quarta-feira, 27 de setembro de 2023

Angola | Jinginga de Cabrito em Nova Iorque – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

O noticiário das 20 horas da TPA ontem (Mais Domingo) começou com publicidade a uma empresa privada e à USAID, um órgão do governo dos EUA que segue o guião do Departamento de Estado e da CIA. Foram sete minutos de mensagem publicitária sem informar o telespectador que não estava a consumir informação produzida por jornalistas. Uma promiscuidade criminosa que acontece todos os dias sem o menor sobressalto e sobretudo sem que as entidades competentes se pronunciem. 

Um grave atentado à Lei de Imprensa é cometido num órgão de comunicação social público e passa incólume no ministério da tutela. A auto-regulação prima pelo silêncio. A Entidade Reguladora da Comunicação Social Angolana (ERCA) ignora. Mas estamos perante um crime grave. Não há pior do que apresentar aos consumidores publicidade como se fosse informação. É mais grave do que emitir mensagens falsas. 

Após a publicidade de sete minutos (uma eternidade no audiovisual) os dois profissionais da TPA que apresentaram o Mais Domingo entraram no crime e chancelaram a mensagem publicitária como informação. Chama-se a isto banditismo mediático. Abuso de liberdade de imprensa. Falta de respeito pelos consumidores.Violação dos princípios éticos e deontológicos. 

A peça de abertura do noticiário é uma campanha publicitária da USAID e de uma companhia chamada Foodcare Lda. Hoje a publicidade meteu também a proprietária da empresa exportadora de tortulhos, apresentada como uma mulher maravilha. Tão maravilhosa que colocou em Nova Iorque fuba, catatos, tortulhos, kizaka, kikuanga e muamba de jinguba!

A apresentadora Filomena disse com ar feliz: 

A partir de agora quando formos a Nova Iorque podemos comer coisas boas de Angola! 

Isto é o grau zero do abuso e da falta de respeito pelos telespectadores e pelo Povo Angolano. Menina! Os angolanos gostavam de comer em Angola mas está difícil. Quem não trabalha para a CIA e não recebe do Orçamento-Geral do Estado está malé, malé, malé. Em várias casas é mesmo impossível dar ao dente. 

Claro que nos cardápios dos restaurantes de Nova Iorque há jinginga de cabrito. Quando me apetece a iguaria meto-me no jacto privado e lá vou eu.

Uma figura histórica que muito admiro (Jesus o Cristo) ensinou-me que é mais difícil um rico ir para o céu do que um camelo de duas bossas passar pelo buraco de uma agulha mesmo que seja daquelas que eu usava para coser os sacos de mabuba. 

Vou desviar-me do assunto por breves palavras. Parece que Angola exportou mil toneladas de café na colheita passada. Com o devido respeito informo que o meu Querido Pai produzia isso nos anos maus lá na roça do Bindo. Mas por pouco que seja, quando me apetece um cafezinho angolano benzido pela CIA lá vou eu a Nova Iorque. 

A figura histórica que muito admiro (foi o primeiro revolucionário a mudar o rumo da Humanidade) também disse: 

Perdoai-lhes Senhor porque eles não sabem o que fazem.  

Como eu gostava de perdoar a quem está a matar o Jornalismo Angolano.

Outra figura que muito admiro e com a qual estou disposto a ir até ao fim do mundo para mudar as mentalidades reinantes disso que o sistema vigente “é o capitalismo que mata”. Tem continuado a desenvolver essa tesem sempre que pode. Chama-se Francisco e é Papa.

 Um dia destes foi a Lampedusa, na Itália, e viu a forma desumana como são tratados os refugiados das guerras do estado terrorista mais perigoso do mundo e seus sequazes do ocidente alargado, em cujo cartel Angola está prestes a entrar com distinção.

 Disse o líder da Igreja: 

- Estamos na globalização da indiferença. 

É muito triste mas a mais pura das verdades. Se um louco entra aos tiros num bar de Los Angeles e mata clientes o crime é notícia de primeira página no mundo inteiro uma semana. Soldados israelitas entram nos campos de refugiados da Palestina matam quem lhes apetece e o ocidente alargado fica indiferente. 

Um miúdo vai armado para a escola no Texas, mata colegas e professores. É notícia em todo o mundo durante um mês. Só está a dançar a música que o estado terrorista mais perigoso do mundo lhe impinge. Milhares de mortos na Líbia, causados pelos bombardeamentos da OTAN (ou NATO) para derrubar e matar o Presidente Muammar al-Gaddafi são ignorados. Globalização da indiferença.

Senhor, não lhes perdoes! Eles sabem muito bem o que fazem. Matam e destroem porque esse é o seu modo de vida. E para melhor cumprirem os seus desígnios começaram por “globalizar” as guerras de ocupação. Com isso, só nos 23 anos do Século XXI mataram milhões de seres humanos, causaram milhões de refugiados, semearam a fome e a doença. 

Agora impuseram a globalização da indiferença. Os pobres que morram. Nós, os ricos, vamos comer kizaka a Nova Iorque como manda a TPA. Minha querida Angola. Quem te viu nascer como país independente e quem te vê a exportar jinginga de cabrito para Nova Iorque!

*Jornalista

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