quinta-feira, 30 de novembro de 2023

Angola | Valeriano o Dia dos Namorados e a Lua de Mel – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

O General Nando Cuito enviou-me uma mensagem dando notícia do falecimento do General Valeriano, um dos Heróis da Batalha do Cuito Cuanavale. No Triângulo do Tumpo, dia 23 de Março de 2010, fiz uma reportagem sobre o acontecimento que mudou África e o Mundo, porque ditou o fim do regime de apartheid. Comigo estava o fotojornalista “50”, meu companheiro desde o início da “empreitada” de limpar a poeira e o lodo que cobriam a Grande Batalha do Cuito Cuanavale. Da equipa também fez parte o repórter Adalberto Ceita. Entrevistámos o General Valeriano e todos os comandantes das brigadas que ainda estavam vivos nessa época.

O material recolhido ao longo dos anos vai constar de um livro do General Nando Cuito com o título provisório “Triângulo do Tumpo a Catedral da Liberdade”. As páginas que se seguem, foram extraídas da obra em preparação. Os elementos sobre as movimentações das tropas sul-africanas foram recolhidos de relatórios militares de Pretória mas também do livro WAR IN ANGOLA: THE FINAL SOUTH AFRICAN PHASE, do historiador e analista militar, Helmod-Romer Heitman.

As tropas sul-africanas decidiram atacar a 59ª Brigada das FAPLA, comandada pelo actual Brigadeiro Arnaldo Kambissula, no dia 14 de Fevereiro de 1988. As tropas angolanas ocupavam posições defensivas a Leste da vila do Cuito Cuanavale. Os jovens que se batiam pela defesa da Pátria nem sequer se lembraram que era o Dia dos Namorados. Mas estavam preparados para rechaçar todas as investidas do inimigo, até porem fim ao regime de apartheid, nas colinas, nos areais, nos pântanos e nas matas do Cuando Cubango.

Um desses Heróis era o então capitão Valeriano, que comandava a 25ª brigada. Ele e o comandante do agrupamento, General Nando Cuito, protagonizaram um episódio pleno de humanismo e camaradagem. O jovem comandante contraiu matrimónio em plena guerra. Confiava na vitória das FAPLA e no futuro do Povo Angolano. A esposa foi ter com ele ao Cuito Cuanavale. O seu camarada que comandava o agrupamento cedeu-lhe as suas instalações para o casal passar a lua-de-mel! Ali onde troavam os canhões e choviam bombas, houve espaço para o amor. Assim se derrotou o regime de apartheid e os EUA, seus apoiantes e mentores.

No início de Fevereiro de 1988 (ano bissexto) a 21ª Brigada comandada pelo capitão Ngueleca (já falecido) estava desdobrada a Nordeste do Cuito Cuanavale, entre os rios Cuatir e Dala. A 59ª Brigada estava a Leste do Cuito Cuanavale e a 25ªe Brigada, comandada pelo capitão Valeriano, a Oeste da ponte sobre o rio Chambinga. O terceiro grupo táctico estava no Tumpo. Primeiro comandava tenente Beto (falecido) e depois o segundo tenente Remígio, hoje General.

O plano dos racistas de Pretória, enfeitados com os fantoches de Jonas Savimbi, era atacar as principais posições da 21ª Brigada das FAPLA, com o IV Batalhão de Infantaria da África do Sul. As tropas sul-africanas atacavam simultaneamente as principais posições da 59ª Brigada a Noroeste. Esta unidade das FAPLA era considerada pelo inimigo como fundamental no sistema defensivo nas colinas de Chambinga. Mas as contas dos invasores saíram furadas. Os homens do capitão Arnaldo Kambissula bateram-se heroicamente e o inimigo retirou. O mesmo aconreveu com a força do capitão Valeriano. Os invasores registavam derrotas sobre derrotas.

A perda de operacionais, devido à hepatite e à malária, fez com que os sul-africanos alterassem os seus planos e destinaram à UNITA o ataque à 21ª Brigada do capitão Valeriano, que ocupava posições a Nordeste do Cuito Cuanavale. As tropas de Jonas Savimbi fracassaram rotundamente. Só estavam preparadas para as fotografias quando os sul-africanos ganhavam posições. Levaram uma tareia militar!

Naquele 4 de Fevereiro de 1988, o 61º Batalhão Mecanizado Sul-africano devia desdobrar-se a Sul das posições da 21ª Brigada das FAPLA, para servir de reserva móvel ao ataque do IV Batalhão de Infantaria sul-africano contra a 59ª Brigada das FAPLA. Servia também de tampão a qualquer unidade das FAPLA presente no Triângulo do Tumpo. 

Às quatro da manhã de 14 de Fevereiro as unidades dos racistas e da UNITA já estavam preparadas para entrar em movimento. Às 07h00 do dia 14 Fevereiro, a artilharia começou a executar o seu plano de fogo, primeiro flagelando as posições das FAPLA no Triângulo do Tumpo e depois as posições da 21ª Brigada das FAPLA. Às 08h50 foi dada a ordem para avançar.

Combate Relâmpago

Às 08h50, as tropas da UNITA movimentaram-se das áreas avançadas de concentração. O 61º Batalhão Mecanizado sul-africano partiu primeiro, seguido pelo Esquadrão do Regimento Molopo (“Esquadrão F”) e uma parte do IV Batalhão de Infantaria. O céu estava coberto de nuvens baixas, o que impedia qualquer acção dos MIG da Força Aérea Nacional. De repente o sol começou a brilhar e a aviação de guerra angolana entrou em acção. As tropas do IV Batalhão tiveram que procurar refúgio, sempre que os aviões sobrevoavam a zona.  

Às 09h10, quatro MIG conseguiram estancar o avanço do IV Batalhão de Infantaria, forçando-o a refugiar-se. Às 09h25, os batalhões da UNITA atacaram, a noroeste, as posições avançadas da 21ª Brigada. Blindados dos invasores sul-africanos aproximavam-se a Leste. Às 09h50, os BM-21 posicionaram-se perto do Posto de Comando da Brigada e começaram a disparar contra a infantaria da UNITA, causando-lhe pesadas baixas. Às 09h50, as tropas de Savimbi foram obrigadas a recuar até ao ponto de partida. Só aguentaram 25 minutos no combate! Os homens de Valeriano, Kambissula, Ngueleca e Remígio bateram-se heroicamente.

Às 10h30 do dia 14 de Fevereiro de 1988 o 61º Batalhão Mecanizado e o IV Batalhão de Infantaria continuaram a avançar. Às 10h57, os artilheiros sul-africanos bombardearam as posições da 59ª Brigada das FAPLA, “só para afinar a pontaria”. Às 11h14, a artilharia da 21ª Brigada das FAPLA abriu fogo contra o 61º Batalhão Mecanizado, com morteiros, canhão D-30/M-46 e BM-21. Os MIG sobrevoavam constantemente o campo de batalha, causando atrasos às forças sul-africanas em movimento ofensivo. Às 11h42, o 61º Batalhão Mecanizado sul-africano, que se desdobrava à frente do IV Batalhão de Infantaria, foi atacado pelos MIG. Às 12h30, a artilharia da 21ª Brigada do capitão Ngueleca abriu fogo devastador.

As Bolas de Fogo

Às 14h02, o IV Batalhão de Infantaria sul-africano colocou-se na posição de combate. O esquadrão de tanques de Tim Rudman, colocou-se numa posição plana. Uma companhia de infantaria seguia de perto o que se estava a passar, com os Ratel-20, prontos para se movimentarem e juntarem aos tanques quando e onde fosse necessário. Duas companhias apeadas do III Batalhão Regular da UNITA estavam dispostas ao lado dos tanques Oliphant e dos Ratel. 

Tim Rudman disparou dois obuses de iluminação sobre o campo de batalha. Logo a seguir ao lançamento das bombas luminosas o IV Batalhão de Infantaria sul-africano avançou sobre as posições da 21ª Brigada. Às 14h30, a tropa invasora começou a ser flagelada com salvas de BM-21 da 21ª Brigada. Às 14h45, a tropa da UNITA teve o primeiro embate contra as FAPLA na sua posição nordeste. Às 14h55, a UNITA penetrou nas posições avançadas da 21ª Brigada das FAPLA. Desastre. Retiraram com numerosas baixas.

Às 15h04, Cassie Schoeman, comandante da infantaria inimiga, parou a sua tropa e retomou o ataque na direcção Leste-Oeste. Assim que obteve contacto visual com as FAPLA, recebeu a informação de um ataque iminente dos MIG. A 59ª Brigada das FAPLA pediu ajuda à 21ª Brigada do capitão Ngueleca e às forças do tenente Remígio.

Schoeman decidiu acelerar o ataque. Os disparos de morteiros das FAPLA foram precisos, tendo causado muitas baixam à infantaria da UNITA, que mais uma vez se pôs em fuga. O choque entre a sua unidade e a heróica 21º Brigada deixou marcas profundas na memória de Cassie Schoeman, o comandante do IV Batalhão da África do Sul, que contou mais tarde: “A visão das bolas de fogo, que vinham do meio dos arbustos, era assustadora”. (WAR IN ANGOLA: THE FINAL SOUTH AFRICAN PHASE, Helmod-Romer Heitman página 231)

Heróis da Liberdade

Um dos dois BM-21 foi atingido pelos tanques sul-africanos. A infantaria das FAPLA saltou das trincheiras e lançou-se sobre o inimigo, enquanto dispersava para ocupar novas posições. África e o mundo tinham no campo de batalha os verdadeiros Heróis da Liberdade. 

A 25ª brigada das FAPLA, comandada pelo capitão Valeriano, começou a disparar sobre o 61º Batalhão Mecanizado. Um dos disparos pôs fora de combate um Ratel. 

Às 16h30 do dia 1 de Fevereiro de 1988, a UNITA tomou posição a Sudeste e preparou uma emboscada para confinar os  movimentos da 25ª Brigada, naquela direcção. Os MIG entraram em cena, tendo efectuado bombardeamentos a sul das posições da 59ª Brigada. Por volta das 16h57, as tropas angolanas retiraram-se para ocupar novas posições no Triângulo do Tumpo. 

Às 17h13, o IV Batalhão de Infantaria sul-africano explorou as elevações a Leste do Triângulo do Tumpo, mas a mata densa não lhe permitiu avançar. Schoeman retirou-se e explorou a linha na parte oeste. Foi nesse preciso momento, que os observadores da artilharia começaram a informar sobre o movimento de tanques das FAPLA, a partir do Tumpo. Schoeman passou a informação ao coronel McLoughlin e os grupos de combate manobraram para enfrentar o contra-ataque das tropas angolanas.

“O 61º Batalhão Mecanizado estava a movimentar-se na direcção Sul para se juntar ao IV Batalhão de Infantaria com o fim de travar o contra-ataque das FAPLA. Os tanques iam a passar por um terreno aberto situado entre a nascente do rio Dala e as posições da 59ª Brigada. Dois MIG sobrevoavam o Posto de Comando Táctico sul-africano, a uma altitude tão baixa que o logístico em terra viu a cor branca do fato de voo de um dos pilotos. Contudo a camuflagem era tão densa que a técnica sul-africana não foi vista do ar. (WAR IN ANGOLA: THE FINAL SOUTH AFRICAN PHASE, Helmod-Romer Heitman página 232)

Os tanques das FAPLA juntaram-se às forças da 25ª Brigada do capitão Valeriano. As duas unidades movimentaram-se em socorro da 59ª Brigada. Efectuaram um movimento tão rápido que só foram localizados quando já se encontravam a dez metros de distância dos invasores.

Pelas 18h25, o 61º Batalhão Mecanizado estava debaixo do fogo directo da artilharia das FAPLA. Um Ratel foi atingido por uma metralhadora de 23mm. Um dos membros da tripulação ficou ferido. O tiro dos tanques das FAPLA tinha tanta precisão que se ajustava ao movimento dos tanques sul-africanos. Logo que a artilharia iniciou o fogo, os tanques das FAPLA cercaram e atacaram os tanques sul-africanos pelo Oeste, Sul e Leste, enquanto a artilharia apoiava a manobra.

Tanque Contra Tanque

Os invasores sul-africanos entraram em desespero quando as comunicações entre o IV Batalhão de Infantaria e o 61º Batalhão Mecanizado foram abaixo. Os dois grupos de combate começaram a manobrar para saírem de tão crítica situação. Para piorar as coisas, começou a escurecer. Por isso, foram obrigados a usar o canal de comunicações da artilharia e foguetes de sinalização.

Um tanque das FAPLA, inesperadamente, penetrou na formação do 61º Batalhão Mecanizado e chocou com o carro do comandante Mike Muller. A seguir, avançou para a mata, que estava a 50 metros do grupo de comando da força sul-africana, e disparou contra um Ratel, atingindo-o no diferencial. O comandante angolano (Tenente Nando) desse tanque levantou a escotilha e instalou-se na metralhadora, disparando-a ferozmente à sua volta. 

O major Christo Terblanche assistiu a tudo, de longe, sem poder fazer nada com o seu Ratel, por isso, atirou-se ao chão levando consigo uma metralhadora de 90mm. Correu em direcção ao T-55 com a intenção de lançar uma granada no interior da torreta. A barreira de fogo que encontrou, ao aproximar-se do tanque angolano, era de tal ordem que teve de se retirar rastejando. Mais tarde, um Ratel 90 disparou contra o tanque do tenente Nando, imobilizando-o. A 25ª Brigada do capitão Valeriano manteve-se nas suas posições, próxima da ponte sobre o rio Chambinga. 

Um Longo Dia

No final do dia 14 de Fevereiro de 1988 a 21ª Brigada, sob cobertura da 59ª Brigada e do Terceiro Batalhão de Tanques atravessou o rio Cuito e concentrou-se a Oeste para restabelecimento. Os esforços dos invasores para destruir a 21ª Brigada, desde a “Operação Moduler”, resultaram mais uma vez num fiasco.

Depois dos sul-africanos cercarem e imobilizarem a 59ª Brigada, as FAPLA desferiram um contra-ataque relâmpago, em três direcções convergentes, contra os dois grupos de combate sul-africanos e as unidades da UNITA, que a manietavam. O inimigo recuou, o que permitiu que a 59ª Brigada se retirasse para lá do rio Cuito onde se restabeleceu.  

A 25ª Brigada do capitão Valeriano manteve-se nas suas posições todo o dia 14 de Fevereiro e só às primeiras horas do dia 15 de Fevereiro de 1988 recebeu ordens para se retirar para as posições do Triângulo Tumpo. Tinha acabado o Dia dos Namorados!

O IV Batalhão de Infantaria da África do Sul e o 61º Batalhão Mecanizado não conseguiram destruir a 59ª Brigada e foram incapazes de impedir que a 25ª Brigada das FAPLA se mantivesse no Triângulo do Tumpo. O primeiro ataque ao Tumpo, de 14 de Fevereiro de 1988, falhou. 

A Chave do Tumpo

A 16 de Fevereiro de 1988, a 16ª e a 59ª Brigadas das FAPLA seguiram em direcção ao Cuito Cuanavale. Mas duas unidades mantiveram-se para lá da margem Leste do rio Cuito, no Triângulo do Tumpo.  Os sul-africanos, em Fevereiro de 1988, estavam convencidos de que o Tumpo era a chave da batalha. Se a tomassem de assalto, o Cuito Cuanavale caía de imediato.

“De facto, a perda do Tumpo também tornava o Cuito Cuanavale e a sua base aérea insustentáveis. Por enquanto, as forças sul-africanas tinham forçado as FAPLA a afastar a maioria das suas unidades da vila e tinham fechado a base aérea temporariamente. Com o controlo pelos sul-africanos ou da UNITA da colina oriental, obrigavam as FAPLA a abandonar as duas posições. Tendo em conta as realidades geográficas da região, isto podia empurrar para trás, as defesas das FAPLA até à área de Menongue a próxima base e circuito aéreo principal.” (WAR IN ANGOLA: THE FINAL SOUTH AFRICAN PHASE, Helmod-Romer Heitman  página 243)

Por isso disseram que o Triângulo do Tumpo era o “O último bastião das FAPLA”. Mas na realidade foi o cemitério do regime de apartheid. Os operacionais das SADF estavam cientes de que as tropas angolanas, sem a pressão a que estavam submetidas, podiam fazer uso da vantagem territorial que detinham com relação ao planalto oriental do Cuito Cuanavale. 

“Se os sul-africanos se retirassem, as FAPLA poderiam usar a sua força convencional para rapidamente ampliar a cabeça-de-ponte e talvez ganhar espaço para manobrar a norte de Chambinga. Elas também podiam lançar uma nova ofensiva contra Mavinga logo que as chuvas terminassem. Esta possibilidade levou à tomada de decisão de atacar as posições das FAPLA na área do Tumpo, embora as forças das FAPLA a leste do rio Cuito não representassem nenhuma ameaça real. Era necessário criar uma situação militar que permitisse à UNITA permanecer no controlo do terreno vantajoso oposto ao Cuito Cuanavale. Isso permitiria a retirada dos sul-africanos.” (WAR IN ANGOLA: THE FINAL SOUTH AFRICAN PHASE, Helmod-Romer Heitman página 243)

O Princípio do Fim

O comando das FAPLA no Cuito Cuanavale preparou acções de combate, coordenadas e interligadas pelo mesmo objectivo, que foram desenvolvidas em cooperação com outras unidades: Rechaçar as acções ofensivas das SADF e da UNITA; defender, a todo custo, a aldeia de Samaria (Tumpo), a cabeça-de-ponte, a ponte sobre o rio Cuito e a própria vila do Cuito Cuanavale; Desgastar o seu potencial de combate; Ganhar tempo para permitir a chegada de reforços e reservas; Criar condições para realizar as operações subsequentes. 

No Cuito Cuanavale estava um destacamento da FAPA/DAA composto por uma parelha de SU-22, duas Parelhas de Mig-23, duas parelhas de MIG-25 e uma parelha de MI-17. As FAPLA prepararam-se durante dois anos, de 1986 a 1988, para a eventualidade de terem de travar as investidas dos sul-africanos. Foram realizadas tarefas ao mais alto nível na cadeia de comando das FAPLA que permitiram corrigir os aspectos negativos que contribuíram para o fracasso da operação “Segundo Congresso”, em 1985.

Os sul-africanos, com os seus meios aéreos, foram incapazes de ultrapassar o sistema de Defesa Aérea das FAPLA, constituído por Unidades de Defesa Antiaérea, equipadas com  sistemas SA-8 SAM, SA-9 e SA-13; mísseis portáteis SA-7, SA-14 e SA-16, actuando em estreita cooperação com a aviação de caça interceptores, os Mig-21 e Mig-23 ML e um subsistema de radares, entrelaçado desde o Lucusse a Caiundo, capaz de produzir uma malha de radiolocalização que se estendia muito para além da região do Chambinga.

 Foi por isso que os invasores sul-africanos optaram por usar, até à exaustão, a artilharia de campanha de longo alcance, os G-5 e G-6, este último, apto para o emprego de projecteis com ogivas nucleares, resultado da cooperação militar estreita entre a Africa do Sul e Israel país que tem igualmente um regime de apartheid. Angola também se transformou em polígono de tiro para o ensaio das novas peças de artilharia com a participação de especialistas israelitas. 

No entender dos sul-africanos “as defesas aéreas oponentes causaram menos problemas do que era suposto. Elas eram, na verdade, muito compactas – possuíam canhões antiaéreos de 14,5mm e os altamente eficientes canhões de 23mm; Lançadores portáteis SA-7, SA-14, os novos SA-16; e os sistemas SA-9, SA-13 e SA-8, todos eles enquadrados, de forma espaçada, nas brigadas das FAPLA, movendo-se o mais afastados uns dos outros, quanto fosse possível, para não comprometer a sua protecção mútua. À volta das bases aéreas de Menongue e do Cuito Cuanavale havia também os SA-3 e em Menongue os SA-2 e SA-6. Os sistemas estacionários eram protegidos pelos interceptores do tipo Mig-21 e Mig-23, sendo o último um potente caça e o primeiro foi essencialmente usado para ataques ao solo. Finalmente, todo o dispositivo era coberto pela malha de um sistema compacto de radares que lhe conferia uma margem confortável sobre as áreas dos alvos,  em particular, já que estas se encontravam completamente fora do alcance dos radares sul-africanos, especialmente a grandes altitudes…” (WAR IN ANGOLA: THE FINAL SOUTH AFRICAN PHAS,  Helmod-Romer Heitman páginas  312 e 313).

Também deve ser mencionado o trabalho realizado pelos caças interceptores e bombardeiros das FAPLA, os Mig-23 e os SU-22, secundados pelos Mig-21, no sentido de prestar apoio aéreo próximo às suas tropas. 

 “O que eles (os caças angolanos) conseguiram foi impedir, de forma consistente, que as operações aéreas sul-africanas se processassem sem sobressaltos. Não é exagero dizer que em algumas ocasiões, bastava que se verificasse a chegada dos MIG sobre o campo de batalha para prevenir a completa destruição das unidades das FAPLA. Foi também, em larga medida, por causa dos MIG que aquela pequena parcela da cabeça-de-ponte, que sobrou no Tumpo, pudesse ser mantida. Sem os MIG sobrevoando, a artilharia sul-africana teria sido capaz de silenciar os seus oponentes localizados no planalto ocidental. Isso teria possibilitado, depois, que as tropas terrestres limpassem o planalto oriental da presença das FAPLA. Seja como for a aviação angolana conseguiu forçar a SAAF a restringir as suas operações de transporte ao período nocturno. O facto das acções dos MIG terem exercido uma grande influência no desfecho dos combates em terra, é resultado da enorme relutância dos sul-africanos em aceitar as baixas. Uma força menos interessada neste aspecto poderia obter bastante mais contra um maior, porém não tão chocante, número de baixas.” (WAR IN ANGOLA: THE FINAL SOUTH AFRICAN PHASE, Helmod-Romer Heitman página 328).

Ainda houve uma segundo ataque ao Triângulo do Tumpo. Fracasso total. Por fim, a derrota definitiva do regime de apartheid, no dia 23 de Março de 1988. Lá nos campos de batalha comandavam os Generais José Domingos (Ngueto), e Fernando Mateus (Nando Cuito). As FAPLA d derrotaram a coligação mais agressiva e reaccionária do planeta, dirigida pelo estado terrorista mais perigoso do mundo, os EUA. 

O Presidente João Lourenço vai na quinta-feira prestar vassalagem aos agressores. 

O General Valeriano, hoje falecido, era o presidente do  Fórum dos Combatentes da Batalha do Cuito Cuanavale (FOCOBACC). Já restam poucos e tendem a acabar. O tempo está mais para as  e os beneficiários da Batalha do Cuito Cuanavale do que para os Heróis que se bateram  no Triângulo do Tumpo contra os invasores estrangeiros. A família do General Valeriano vai receber 700.000 Kwanzas (700 dólares) de subsídio de funeral. Temos de agradecer penhoradamente ao Presidente João Lourenço e ao capataz do estado terrorista mais perigoso do mundo, o mobutista Tulinabo Mushingi.

* Jornalista

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