Rita Ferreira, editora de sociedade | Expresso (curto) - via newsletter
Bom dia.
O número de jovens entre os 12 e 20 anos internados em centros educativos pelo
crime de abuso sexual de crianças ou menores incapazes é o mais alto da última
década: no final de 2024, havia 14 adolescentes, todos rapazes, condenados por
tribunais de menores a permanecer presos em centros educativos.
Nunca houve raparigas retidas nestes estabelecimentos por abuso de menor ou de
violação neste período.
Este é o início da notícia que o Hugo Franco escreve esta manhã no Expresso.
Depois da que escreveu no final da semana passada sobre a violação de uma rapariga de 16 anos, por três rapazes entre
os 17 e os 19 anos, que filmaram e publicaram nas redes sociais os atos que
praticaram.
Milhares de pessoas viram o vídeo, nenhuma denunciou.
Na segunda-feira, tivemos acesso ao relatório preliminar da segurança interna,
o RASI. E lá estava o destaque para o abuso sexual de crianças cometido por
ofensores menores, com idades entre os 12 e os 16 anos.
“O documento frisa que estão referenciados grupos de WhatsApp criados por crianças entre
os 10 e 13 anos em que se partilham conteúdos multimédia de pornografia e de
violência extrema”, casos que seguiram para os Tribunais de Família e
Menores.
Discutir o que é extremo pode enviesar a narrativa, dir-se-á. Mas ignorar os sinais será pior ainda.
O que leva estes e outros rapazes a odiar as raparigas, ao ponto de serem violentos?
Novas conversas e discussões surgem: temos de olhar para os rapazes, dar-lhes mais atenção. Porque estão a ficar para trás na escola e nas qualificações, perdem os trabalhos mais bem pagos, estão sem auto-estima, sem amor-próprio. E isso leva-os a juntar-se na “manosfera”, unidos numa tribo que já só tem uma arma: o poderio físico e a violência.
E dizer isto, escrever isto, não estará a estereotipar milhões de rapazes? Dar a entender que um qualquer miúdo é um predador sexual, ou um agressor em potência, é sequer aceitável? Por que razão os rapazes seriam por si só mais violentos que as raparigas? Por que razão seriam piores seres humanos?
O machismo e a violência dos homens sobre as mulheres não é novo. O exibicionismo e o voyeurismo da violência também não. Talvez seja novo o sentimento de inferioridade destes rapazes, mascarado de uma masculinidade tóxica; é novo de certeza o mundo onde todos eles se movem, cheio de salas virtuais, acesso ilimitado e identidades escondidas atrás de écrãs, que lhes dificulta (e distorce?) a distinção entre bem e mal, jogo e real, vida e morte.
Vai ser preciso mais do que uma boa série de televisão para os compreendermos. Com toda a certeza vai ser preciso ouvi-los, mais e melhor.
Outras notícias
“Hamas fora!” O cessar-fogo na Faixa de Gaza criou na população a ilusão
de que poderia continuar com a vida após quase ano e meio de uma guerra sem
igual. A retoma dos bombardeamentos israelitas levou-a de volta ao inferno. Em
várias cidades, protestos populares inéditos exigiram a saída do Hamas do poder.
Trump chateado com Putin e com Zelensky. O presidente dos Estados Unidos
decidiu fazer ameaças de imposição de tarifas “a todo o petróleo que sai da Rússia”,
numa entrevista dada à BBC. Na viagem de avião de volta aos EUA, virou-se para Zelensky: "Vejo-o a tentar sair do
acordo de terras raras. E se o fizer, estará em apuros”.
Decisão em França. Marine Le Pen sabe hoje se pode ser candidata às presidenciais de 2027. Se for
condenada no caso do alegado desvio de fundos europeus, a líder de facto da
extrema-direita francesa fica impossibilitada de concorrer à sucessão de
Emmanuel Macron.
“Problema de seriedade e transparência.” Pedro Nuno Santos voltou a criticar duramente o primeiro-ministro,
considerando a investigação do Ministério Público à maior obra pública de
Espinho envolvendo o escritório de Luís Montenegro - noticiada pelo Expresso - o "caso mais
grave" desde que a crise política começou.
Listas aprovadas. A Iniciativa Liberal aprovou este domingo
Gomes vs Proença. Estalou a polémica entre ex e atual presidente
da Federação Portuguesa de Futebol. Fernando Gomes desmentiu Pedro Proença anunciando que
não o apoia na corrida ao Comité Executivo da UEFA. Proença fala em “gravíssimas insinuações” e marcou uma reunião de urgênciada
direção da FPF para hoje.
Oceanos em Paris. A Torre Eiffel iluminou-se da cor do mar para receber o
“SOS Oceano”, que juntou perto de uma centena de personalidades de diversas
áreas para lançar um manifesto que conta com o apoio do Presidente Emmanuel Macron,
e desafia os líderes políticos a agir nos próximos cinco anos. A Carla Tomás está lá para dar conta das decisões.
A história estranha da Raize. A atual gestão da empresa Raize queria que a assembleia geral decidisse processar os administradores
que saíram há um ano. Acabou por retirar a proposta sem qualquer
explicação. A CMVM obrigou-a a vir justificar-se. Pelo meio, a instituição
procura capital para continuar a existir.
“Podemos todos ter calma?” O presidente da OpenAI, Sam Altman, teve de pedir calma aos milhões de utilizadores que de um dia
para o outro desataram a gerar imagens ao estilo dos estúdios de animação
japoneses Ghibli. Mas não era apenas uma questão de nervos, o problema era
obviamente de direitos de autor e a dona do ChatGPT acabou por anunciar um
bloqueio à produção destas imagens.
Frases
“As miúdas eram inteligentes. Duas estudaram e quando chegou a altura para a
faculdade a minha patroa, que era minha amiga, que sempre ajudou a comprar
cadernos e lápis para as crianças, ficou triste comigo. Deixou de ser minha
amiga. Disse que as miúdas não tinham que ir para a faculdade, que eu tinha que
ensiná-las a fazer uma sopa, passar a ferro uma roupa, descascar batatas e
cenoura”, Palmira Joaquim, 65 anos, cuidadora geriátrica, entrevistada
pelo Fumaça
“Foi um momento histórico, um marco histórico, representar uma classe e abrir
as portas para que mais colegas possam fazer parte deste palco nacional. Estamos
mais do que preparadas para este compromisso”, Catarina Campos, a primeira mulher portuguesa a apitar um jogo
da I Liga, no final do Casa Pia-Rio Ave
Podcasts
Expresso da manhã. Bruxelas propôs
aos cidadãos europeus que tenham em casa kits de sobrevivência. Paulo Baldaia conversa com Pedro Cordeiro, editor de
Internacional do Expresso, e tentam responder a estas perguntas: Serão os
EUA e a Rússia as tenazes que pressionam a Europa? Bruxelas precisa de um kit
de sobrevivência para a Democracia?
O CEO é o limite. No
episódio de hoje a Cátia Mateus entrevista Frederico Magalhães, fundador da
Sisqual: “Temos pessoas fantásticas que são péssimos líderes, são lobos
solitários”
No Leste/Oeste, Nuno Rogeiro analisa os ensaios laboratoriais de Trump na Casa
Branca, a obsessão americana com a Gronelândia e os recuos na Guerra na
Ucrânia
Contas poupança. A
Inteligência Artificial pode ajudar-me a poupar? Pedro Andersson conversa com a IA
Consulta aberta. Margarida
Graça Santos trouxe ao podcast Miguel Peliteiro, interno de neurorradiologia e um dos
fundadores da Dioscope: “Cresci na Póvoa do Varzim a ver o médico ser
uma figura incontestável. A medicina continua paternalista, temos de envolver
mais o doente”
O que ando a ouvir:
O novo álbum de Capicua, Um Gelado Antes do Fim do Mundo. Fica aqui
um excerto da letra poderosa de Making Teenage Ana Proud:
Estamos fartas de penar o dobro para ter metade
Estamos fartas da vergonha pelo corpo e na idade
De perder anos de vida na senda pouco sadia
De querer viver até aos cem, sem envelhecer um dia
Mães trabalham como hoje, mas em casa é como dantes
Tudo mina a autoestima de meninas e mulheres brilhantes
Enquanto afaga o ego de qualquer gajo mediano
Encontrando em cada adulto funcional o pai do ano
O tal duplo critério é o sal do patriarcado
Estamos sempre em desvantagem no mesmo micromercado
Exaustas de ter mais bagagem às costas no mesmo trilho, diz-me:
Quantos homens que idolatras criam os seus filhos?
Quantos homens geniais criaram os seus filhos?
Quantas mães sobrecarregadas ficaram sem brilho?
Este Expresso Curto fica por aqui. Tenha uma excelente semana e siga-nos também na Tribuna, na Blitz e no Boa Cama Boa Mesa.
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