quinta-feira, 31 de agosto de 2023

Angola | Um Líder Político em Marcha Atrás – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

O Zé Carlos era o maior futebolista da minha infância passada em Camabatela. Era tão bom que um dia os irmãos, jogadores do Desportivo de Ambaca (Ilídio e Manuel Silva), puseram-no a jogar com os seniores. Tinha 13 anos. Era tão dotado que nos torneios de tiro aos pratos batia os adultos. E as meninas da vila andavam todas apaixonadas por ele. Eu atrelava-me ao bonitão e fazia de segunda escolha. No aproveitar é que está o ganho.

Em Luanda eu fui morar na Vila Clotilde e o Zé Carlos vivia com o irmão Ilídio na CAOP. Éramos vizinhos. Por isso íamos juntos para o Liceu Salvador Correia. Um dia tive uma ideia um tanto escaganifobética: A partir de hoje vamos para as aulas de marcha atrás! Nesta altura o meu amigo já tinha namorada certa no paraíso da Mamã Cagalhoça, Bairro Operário. E eu vadiava de quintalão em quintalão, levantando poeira do chão com passos desajeitados em rumbas e merengues. Quem apagou a luz e mexeu nas chuchas da Mana Josefa? Eu cá não fui. Ai merengue, ai merengue, ai merengue!

No regresso das aulas o caminho era a subir e nós de marcha atrás. As colegas achavam imensa piada ao nosso andar. Algumas faziam-nos avanços e daí resultavam cartas de amor e beijos apaixonados. Agarradinhos nas farras quando a música era di lento. Faço esta confissão porque pelas minhas contas os crimes já prescreveram. Ninguém as vai incomodar.

Mas jamais esquecerei que uma das meninas quis fugir comigo para a fazenda do pai, no Kilombo dos Dembos. Não fugimos porque pus como condição irmos de marcha atrás e ela resfriou a paixão. Fui muito agredido sexualmente na minha adolescência! Ainda bem. Se não fosse assim, hoje era um moralista de merda.

O Presidente João Lourenço, tantos anos depois, resolveu imitar o meu amigo Zé Carlos e este vosso criado. Os eleitores sufragaram o excelente Programa de Governo do MPLA. O líder do partido que ganhou as eleições com maioria absoluta, eleito presidente da República, anda a contrário das propostas aprovadas pelo voto popular. 

O Sul Global pôs as cartas na mesa durante a Cimeira dos BRICS em Joanesburgo, ao lado de nossa casa, e há um movimento libertário para acabar com o mundo unipolar, retirar as armas de destruição maciça (Bando Mundial, FMI e máquinas de fotocopiar dólares) ao estado terrorista mais perigoso do mundo. João Lourenço foge de marcha atrás para os braços de Joe Biden, um pobre diabo a cair de podre.

África está a ser varrida por um furacão anticolonialista. As antigas potências coloniais estão a ser varridas à força toda. Os amigos africanos de Macron caem fragorosamente. As tropas dos colonialistas já não desembarcam nas capitais africanas para defenderem os fantoches de serviço, como se estivessem a beber um copo em casa. No Gabão aconteceu o mesmo. João Lourenço, de marcha atrás, vai já dizer que é um golpe inconstitucional desferido pelo terrorismo internacional. 

Alguém avise o nosso Presidente que o antigo líder do Senado gabonês foi apanhado a fugir com seis malas de porão cheias de dinheiro. Contadas as notas, estava ali o equivalente ao Orçamento-Geral do Estado do Gabão para este ano. Quem anda de marcha arrás acha que o fugitivo é dos bons e os que apanharam as malas de dinheiro são do terrorismo internacional. 

No que diz respeito à Ucrânia, João Lourenço ultrapassa largamente as posições ridículas de Marcelo Rebelo de Sousa. Sempre em marcha atrás considera a Federação Russa “o agressor”. Sempre a andar de marcha à ré ainda chega à Canata e canta o hino dos Heróis do Mar. Quer os nazis a matar russos e russófonos. Quer a OTAN dominando o mar Báltico. Quer um país amigo de Angola cercado pelo braço militar do estado terrorista mais perigoso do mundo. Está a milhas de distância dos anos em que a União Soviética financiava a Guerra pela Soberania Nacional e a Integridade Territorial. Formava os nossos quadros militares. Armava os nossos guerrilheiros. Armava os nossos combatentes de todas as guerras até 2002.

A Federação Russa está a desarmar e a desnazificar a Ucrânia. Pessoalmente preferia que não fosse necessário. Dava um rim, um pulmão, um olho, um ouvido, uma perna e um braço para que nunca mais houvesse guerra no mundo. Sou repórter e tenho fontes de máxima confiança. Hoje quero informar o presidente em marcha atrás que a desmilitarização do regime nazi de Kiev corre bem.

Até hoje foram destruídos 433 sistemas de defesa aérea S-300, Buk-M1 e Osa, 11. 570 tanques e outros blindados, 6. 128 canhões de artilharia de campanha e morteiros, 1. 146 lança foguetes múltiplos, 466 aviões, 247 helicópteros, 6. 234 drones e 12. 528 camiões militares. Não falo dos soldados mortos, feridos e mutilados porque tenho imensa pena. Se a operação militar especial passar para guerra, a Ucrânia acaba como país. A União Europeia nunca mais se levanta da falência. O Reino Unido vai ao fundo e os EUA lavam daí as suas mãos. Nem conhecem os senhores da guerra de hoje! 

Caso João Lourenço se afaste já do estado terrorista mais perigoso do mundo em marcha atrás, nunca chegará o tempo de ver África finalmente livre dos colonialistas. O movimento está em alta velocidade. Até o rato de sacristia António Guterres diz que estão a acontecer no Sahel coisas nunca vistas! Espere para ver o que aí vem.

A excelente Diplomacia Angolana já sabe o que vem aí. Os secretários do Presidente da República também sabem. Eu não posso ajudar. Sei que está tudo a mudar e rapidamente. Os colonialistas de sempre têm os dias contados. Desejo muito que aconteça o modelo angolano da República Popular de Angola. Se andarmos todos rapidamente em marcha atrás ainda chegamos a essa solução. Duvido que exista mão-de-obra política para essa mudança. Mas sabe bem sonhar alto.

Se João Lourenço não andasse de marcha atrás e desenvolvesse o modelo económico, social e político que recebeu de José Eduardo dos Santos, hoje a África Nova tinha um farol: Angola. Assim ninguém sabe. Pode muito bem acontecer que o nosso país ocupe o lugar da África do Sul dos anos 80. Um Estado Pária. 

Claro que isso não vai acontecer. Ainda temos amigos prontos a dar a mão ao Povo Angolano porque o Povo Angolano lutou pela libertação da África Austral e pelo esmagamento do regime de apartheid, a mais repugnante macha na Honra da Humanidade. 

Nem de marcha atrás João Lourenço vai entregar Angola ao estado terrorista mais perigoso do mundo.

*Jornalista

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