quarta-feira, 8 de novembro de 2023

Portugal | Centeno ou Santos Silva. PS admite manter-se no Governo

António Costa demitiu-se ontem depois de "surpreendido" com uma nota da PGR dando-o como alvo de um inquérito-crime. Quanto aos passos que se seguem, o PS manteve as opções em aberto. Até admite que a Costa se siga outro socialista, sem eleições antecipadas. Mas Marcelo já há muito que disse que essa seria a solução caso o PM se afastasse.

Pode ser uma solução mirabolante - mas a verdade é que tem antecedentes históricos: em 2004, Durão Barroso demitiu-se de primeiro-ministro e o então Presidente da República, Jorge Sampaio, em vez de convocar eleições, nomeou um outro primeiro-ministro do PSD, Pedro Santana Lopes.

É essa a solução que o PS agora admite para a crise política desencadeada pela demissão de António Costa do cargo de primeiro-ministro. Nesse quadro, Costa manter-se-ia secretário-geral do PS; mas o partido, ancorado na sua maioria absoluta no Parlamento, indicaria ao Presidente da República outra personalidade para a chefia do Governo.

Carlos César, presidente do PS, foi muito claro, ontem, a não descartar este cenário: "O PS está preparado para qualquer cenário, seja eleições ou mudança de liderança do Governo", disse, na conferência de imprensa na sede do partido em Lisboa onde reagiu à demissão de Costa. E de resto, prosseguiu, o PS nem tem de fazer nenhuma escolha, competindo isso ao Presidente da República. "Em consequência das audições [com os partidos com assento parlamentar], competirá ao Presidente da República avaliar e comunicar o seu juízo próprio. Se for caso disso, comentaremos então a decisão que o Presidente da República oportunamente tomará."

Ao que o DN apurou, neste caso - de manutenção da governação no PS com mudança de primeiro-ministro -, dois nomes circulam como os preferidos de Costa para lhe suceder: ou Augusto Santos Silva, presidente da Assembleia da República, ou Mário Centeno, governador do Banco de Portugal.

O principal candidato à sucessão de Costa no PS, Pedro Nuno Santos, manteve ontem o mais rigoroso silêncio, tentando perceber como vão parar as modas. E Costa, na verdade, ao anunciar que se demitia de primeiro-ministro, não acrescentou que se demitia também de secretário-geral do PS. E César, depois, também não falou nisso. Não está convocada nenhuma reunião da Comissão Nacional do PS, o órgão que convoca os congressos do partido. Há um congresso já marcado para março de 2024, mas agora tudo torna possível que os socialistas sejam forçados a antecipá-lo. Na orgânica do partido, a única reunião que está convocada é, para amanhã à noite, da Comissão Política Nacional.

Isto porque, aparentemente, o Presidente da República prefere mesmo o cenário que sempre aventou para o caso de Costa se afastar da governação. Embora tendo afirmado essa vontade para a eventualidade de um afastamento voluntário de Costa - para rumar a um alto cargo europeu, por exemplo -, a verdade é que as palavras que Marcelo então usou se aplicam a qualquer situação (mudança voluntária ou forçada por um processo judicial, como é o caso).

O Presidente deixou o aviso logo no discurso que fez na tomada de posse do atual Governo (31 de março de 2022): "Agora que ganhou, e ganhou por quatro anos e meio, tenho a certeza de que Vossa Excelência sabe que não será politicamente fácil que essa cara que venceu de forma incontestável e notável as eleições possa ser substituída por outra a meio do caminho".

Marcelo convocou todos os partidos para irem hoje a Belém eamanhã reunirá o Conselho de Estado. Na convocatória deste órgão assumiu claramente que a dissolução da Assembleia da República (ou seja: convocação de eleições) estará em cima da mesa (alínea a do artigo 145º da Constituição). Mas também referiu a alínea e) do mesmo artigo: "Pronunciar-se nos demais casos previstos na Constituição e, em geral, aconselhar o Presidente da República no exercício das suas funções, quando este lho solicitar."

Ou seja: vai-se discutir no Conselho de Estado a dissolução do Parlamento, mas o PR deixou a porta aberta para discutir outros cenários. O mais natural, dada a sua conhecida preferência pelo cenário da dissolução, é que coloque também aos conselheiros uma outra dúvida: o timing dessa dissolução. É que ela pode ocorrer já - o que interromperia o processo legislativo em curso de aprovação do Orçamento do Estado para 2024, atirando o país no próximo ano para uma situação de duodécimos durante no mínimo seis meses; ou só daqui a cerca de três semanas, já depois do OE2024 aprovado. O que o Presidente já sabe é que a direita parlamentar, e o BE, querem eleições antecipadas. O PAN e o Livre põem-se nas mãos do PR. No PS todas as opções estão em aberto. E no PCP, Paulo Raimundo disse que "do que nós precisamos é de soluções e não de eleições".

Costa anunciou ao país pouco depois das 14.00 horas que apresentara a demissão ao Presidente da República. Decidiu fazê-lo quando foi "surpreendido com a informação oficialmente confirmada pelo gabinete de imprensa da Procuradoria-Geral da República" de que era alvo de um processo-crime no Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito das investigações aos negócios do lítio e do hidrogénio (ver páginas 8 e 9). Na mesma conferência de imprensa deixou uma garantia: "Não me vou recandidatar ao cargo de primeiro-ministro, isso fica muito claro. É evidente que esta é uma etapa da vida que se encerrou". Pelas 15.01, Marcelo revelou que aceitara a demissão de Costa.

Amanhã falará ao país, imediatamente a seguir à reunião do Conselho de Estado.

António Costa anunciou a sua demissão ontem, pouco depois das 14h00.

João Pedro Henriques | Diário de Notícias | Imagem: © Leonardo Negrão/Global Imagens

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