quinta-feira, 8 de junho de 2023

Portugal | AFORRO PARA MILIONÁRIOS

Rafael Barbosa* | Jornal de Notícias | opinião

Os certificados de aforro eram uma pedra no sapato da Banca. A sangria nos depósitos contava-se por milhares de milhões desde o início do ano, ou, dito de outra forma, 67 milhões de euros por dia. Mesmo que ainda não fosse o caso (acredite quem quiser), não tardaria que se transformasse num problema de liquidez.

Pior. O movimento massivo de pequenos aforradores, dos bancos para a dívida pública, equivalia a um grito diário de revolta contra a forma como os banqueiros conduzem o seu negócio. Os bancos cobram, nos empréstimos à habitação, juros quatro vezes superiores aos que pagam pelos depósitos. É esta usura, aliás, que explica que, mesmo depois de um ano de 2022 com lucros fora do normal, estes tenham chegado a um nível absurdo no primeiro trimestre de 2023 (quase mil milhões nos seis maiores bancos).

Confrontado com a questão, o que fez o Governo? Mostrando "zero cedência" perante os interesses dos poderosos, mas preocupado com o défice e a dívida, acabou com a série de certificados de aforro que ameaçava transformar os portugueses em milionários. Ao final de uma sexta-feira, não fosse ainda o malandro do pai aplicar a correr os mil euros da poupança do filho, não fosse algum professor, jornalista, ou empregado de escritório com a mania das grandezas levantar os cinco mil euros que tem guardados para um imprevisto ou para a reforma que se aproxima, aproveitando-se da generosidade do Estado.

Generosidade, sim, que, segundo as explicações iniciais, pagar um juro de 3,5% pela dívida pública não era racional. É verdade que, na segunda-feira, ficou claro que, descontado o IRS que cobra sobre os juros, o Estado paga mais aos grandes investidores estrangeiros do que aos pequenos aforradores nacionais. Mas isso não é caso para perder a face. É preciso pensar na previsibilidade: ou seja, o filho entretanto chega à maioridade, o tal azar acontece, ou o velhote reforma-se mais cedo. Levantam o dinheiro e deixam o Estado, pobre dele, com as calças na mão. E você, também acredita em histórias da carochinha?

*Diretor-adjunto

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