<> Artur Queiroz*, Luanda ---
Março Mulher e na emana final, o
anúncio da morte do General Xietu (João Luís Neto. O meu General. O meu
Comandante. O meu amigo. Tudo começou numa vivenda da Vila Alice, onde funcionava
o Comando Operacional de Luanda. Alguns jornalistas foram chamados para uma reunião
de emergência. As FAPLA iam encerrar à força a delegação de Daniel Chipenda, mesmo
ao lado da sede central da FNLA, na Avenida Brasil. Na mesa estavam os Comandantes
Xietu, Iko e Valódia. Quem quer ir cobrir a operação? Fomos todos. Valódia
faleceu
Mais tarde, os Comandantes Iko e Xietu convocaram jornalistas para lhes apresentarem um plano de cobertura da Guerra de Transição. As FAPLA estavam empenhadas em que o mundo soubesse da luta do Povo Heroico. Os angolanos pegaram em armas para enfrentarem a mais agressiva e reacionária aliança que alguma vez se formou na Terra. O mundo tinha de saber. E nós fomos a todas as frentes reportar. Na imagem os irmãos Henriques (Ano Zero) e o Óscar Gil. No som Artur Neves. Eu na escrita. António Cardoso mandava as reportagens para Neiva Moreira e Beatriz Bissio, que as colocavam nos principais Media da América Latina.
Desde então nasceu uma profunda
amizade com o General Xietu. Grande proximidade. Andei ao colo com o Bulinha,
seu filho. Criámos um sentimento de irmandade. Contava-me episódios da
guerrilha, alguns picarescos. Aquele guerrilheiro que usava palavra caras e um
dia, carregado em excesso e ao fim de muitos quilómetros de marcha, o
Comandante Xietu deu-lhe mais um saco para aliviar um camarada
Um dia foi redigida uma carta, cem vezes copiada, que era deixada nas picadas e nos trilhos por onde passavam as tropas de ocupação. Texto: “Chefes burros. Vão embora. A terra é nossa. Não atirem os jovens portugueses para a morte”. Horas sem fim, o Comandante Xietu contou-me como era o dia-a-dia dos guerrilheiros do MPLA na Frente Leste.
O seu sentido de humor era inesgotável. Um dia, após o Acordo de Bicesse, estava em casa de Armando Guinapo com um amigo, o João Beato, empenhado em criar uma empresa de pescas.
Andava à procura de um parceiro angolano. De repente chegou o Comandante Xietu. Feitas as apresentações, ele virou-se para a visita e disse: Tu és português? Depois perfilou-se e cantou: Heróis do mar…
O General Xietu foi o primeiro chefe do Estado-Maior General das FAPLA. Os golpistas do 27 de Maio queriam matá-lo. Por pouco falharam. Mas mataram os seus companheiros da cúpula das forças armadas: Comandantes Bula Matadi, que ele considerava um irmão, Dangereux, Nzaji e Eurico. O líder do golpe militar era um dos seus homens de confiança, Comandante Monstro Imortal. O General dos Generais aguentou firme no seu posto mas esmagado pelo desgosto. Até o seu proverbial sentido de humor esmoreceu.
O General Xietu é autor do prefácio do livro “Grandes Batalhas e Operações Militares Decisivas em Angola”, do General Higino Carneiro. A sua colaboração aconteceu quando já estava a lutar contra a doença. Uma boa forma de homenageá-lo é difundir esse texto importantíssimo.
Hoje faleceu. A vida é assim, está sempre a matar os melhore de nós.
Até sempre meu General, meu Comandante, meu amigo.
(A foto foi tirada na festa de casamento da Tininha (filha do General Kito) e do Gigi (filho do General Tetembwa). Um encontro de amigos nesta vida de desencontros.
* Jornalista
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