Comemorações dos 60 anos do MPLA |
TENACIDADE
E AUDÁCIA FACE A INDESCRITÍVEIS RISCOS EM MÚLTIPLAS FRENTES
Martinho Júnior, Luanda
5
– Depois de se transferir para Brazzaville e lançado o laboratório de Cabinda,
IIª Região Político Militar, foi possível ao MPLA organizar esforços em socorro
da Iª Região Político Militar, tirando partido ainda da ajuda cubana tendo como
principais referências “Humberto”, que é hoje Herói Nacional da República
de Cuba, o General Rafael Moracén Limonta e “Silva”, o então capitão Kodjo
Tshikata, que chegou a Vice-Presidente do Gana num dos governos de Jerry
Rawlings.
Nos
campos de treino do Congo instruíram-se e organizaram-se esquadrões que iriam
ter um longo deslocamento em três colunas distintas, ao nível de agrupamentos
de cerca de 100 homens, que se moveriam sucessivamente, uma após outra, até aos
Dembos, próximo da capital Luanda.
Para
o efeito esses esquadrões e outros movimentos que foram feitos na ligação entre
a República do Congo e a Iª Região Político Militar, haveriam de encontrar
múltiplos riscos e provas de fogo, para além das dificuldades inerentes aos
próprios percursos a percorrer.
A
travessia de rios caudalosos e a época das chuvas inviabilizavam muitas
questões inerentes à logística alimentar (as colunas levavam alimentos em
quantidade tão exígua que a fome era um risco corrente devido ao prolongar do
tempo gasto nos percursos e em função dos obstáculos naturais), à
praticabilidade das travessias (nas travessias de rios caudalosos, eram raras
as canoas, pelo que muitas travessias eram feitas a nado, ou a vau, ou sobre
troncos de árvores) e à saúde dos combatentes (afetados sobretudo por doenças
tropicais).
O
camarada Kolokié, é citado como um dos guias conhecedores dos percursos, que
foi optando por fazê-los na época do cacimbo, tornando as deslocações muito
mais rápidas, mais saudáveis e mais seguras, evitando a caça de forças inimigas
sempre à procura de deter ou matar os combatentes e apreender as armas, dentro
do Zaíre, como dentro de Angola, procurando a todo o transe neutralizar o
trânsito dos esquadrões.
Os
esquadrões enfrentavam efetivos inimigos que trabalhavam tacitamente em
coordenação: militares das Forces Armées Zairoises e Polícia Zairense, o
Exército de Libertação Nacional de Angola (ELNA), da UPA/FNLA, ao serviço do
GRAE, as Forças Armadas Portuguesas e a PIDE/DGS.
Os
riscos podiam ser desde a sua detecção, à sua prisão, à penetração de agentes
contrários nas fileiras, ou ao aniquilamento, em três países distintos: no
Congo Brazzaville (em menor intensidade), no Congo Léopoldville (em forte
intensidade) e dentro de Angola colonizada (risco maior).
Esses
dispositivos implicavam também e por conseguinte por parte do MPLA, contra
medidas que procurassem inviabilizar que serviços de inteligência instalados
sobretudo no Zaíre e dentro de Angola, levassem a cabo seus objectivos de
neutralização:
-
Em Brazzaville actuavam serviços de inteligência afectos à NATO, capazes de
produzir informação em benefício do colonialismo português e os homens de
Alexandre Tati, orientados pela PIDE/DGS, com o rótulo da FLEC, para a
localização de bases e efectivos do MPLA;
-
Em Léopoldville operaram contra o MPLA a CIA, o CND zairense, a PIDE/DGS por
dentro dos serviços diplomáticos portugueses presentes e os sistemas de
informação do GRAE no terreno;
-
Em Angola, o ELNA, o sistema de pesquisa de informação no terreno por parte da
UPA/FNLA, organizada em centrais operativas, as Forças Armadas Portuguesas e a
PIDE/DGS que montou contra a Iª Região Político Militar um autêntico “triângulo
das Bermudas” no terreno da acção (Delegações no Caxito, em Kibaxe e em
Catete), em reforço dos seus dispositivos em Luanda, explorando as redes locais
de comerciantes, de fazendeiros e duma parte da implantação da Igreja Católica.
O
MPLA era obrigado a severas medidas de clandestinidade em toda a linha de
desdobramento e, apesar dos reveses, isso foi dando a dimensão da conexão entre
os expedientes coloniais e os expedientes neocoloniais em curso, que integravam
a prática corrente do imperialismo em África!
Na
sua própria carne, o MPLA sentia que o imperialismo não era teoria alguma de
conspiração, antes uma prática permanente, hostil e intempestiva, que só com
rigorosas contra medidas de clandestinidade se podia vencer.
Esse
era um processo materialista dialético de natureza antropológica e
marxista-leninista face ao tipo das contradições que estavam em campo, pelo que
a sobrevivência só podia ser garantida pelos mais conhecedores, mais
mobilizados, mais organizados, mais disciplinados e mais consequentes dos
processos de luta de libertação, que davam de caras com os cruéis desafios que
se apresentavam, pelo que a ideologia era por si uma arma inteligente que
mobilizava como nenhuma outra as capacidades humanas do MPLA e ajudava a vencer
as inaptidões técnicas, a falta de experiência, ou todo o tipo de fragilidades
que se colocavam no âmbito duma árdua luta nacionalista e libertária!
Também
em relação a essa arma foram importantes os instrutores que deram a sua
contribuição inestimável para a mobilização, formação, organização e disciplina
dos combatentes.
De
entre os heroicos combatentes clandestinos do MPLA no Congo Léopoldville,
destacam-se a camarada Jovita Nunes, havendo comités clandestinos em
Léopoldville, em Mbanza Ngungu, Matadi, Boma, Moanda, Lubumbashi e Dilolo…
Dos
esquadrões, apenas o Camilo Cienfuegos chegou quase intato à Iª Região Político
Militar em 1966, tendo no seu comando os camaradas Jacob João Caetano, “Monstro
Imortal” e Joaquim Domingos, “Valódia”…
O
esquadrão Kamy (comandado pelo camarada Benigno Vieira Lopes, “Ingo”) foi
detectado e só 19 dos seus componentes conseguiram chegar à Iª Região
Política-Militar do MPLA, tendo os que tentaram regressar sido presos, já sem
alimentação, exaustos ou quase inanimados, pela FNLA…
6
– A introdução da arma ideológica em função dos desafios que se apresentavam no
terreno (nos dois Congos e na Angola colonizada) foi um resultado natural face
às vicissitudes, sob os auspícios do Presidente Agostinho Neto e dum núcleo de
quadros cuja linha de pensamento e acção era materialista dialética e não podia
deixar de o ser, face aos objectivos do Programa Mínimo e do Programa Maior.
Os
quadros instrutores colocados ao serviço do MPLA em função da IIª coluna do Che,
mais o camarada “Silva”, por seu turno, estavam perfeitamente adaptados a
esse tipo de convicções, que permitiam enfrentar o colonialismo e os esbirros
neocoloniais do império.
O
MPLA teve essa forja escaldante de luta e pôde avaliar, quando se era derrotado
no terreno, que isso poderia significar entre outros riscos, prisão, tortura,
ou mesmo morte.
Essa
experiência foi sensível, valiosa e jamais foi abandonada até nossos dias,
apesar das transformações por que o MPLA foi passando desde o fim da República
Popular de Angola, inclusive na sua última trilha social-democrata!
O
MPLA enquanto partido de massas e de quadros, não pode deixar de reflectir
sobre si próprio e, no âmbito dessas reflexões muitos recorrem à história e à
arma ideológica das horas mais decisivas, elaborada a partir do materialismo
dialético, por razões imperativas da afirmação de independência, de soberania
nacional, de paz, de harmonia, de constitucionalidade e de luta contra o
subdesenvolvimento, conferindo os melhores alicerces para se continuar a
definir o rumo do MPLA e do estado angolano.
Essa
capacidade é portanto também imprescindível em termos de análise da evolução da
situação global, continental, regional e nacional, correspondendo à tarimba de
cada membro, em especial aqueles vivenciados no mais aceso da luta, reflectir
sobre o capitalismo neoliberal, sobre seus impactos e incidências
antropológicas e históricas, sobre a economia de mercado que se apresenta,
sobre as questões sócio-políticas que se levantam e sobre as opções de escolha
face aos desafios…
Mais
de trinta anos depois do desaparecimento do Partido do Trabalho, das
capacidades mais vigorosas da Segurança do Estado e das gloriosas FAPLA em
defesa da independência e soberania, a história absolverá aqueles que, com base
no materialismo dialético, levaram (e levam) a luta a escalões cujo nível foi
(e é) impossível por outros de superar!...
…
e para o MPLA, a Luta Continua!...
Do
anterior:
- Uma
longa luta em África – I – http://paginaglobal.blogspot.com/2016/11/uma-longa-luta-em-africa-i.html
- Uma
longa luta em África – II – http://paginaglobal.blogspot.pt/2016/11/uma-longa-luta-em-africa-ii.html
- MPLA,
60 anos de lutas e de vitórias – http://paginaglobal.blogspot.pt/2016/12/mpla-60-anos-de-luta-e-de-vitorias.html
- De Argel… ao Cabo da Boa Esperança! – http://paginaglobal.blogspot.com/2016/12/de-argel.html