

Angola | COMUNICAR BEM E RUÍDO – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Os ventiladores de lixo ao serviço de um poder judicial em acelerado estado de decomposição dizem que foram recuperados mais 30 activos na posse de Manuel Rabelais. Dei comigo a pensar nos activos que ele ofereceu ao Estado Angolano. Sou testemunha. Ajudei a activar. Antes que chovam os insultos tenho a declarar que nunca entrei em casa do espoliado e ele nunca entrou em minha casa. Apenas fomos colegas.

Manuel Rabelais trabalhava na Rádio Nacional de Angola numa altura em que era activista da célula do MPLA. Estudava Direito. Fazia narração desportiva como ninguém. Com Humberto Jorge criava as bases para o lançamento do Canal Desportivo da RNA. Um projecto que teve estrondoso êxito. Agostinho Vieira Lopes, o líder da RNA na época, autorizou que fossem abertas janelas de publicidade nos espaços desportivos da grelha. Essas receitas pagavam tudo. Não saiu um centavo dos cofres do Estado. Sei disso porque os “jingles” e “spots” publicitários eram produzidos por nós: Manuel Rabelais, Humberto Jorge e eu.

Os activos criados por Manuel Rabelais como profissional beneficiaram por inteiro o Estado Angolano e os jovens que com ele deram os primeiros passos na narração desportiva. Ao voo do pássaro vou dizendo que ele foi o maior de todos nesta disciplina, que teve alguns dos melhores da Rádio de Língua Portuguesa (inclusive o Brasil): Rui de Carvalho, Manuel Berenguel ou Francisco Simons são gigantes. Rabelais foi capaz de ir mais longe. Ele fez da voz um espectáculo emocionante dentro dos espectáculos desportivos que vivem da emoção. Trabalhava sem rede. Ao mesmo tempo que relatava, vendia bilhetes para a plateia ter milhões de ouvintes. 

Como empresário criou um projecto de audiovisual. Sucesso à Rabelais. Activo recuperado, activo morto. Não descansam enquanto não o matarem também. Posso dar um palpite? Como sei umas coisinhas do audiovisual, aconselho-vos: Peçam ao Manuel Rabelais para dar de novo o seu contributo no sector empresarial do Estado. Convençam-no a fazer formação aos jovens. A narração desportiva é uma disciplina jornalística grandiosa mas são poucos os que sabem disso e como se faz. Não atirem ao lixo o melhor de todos. Temos tão poucos que esse desperdício é um crime. Repito. A minha relação com Manuel Rabelais foi sempre profissional. 

O canal dois da TPA estava morto. Queriam fechá-lo. Manuel Rabelais pegou no morto e ressuscitou-o. A operação foi dirigida por Welwitschia dos Santos (Tchizé). Até vedetas criaram. O negócio só tem êxito e prospera se soubermos criar vedetas. Rabelais e Tchizé pegaram em gente comum, gente como nós e criaram vedetas. Estou muito grato aos dois por terem mostrado tanta competência, tanto profissionalismo, tanta imaginação, tanto amor à arte de comunicar. Custa algum coisa reconhecer quem faz bem? Então não persigam quem nos fez bem.

A Direção Nacional de Investigação e Ação Penal (DNIAP) da Procuradoria-Geral da República tem nas mãos o processo-crime número 48/19, que investiga a gestão de Isabel dos Santos na Sonangol. Sabiam que o Tribunal rejeitou o processo por insuficiência de provas? O Rafael Marques não se dá bem com a verdade e com a informação sustentada por critérios jornalísticos. Os próprios ventiladores de lixo ao serviço de Hélder Pita Grós escreveram isto: “O Tribunal constatou que as irregularidades detectadas na gestão da Sonangol foram aprovadas pelo Conselho de Administração da petrolífera estatal e assim sendo todos os membros deste órgão deviam ser igualmente chamados ou constituídos arguidos por haver responsabilização sobre os mesmos”.

Querem saber mais pela voz dos ventiladores de lixo? Leiam: “Verificou-se igualmente que durante os actos de decisão do Conselho de Administração da Sonangol envolvendo pagamentos a empresas do universo empresarial de Isabel dos Santos, a empresária não participava nas reuniões, e das vezes que esteve presente não votava. Assim sendo Isabel dos Santos não pode ser responsabilizada por decisões tomadas pelo Conselho de Administração da Sonangol em que ela não tomou parte ou aprovou”. 

Senhor Presidente João Lourenço: São estas contas que a empresária Isabel dos Santos tem que prestar à Justiça? Pelos vistos, a Justiça é que tem contas a prestar. Quatro anos depois de ser trucidada na praça púbica, o processo 48/19 volta à estaca zero. Daqui a quatro anos igualmente. E depois nunca se sabe. Muda o Presidente da República e com ele mudam os acusadores. Mas também podem mudar os acusados, dando sequência ao rodízio iniciado em 2017. E assim vamos de barbárie em barbárie, de vingança em vingança, até não sobrar ninguém.

O General Eusébio de Brito Teixeira passou a vida de armas na mão contra os invasores estrangeiros e o seu biombo, a UNITA. Encontrei-o em lugares tão diferentes como o Soyo e Menongue. Os ventiladores de lixo ao serviço de um poder judicial em putrefacção acusam-no de esquemas fraudulentos. Um dia destes avança a recuperação de activos. O Pita Grós diz umas barbaridades e está feita a pandilha. A Justiça tem tantas contas a prestar à sociedade que vão ser necessárias pelo menos duas eternidades para chegar ao fim da lista.

Neste quadro aterrador, a UNITA está em grande. Isaías Samakuva é o sicário que escondeu 20 mil homens e as armas nas bases secretas do Cuando Cubango, quando deviam ir para os acantonamentos definidos pelo Acordo de Bicesse. Ontem foi recebido por João Lourenço no Palácio da Cidade Alta. 

Samakuva não foi pedir desculpa por ter colaborado directamente nesse crime hediondo. Por ter causado a morte de milhares de angolanas e angolanos. Pela destruição de equipamentos sociais, que tornaram a vida impossível às populações nas províncias ocupadas militarmente pela UNITA, quando perdeu as eleições. Por ter causado o êxodo de milhões de pessoas das suas terras onde até agora não regressaram. Esta é a base de todos os problemas que o Povo Angolano enfrenta: Gente a mais nas grandes cidades e desertificação humana no resto do país, porque ainda não foram refeitas as condições mínimas para se viver com dignidade. A UNITA tornou Angola precária. E agora quer inviabilizar o Estado.

Isaías Samakuva disse aos Media que foi ao Palácio da Cidade Alta tratar com João Lourenço da criação da Fundação Jonas Malheiro Savimbi, “por vontade da família e da UNITA que há um ano anda a ser estruturada mas com alguma lentidão. Viemos pedir alguma orientação”. Embora com receio de errar, penso que no último congresso João Lourenço foi eleito presidente do MPLA e não da UNITA. Nas últimas eleições foi eleito como cabeça de lista do MPLA e não do Galo Negro. Mas posso estar enganado. Seja como for, nada é pior do que a corrupção dos valores e princípios. Esses corruptos ameaçam a existência de Angola como Estado Soberano.

Se a Fundação Jonas Savimbi for para a frente isso quer dizer que a corrupção passou a ser a marca distintiva do Estado Angolano. Espero que João Lourenço não queira passar à História com essa farda. É mais digna a farda de recluso do Estabelecimento Prisional de Viana. Se de Washington, Londres ou Bruxelas estão a chegar essas ordens, por favor, não as cumpra. Nunca se esqueça que é um dos nossos. E já era dos nossos quando Washington, Londres e Bruxelas se conluiaram com o regime racista de Pretória para riscarem Angola da lista dos países.

O Presidente João Lourenço disse numa entrevista: Eu é que combato a corrupção. Antes nunca ninguém combateu. Tem de aprender a comunicar melhor. Porque há discursos e declarações públicas de José Eduardo dos Santos anunciando tolerância zero à corrupção. E Agostinho Neto não hesitou em agir contra camaradas seus, muito próximos, suspeitos de corrupção. Em alguns casos as suspeitas eram inventadas pela camarilha nitista. 

Aliás, nessa época éramos todos pobres. Pôr comida na mesa era uma dor de cabeça. O meu querido e saudoso amigo Arménio Ferreira mandava todas as semanas de Lisboa para Luanda uma “cesta básica” para não faltar comida na mesa de Agostinho Neto! Não vão a correr sacar-lhe os activos. O Arménio já faleceu e a comida era comprada com o dinheiro que ganhava honestamente como médico cardiologista. 

Tão ladrão é o que vai roubar na lavra como o que fica a vigiar se vem o dono. João Lourenço foi alto dirigente do MPLA e do Estado nos anos em que, segundo ele, não houve combate à corrupção. Não ouvi nenhuma denúncia pública de João Lourenço. Não tenho notícia de que alguma vez se tenha demitido por haver tolerância à corrupção. Como sei que por trás de cada grande fortuna há um qualquer conluio com o Estado, posso concluir que o Presidente João Lourenço está muito equivocado.

O Ministério Contra a Comunicação Social desenvolveu uma actividade sobre comunicação institucional. Os oradores falavam num palanque com a fotografia oficial do Chefe de Estado em cima deles. Nos grandes planos, orador e presidente colavam-se. Comunicar bem não é assim. Lamento informar o senhor ministro que deu um exemplo gritante de ruído que é o contrário de comunicação. Já ganhei o meu pedaço de pão.

*Jornalista

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