sexta-feira, 6 de outubro de 2023

Angola | Jornalismo e Multas de Trânsito – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Um jovem que começou comigo a dar os primeiros passos no Jornalismo manifestou-me a sua tristeza, porque estou contra os jornalistas que afrontam pessoas com poder. Estou contra a liberdade de imprensa. Nada disso. Passei a vida exercendo o Jornalismo numa lógica de contrapoder. Luto diariamente pela Liberdade de Imprensa. E ninguém imagina quanto já paguei por isso! Ao longo de quase 60 anos de actividade já trabalhei em 37 órgãos de comunicação social porque mandei os patrões à merda. Passei anos trabalhando à peça, sem salário certo. Mas com a Dignidade e a Honra Profissional intocáveis.

A Liberdade de Imprensa é de tal modo importante para o regime democrático que os jornalistas até podem mentir e não serem condenados por isso, desde que estejam reunidas as causas de exclusão do ilícito. A minha notícia é falsa. Mas em boa-fé, reputei as informações como verdadeiras. Cumpri o dever de cuidado, ouvi todas as partes envolvidas. Confirmei e reconfirmei os factos (Teoria das Três Fontes). Mas fui vítima de manipulações concertadas. Claro que ao deixar-me aldrabar ao ponto de publicar uma falsa notícia, tenho de concluir que não tenho condições para continuar a exercer a profissão e o melhor é entregar a carteira profissional. Assim não volto a enganar-me nem enganar os consumidores.

Todas e todos que começaram comigo na profissão sabem isto. Porque lhes expliquei, logo nos primeiros dias, que a Liberdade de Imprensa acaba quando temos à frente uma muralha chamada Direito à Inviolabilidade Pessoal nas suas três projecções (Física, Moral e Vital). Este é o ponto de conflito entre os Direitos de Personalidade e o exercício do Jornalismo. 

O capitalismo que mata começou por se opor aos Direitos de Personalidade. Mas como foi obrigado a aceitá-los, rapidamente arranjou maneira de fazer de nós meros números. Ainda foi pouco. Avançaram com a sociedade do espectáculo e com ela a vitrificação da pessoa humana. Levaram-nos a ir voluntariamente para o matadouro onde nos esfolaram da personalidade e expuseram os nossos jardins secretos. Orwell avançou com o óbvio ululante e teorizou sobre o triunfo dos porcos, como se algum outro animal fosse autorizado a triunfar. Talvez a hiena.

O Jornalismo foi confiscado pelos porcos, as mãos autorizadas pelo Big Brother a espremer uma esponja gigantesca, que absorve toda a informação em circulação nas autoestradas da comunicação. Para nos confundirem, fazem permanentemente bombardeamentos informativos. Entre milhões de fragmentos de informação deixam cair uma ou outra notícia importante, da qual nem nos apercebemos porque é uma espécie de onda que bate contra grandes rochedos e se desfaz em espuma.

A mistura de entretenimento com Jornalismo é uma forma de censura radical. O bombardeamento informativo é censura. Da esponja gigantesca só respinga o que interessa ao Big Brother. Por isso as mãos autorizadas têm de ser recrutadas entre os porcos triunfantes. Quando comecei na profissão a censura era à bruta. 

O chefe de redacção levava as peças “problemáticas” a uma comissão que funcionava no Palácio da Cidade Alta e era chefiada pelo secretário do Governo Geral. Os censores eram militares reformados! Eles mutilavam as peças de tal forma que o melhor era não publicá-las. Ou simplesmente cortavam na totalidade. Exercer a profissão numa lógica de contrapoder era escrever livremente, nunca a pensar nos censores. Foi assim que aprendi a viver o Jornalismo entre as fronteiras da Honra e da Dignidade. 

Hoje é mais difícil aos jovens jornalistas combaterem a censura. Exercerem a profissão numa lógica de contrapoder. As luzes da sociedade do espectáculo ofuscam a existência. Os jornalistas foram excluídos do audiovisual. Estão lá a mais. Os que ficaram têm papéis secundários quase sempre como serventes. É o triunfo inevitável dos porcos.

Os sindicatos dos jornalistas existem para lutar pelos direitos da classe. São fundamentais para exigirem boas condições de trabalho (inclusive salariais) destes trabalhadores que, por muito que custe aos porcos, são especialistas na arte de comunicar. Não somos todos caixeiros do difícil comércio da notícia! Quem deve lutar, permanentemente, pela Liberdade de Imprensa são os jornalistas no seu posto de trabalho. Os Conselhos de Redacção. Os sindicatos não têm nada que se meter nisso.

O Sindicato dos Jornalistas Angolanos defende que os crimes por abuso de liberdade de imprensa não são crimes! Quando espezinham Direitos de Personalidade são multados! Eu publico uma reportagem onde Teixeira Cândido é apresentado como chefe de uma associação de malfeitores que se dedica à chantagem e extorsão. Mas é mentira. Não faz mal. Levo uma multa como as de estacionamento proibido. Ou falta de tabela dos preços. O que é isso de Honra? Que treta é essa do Bom Nome? Um carro mal estacionado.

Defender os crimes por abuso de liberdade de imprensa é apoiar quem quer destruir o que resta do Jornalismo Angolano. É colocar os Jornalistas na lista dos leprosos morais que mentem, deturpam, manipulam, insultam, difamam. Publico uma reportagem onde “provo” que o Teixeira Cândido está infectado com o vírus da SIDA. E espalha criminosamente a doença aos prostitutos que engata. Vai ser um sucesso e um susto. 

As rádios e televisões amplificam a minha menagem informativa. Dou entrevistas e conto pormenores escabrosos. Afinal é tudo mentira. Levo uma multa. Mas a honra e o Bom Nome do Teixeira Cândido ficam manchados para sempre. Pago-lhe uns quantos Kwanzas para comprar cacussos e fica tudo resolvido. Carlos Alberto, agente da segurança, difamou o Vice-Procurador Geral da República Mota Liz. O Tribunal condenou-o a três anos de prisão. Mas a pena seria suspensa se ele pedisse desculpas públicas à sua vítima. Tanta benevolência! Mas nem isso ele cumpriu, porque cometeu o crime ao serviço de quem manda. 

O Vice-Procurador Geral da República Mota Liz tinha apoio dos seus pares para substituir Pita Grós. O Chefe Miala mandou Carlos Alberto publicar aldrabices criminosas contra o magistrado. O resultado está à vista. Teixeira Cândido já tinha atrelado o sindicato à UNITA. Afinal também o entregou ao chefe Miala, Assim vai o Jornalismo Angolano!

 Adalberto Costa Júnior disse em Malange uma verdade insofismável, sem querer: “Existem muitos municípios de Angola que não têm uma única empresa e nenhum banco. Isto cria constrangimentos para quem pretenda, no fim do mês, levantar o seu salário, facto que tem obrigado a caminhar de 300 a 400 quilómetros ao encontro de um banco”. O mesmo dirigente da UNITA quer eleições para o Poder Local, imediatamente! Depois os autarcas eleitos apontam uma pistola aos empresários e obrigam-nos a abrir empresas nos seus municípios. Os banqueiros são intimados a abrir agências bancárias lá onde só existem 10 funcionários públicos e mais ninguém que receba mensalmente um salário.

Sabem por que existem dezenas de municípios em morte social? Porque o estado terrorista mais perigoso do mundo, o Zaire de Mobutu, a África do Sul racista e seus criados da UNITA impuseram ao Povo Angolano, uma guerra que durou entre 1975 e 2002. Arrasaram tudo, nem escolas e unidades de saúde pouparam. Minaram os campos de cultivo e os trilhos que vão dar às lavras. Provocaram a fuga de milhões de pessoas dos campos para as cidades. Mataram centenas de milhares. Nas acham que tudo se resolve com eleições autárquicas!

No ocidente alargado está tudo a correr bem. Não conseguem fabricar munições para a guerra contra a Federação Russa por procuração passada à Ucrânia. Sem material que faz pum-pum a coisa começa a ficar fria. 

Nos EUA despediram o presidente da Câmara dos Representantes Kevin McCarthy . Caso nunca visto. A maioria dos “deputados” quer saber como está a ser gasto o dinheiro que vai para os nazis de Kiev. Não deve ser difícil contar os bolsos e os buracos.

Na União Europeia, a Alemanha continua em recessão. A Zona Euro estagnou. Os bancos centrais estão a rever em baixa o crescimento do PIB até 2026. Mas os ministros das relações exteriores foram a Kiev roncar grosso. Já ganharam a guerra! Só têm um problema. Começa a ser preciso mandar carne para canhão e ucranianos escasseiam.

João Lourenço assinou um Decreto Presidencial que isenta de vistos os cidadãos de quase 100 países em turismo. Ninguém diz nada. Mas esta medida fazia falta há pelo menos 21 anos. Só agora foi tomada porque João Lourenço teve a coragem de enfrentar os racistas e xenófobos, que têm muito peso na política nacional. Temos Presidente! 

Mas também temos um grande problema. Foi anunciado que Angola recebe por mês 2.000 turistas! Só para se perceber a desgraça, basta revelar que até 11 de Novembro de 1975 a Ilha do Cabo recebia mais de 2.000 por dia, entre o Mar e Sol, Restinga, Ermelinda, Sereia, Hotel Panorama, São Jorge ou o Barracuda na zona do Farol. De uma ponta à outra. A boate Tamar recebia por noite centenas de turistas. 

O Grande Hotel Ruacaná no Huambo estava sempre cheio. Centenas de turistas chegavam à capital do Planalto Central todos os dias. O Grande Hotel da Huíla, considerado o melhor de Angola, ocupação plena. O mesmo no Hotel Turismo no Namibe. As Festas de Nossa Senhora do Monte recebiam milhares de turistas. Mais milhares afluíam às Festas do Mar. As corridas de automóveis n Huambo, outros tantos. 

Os grandes hotéis de Luanda na época (Globo, Universo, Continental, Paris, Trópico, Turismo, Panorama e por fim o Presidente) recebiam por dia mais de 2.000 turistas! Abrir as fronteiras aos turistas de todo o mundo é uma medida muito acertada. Está ao nível do Canal de Cafu. Mais um crédito para o Presidente da República.

*Jornalista

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