sábado, 2 de setembro de 2023

Angola | UM OLHAR SOBRE OS MEDIA – Artur Queiroz


Artur Queiroz*, Luanda

Os Presidentes João Lourenço e Lula da Silva concederam uma conferência de imprensa em Luanda. Os jornalistas brasileiros estavam em larga maioria. Percebe-se porquê. O Brasil tem 514 jornais e revistas. Rádios, são 10.000 estações, 545 redes de televisão geradoras e 13.630 estações retransmissoras, mais a agência noticiosa (Agência Brasil, antiga Empresa Brasileira de Notícias). O Presidente brasileiro levou para a Cimeira dos BRICS em Joanesburgo uma fortíssima delegação empresarial e dos Media. Foram todos para Luanda na sua primeira visita de estado a um país africano neste mandato. 

Os Media angolanos dignos desse nome estavam presentes mas são poucos. Um pasquim no dia 28 de Agosto escreveu que José Eduardo dos Santos foi “um líder falhado, fracassado, incompetente, um reles e déspota ditador”. Primou pela ausência. Graça Campos, antigo sócio do Miala também faltou à chamada. Estava encharcado em kapuka e os bêbedos não querem sabor de jornalismo para nada. A analfabeta funcional Luzia Moniz também não apareceu por lá. Está a gastar as remessas de dinheiro sujo. Os profissionais compareceram. 

Lula da Silva fez declarações importantíssimas que foram amplificadas pelas estações de rádio e os canais de televisão. A Imprensa pouco valorizou. Não por censura mas por opção editorial. Os meios audiovisuais fizeram directos da conferência de imprensa. Os jornais deram o essencial resumido. Um critério válido para quem tem de gerir o espaço num meio impresso em papel que não estica, não dá para meter mais do que cabe no edifício gráfico.

No final da conferência de imprensa o Presidente Lula disse que os jornalistas estavam muito bem comportados. Lá no Brasil cobram mais. Estava a dirigir-se aos muitos jornalistas brasileiros presentes, não aos poucos angolanos. Aliás um deles, director do Novo Jornal, até lhe fez três perguntas e uma sugestão que o presidente brasileiro levou em consideração na parte em que Armindo Laureano sugeriu que o Brasil fizesse telenovelas sobre as ligações do país com África.

O comentário de Lula da Silva sobre o bom comportamento dos jornalistas brasileiros na conferência de imprensa serviu para Teixeira Cândido, secretário-geral dos Sindicato dos Jornalistas, dar uma entrevista ao instrumento de propaganda do governo alemão, Deutsche Welle. Disse o ngamba da UNITA que o comentário de Lula da Silva “foi uma crítica ao estilo de jornalismo que se faz, fundamentalmente no setor público, porque os jornalistas que estavam presentes na sala eram maioritariamente de órgãos públicos, cuja atuação é condicionada por todas as razões e mais algumas”.

O líder sindical pensa assim dos profissionais que era suposto representar. Para ele os jornalistas do “setor público” são uns vendidos, condicionados por todas as razões e mais algumas ou serventes dos “gestores nomeados pelo Presidente da República que não têm, obviamente, independência perante o poder político. O que resta aos colegas é fazer um jornalismo que designamos como institucional ou administrativo”. 

Teixeira Cândido usurpou o papel dos pasquins no insulto aos jornalistas que trabalham no sector público da comunicação social. Até ao momento em que escrevo não registei a mínima reacção pública. Nem sequer para explicar ao franganito do Galo Negro que os gestores dos Media, sejam públicos ou privados, não podem interferir na área editorial. Se interferem é porque os jornalistas consentem. O que duvido muito. O secretário-geral do Sindicato dos Jornalistas é empregado da Empresa Edições Novembro e pertenceu à Redacção do Jornal de Angola. Nunca fez qualquer comentário enquanto esteve no activo. Pelo contrário. Quando a Medianova lançou o jornal O País, foi “requisitado” para esse órgão privado. E ganhava a dois carrinhos! Dentro das minhas atribuições, aconselhei a administração da empresa pública a acabar com essa prática incorrecta de jornalistas da casa (existiam vários requisitados…) trabalharem para outras instituições, públicas ou privadas. O meu parecer não foi aceite. Mas cumpri o meu dever.

Teixeira Cândido na sua diatribe insultuosa contra os Jornalistas dos Media públicos disse ao instrumento de propaganda do governo alemão que em Angola “não se consegue governar sem os Media por perto, os Media fundamentalmente favoráveis”. Um sindicalista não é obrigado a saber do que fala. Mas convinha que conhecesse minimamente o panorama mediático angolano. 

Jornal de Angola tem sede em Luanda, cidade com mais de dez milhões de habitantes. Tendo em conta os números das tiragens e circulação não atinge 0,2 por cento da população da capital. Se reduzirmos o campo aos adultos alfabetizados, atinge no máximo dois por cento. 

Não sei qual é hoje a realidade mas entre 2003 e 2015 o Jornal de Angola atingia fundamentalmente a classe média-alta. Tinha razoável penetração nos líderes de opinião. Isso significa que chovia no molhado, apenas chegava os apoiantes do MPLA e do seu Governo. Portanto, era dispensável. Face a este quadro tenho uma certeza: Quem governa precisa tanto do Jornal de Angola como Teixeira Cândido precisa de porrada. 

O Jornal de Angola é o órgão da Imprensa angolana com a mais elevada circulação e o único com expansão através das suas Direcções Provinciais. Sim, nas províncias tem vida própria e influência. Mas ninguém está à espera do periódico centenário para governar. 

A Rádio Nacional é o mais potente meio de comunicação social. O de maior audiência. O que chega a todo o país ainda que a qualidade do sinal seja deficiente. Teixeira Cândido oiça um dia inteiro a RNA. Consulte a grelha de programas e diga se o Governo precisa desse instrumento para governar. Claro que não.

A TPA migrou para tecnologias mais avançadas e em vez de ganhar, perdeu. Existe ali um buraco técnico medonho. A informação é irrelevante. Aquilo é um brinquedo da turma do Miala. Sabem tanto de comunicação social como o Teixeira Cândido de otorrinolaringologia. Um fracasso medonho. A ANGOP cumpre mas não me parece que ministras e ministros estejam à espera dos repórteres da agência noticiosa para governar. 

A fantasia de que os Media públicos não são livres, que os seus profissionais são censurados, tem de acabar. Sim, em Angola temos um problema grave que se chama incompetência profissional. Mas os Media públicos formaram e continuam a formar os profissionais que trabalham no sector. No Jornal de Angola, entre 2003 e 2015 foram formados de raiz ou actualizados, 97 profissionais. É obra de aplaudir e não de atirar ao lixo ou desprezar.

*Jornalista

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