quarta-feira, 22 de novembro de 2023

Os Estudantes de Projectos Estudados – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Os estudantes de projectos que pingam toneladas de dinheiro devem ter olhos do tamanho do globo terrestre. Ficaram descomunais com tanto estudo. Os beneficiários do Corredor do Lobito vão estudar o que está estudado há 120 anos, quando Robert Williams teve de cumprir um caderno de encargos, que o obrigava o concessionário do Caminho-de-Ferro de Benguela (CFB) a promover o povoamento e a economia ao longo do canal ferroviário. Estudam o que está estudado e depois apresentam-nos a conta. Milhares de milhões.

Meu Pai era assinante de um jornal chamado “Ecos de Angola” editado em Luanda. Chegava ao Negage pelo correio. Aos sábados ia à estação dos correios e o senhor Vieira dava-me a nossa cópia, dobrada cuidadosamente e cintada. Era o primeiro a ler. Um número fazia manchete com a descoberta de petróleo em Benfica (Petrangol). A matéria foi publicada nas centrais. Uma peça revelava que ia arrancar a construção da refinaria mesmo ali ao lado dos poços de petróleo. A “província” nunca mais importava combustíveis da Texaco ou da Mobil!

Outra peça bem mais importante era assinada por um técnico do Serviço de Geologia e Minas. Ele revelava com muitos pormenores o mapa das reservas petrolíferas em Angola. Foram anos e anos de estudos que envolveram dezenas de técnicos, apoiados pelos colegas dos Serviços Geográficos e Cadastrais. O mapa do petróleo revelava que os maiores “lençóis” estavam no deserto do Namibe. Luanda (Benfica/Perangol) estava em segundo lugar e Santo António do Zaire em terceiro. Os estudos só referiam as reservas em terra. Conclusão: A Refinaria de Luanda nasceu em cima de um mar de petróleo. Hoje tem por cima um oceano de casas.  

A exploração de petróleo no mar é da responsabilidade da Cabinda Gulf (Chevron). Foi fácil “estudar”. Os técnicos da petrolífera norte-americana pegaram nos estudos dos geólogos portugueses e facilmente chegaram às reservas petrolíferas no oceano. Os lucros também foram fáceis. Salazar concedeu a concessão a troco de apoio político, sobretudo na ONU, e armas para a guerra colonial nas três frentes, Angola, Guiné e Moçambique.

A ExxonMobil, uma das maiores empresas do mundo no ramo, anunciou que vai fazer “novos investimentos em Angola”. O número dois da empresa, Hunter Farris, foi recebido pelo Presidente da República, João Lourenço. O presente foi-lhe entregue de mão beijada. Mas pelos vistos não lhe chega roubar no barril. 

O Hunter Farris informou que o investimento resulta da exploração que vai começar a fazer no Namibe. E abriu desmesuradamente os olhos para nos atirar à cara com “estudos exploratórios para determinar o potencial da zona”. Pôs as cartas todas na mesa. Transparência no roubo. Os estudos vão começar no segundo semestre do próximo ano!

O Farris, espertalhaço, mandou os seus avençados escrever que a ExxonMobil está em Angola há 20 anos e já “investiu” 30 mil milhões de dólares! Mas não diz quanto já roubaram. E agora vai roubar ainda mais com os “estudos” que eu conheci quando era miúdo, em 1953, tinha nove aninhos! Está dito. Vamos pagar os estudos já feitos. 

O Farris acaba de receber um porco das mãos de João Lourenço e no final dos “estudos” talvez nos dê um chispe pada a sopa e almoço. Por isso é que as mulheres de Luanda encheram as ruas numa manifestação terna de apoio ao Presidente da República. Por tudo o que dá à ExxonMobil e aos beneficiários do Corredor do Lobito. Angola está à venda e baratinho. Quem vende até dá os “quebra”. Os diamantes são matabicho.

Para tudo correr bem, está em marcha o saneamento das Forças Armadas Angolanas. Tomem nota. Até final de 2024 apenas cinco por cento dos oficiais (subalternos, capitães, superiores e generais) que participaram na Guerra pela Soberania Nacional e a Integridade Territorial vão permanecer em cargos de responsabilidade. Em 2025 esse número vai descer para um por cento. Em 2026 estão todos encostados. Os que conservarem a honra e a dignidade sobrevivem custosamente. Os outros estendem a mão ao Miala e toma lá arroz com pexe frito. Os que se portarem bem até podem levar um carro. Mas antes têm que aparecer na TPA dizendo que João Lourenço nos dá o ar respiramos.

Pior está a Palestina. Hoje a aviação israelita bombardeou uma escola da ONU onde se refugiaram centenas de palestinos. Uma carnificina. Martin Griffits, secretário-geral adjunto para os Assuntos Humanitários e coordenador do Socorro de Emergência na Palestina, lembrou que neste momento “morrem bebés prematuros por falta de electricidade. Israel impôs uma privação dos meios básicos de sobrevivência para toda a população do território, que tem 2,3 milhões de habitantes. Desse total, 80 por cento já vivia na pobreza”.

Philippe Lazzarini, o chefe da Agência das Nações Unidas para Assistência aos Refugiados Palestinos no Médio Oriente (UNRWA), escreveu isto: “A destruição de bairros inteiros, não é uma resposta aos crimes atrozes cometidos pelo HAMAS. A ofensiva israelita está a criar uma nova geração de palestinos injustiçados que provavelmente continuarão o ciclo de violência”.

Lazzarini não diz o que motiva Israel a destruir bairros inteiros na Faixa de Gaza. Mas está muito claro. Só não vê quem não quer. Os bombardeamentos só vão parar quando os nazis de Telavive tiverem a certeza de que nenhum prisioneiro ou refém vive. Está em marcha a Directiva Aníbal. O que é? Uma política militar que impõe aos comandantes que sacrifiquem os seus soldados para evitar que sejam capturados. Matam os seus camaradas de armas! O objetivo é impedir que os palestinos tenham qualquer forma de pressionar o estado de Israel. 

O mundo sabe o que aconteceu em 2006, quando a resistência palestina capturou o soldado israelita Gilad Shalit na fronteira de Gaza. Esteve em cativeiro durante cinco anos. O HAMAS conseguiu trocar Shalit por 1.027 palestinos prisioneiros em Israel sem qualquer julgamento. 

A operação das Brigadas Al-Qassam no dia 7 de Outubro tinha como objectivo acabar com o cerco à Faixa de Gaza e a libertação dos milhares de prisioneiros palestinos (entre eles crianças!) sem sequer uma acusação quanto mais julgamento! Se para libertar Shjalit os nazis de Telavive tiveram que entregar mais de 1.000 prisoneiros palestinos, agora têm de entregar muito mais. Ceder muitíssimo mais. Têm de acabar com a prisão a céu aberto de Gaza.

William Van Wagenen é o jornalista norte-americano que mais escreveu sobre a guerra na Síria, desde o primeiro dia. O genocídio na Palestina foi tema de um artigo onde afirma: “As forças de Israel são responsáveis ​​por um número significativo de mortes em território israelita no dia 7 de Outubro”. A quem duvida que o governo nazi mandou matar os seus cidadãos, o autor do texto recorda a Directiva Aníbal:

“É fundamental compreender que Israel, doutrinariamente, vai até aos extremos imagináveis ​​para impedir a captura de cidadãos israelitas – incluindo matá-los. Numa tentativa de impedir o HAMAS de capturar prisioneiros de guerra, as forças israelitas, no dia 7 de Outubro, tomaram medidas drásticas, incluindo ataques aéreos à sua própria base militar, disparos de tanques contra casas de civis e utilização de um poder de fogo esmagador para fazer cumprir a altamente controversa Directiva Aníbal”. Estamos perante o horror nazi ainda mais aterrorizador do que o original.

A ONU entretanto propôs  um plano para a paz em Gaza. Leiam:

Facilitar os esforços das agências humanitárias para trazer um fluxo contínuo de comboios de ajuda e fazê-lo de maneira segura; Abrir pontos de travessia adicionais para a entrada de ajuda e camiões comerciais, incluindo Kerem Shalom, a passagem entre o território palestiniano e Israel; Permitir que a ONU, outras organizações humanitárias e entidades públicas e privadas tenham acesso a combustível em quantidades suficientes para fornecer ajuda e serviços básicos às populações; Permitir que as organizações humanitárias entreguem ajuda em toda a Faixa de Gaza sem impedimentos ou interferências; Permitir à ONU ampliar o número de abrigos seguros para pessoas deslocadas em escolas e outras instalações públicas em toda a Faixa de Gaza, garantindo que permaneçam em lugares seguros durante as hostilidades; Permitir o estabelecimento de centros de distribuição de ajuda para civis, de acordo com as necessidades; Permitir que civis se desloquem para áreas mais seguras e retornem voluntariamente às suas residências; Cessar-fogo humanitário para permitir a retomada de serviços básicos essenciais. O cessar-fogo também é vital para facilitar a entrega de ajuda, permitir a libertação de reféns e proporcionar alívio aos civis.

Belas intenções! Os nazis de Telavive já rejeitaram. Porque têm a certeza de que não há sanções. Pelo contrário. Têm as elites políticas do ocidente alargado gritando em coro: Matem os palestinos até onde for preciso! Biden até já conseguiu manchar de sangue palestino ao apertar a mão do Presidente Xi Xinpimg.

O Mercado Asa Branca ardeu. Dezenas de vendedoras perderam tudo. Perguntem ao Abílil Camalata Numa quem incendiou as barracas. Ele sabe tudo quanto é banditismo em Angola.

* Jornalista

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