Luís Nhanchote
– Verdade (mz)
A
empresa norte-americana Anadarko, uma das multinacionais com antecedentes no
derrame do Golfo do México, mas a quem o Governo concessionou parcelas no mar
para a pesquisa de gás e petróleo na Bacia do Rovuma, derramou cerca de 30 mil
litros de lama oleosa no mar, o que terá causado danos ambientais de impacto
desconhecido. O incidente ocorreu a 10 de Abril. A Anadarko frisa, num
comunicado posto a circular, que a lama oleosa “fluiu através da placa
giratória do navio de perfuração Belford Dolphin, provocando um derrame no
soalho da plataforma e descarregamento posterior para o mar”. Contudo, o
@Verdade apurou que a lama oleosa deveria ter sido atirada para um aterro, e
não para o mar.
Sobre
o derrame, que aconteceu durante uma perfuração no poço Tubarão Tigre 1,
localizado a 46 km
da costa de Mocímboa da Praia, a Anadarko apressa-se, no seu comunicado, a
garantir que o produto continha um fraco teor de toxicidade. A multinacional
americana diz no mesmo documento que não havia riscos ambientais e que não foram
detectadas manchas daquela substância após o sobrevoo na área do incidente. A
lama é um subproduto da perfuração de gás e constitui uma mistura de terra,
pedra e lubrificantes sintéticos (tóxicos), que são usados ??para perfurar em
alta pressão a camada no fundo do oceano.
O
comunicado da Anadarko faz referência às características da lama derramada com
baixa toxicidade: “contém 53 porcento de rácio de óleo, 30 porcento de água e
17 porcento de sólidos”, nomeadamente barite, cloretos e cálcio, provenientes
das formações geológicas perfuradas.
Práticas
de perfuração exageradas têm sido a causa de desastres ambientais provocados
por multinacionais que pesquisam gás e petróleo. E a Anadarko não é nenhuma
“santa” nessa matéria. Uma publicação do Medifax, citando um artigo da agência
de informação financeira americana Bloomberg, datado de Março deste ano, revela
o papel da Anadarko no derrame tóxico de 2010 (quatro milhões de barris) no
poço Macondo, no Golfo do México, o maior verificado nos Estados Unidos da América.
“De
acordo com a Bloomberg, uma troca de e-mails entre funcionários da BP (parceira
da Anadarko na exploração do Macondo, na qual a americana detém 25
porcento) e da companhia a que nos referimos, o desastre ocorreu porque a
Anadarko insistiu em que se perfurasse mais a fundo, mesmo contra as indicações
da BP de que havia pouca ou nenhuma margem para continuar a perfuração
"com segurança”. “Funcionários da Anadarko pediram à BP para perfurar mais
fundo no Golfo do México mesmo depois de ter sido advertida de que isso seria
inseguro”, escreve a Bloomberg.
Os
correios electrónicos citados foram posteriormente arrolados pelo Departamento
da Justiça americano como prova do envolvimento da Anadarko naquele desastre
ambiental, mas o juiz Carl Barbier, de Nova Orleães, recusou-se assumi-los.
Aquela instância tentava provar que a multinacional baseada no Texas esteve
envolvida na monitoria e na tomada de decisões sobre a perfuração do Macondo, o
que era suficiente para ser civilmente responsabilizada pelo desastre, com
sujeição ao pagamento, a par da BP, de uma multa de biliões de dólares pelos
danos ambientais causados. Sobre as alegações do seu envolvimento, a Anadarko,
escreve a Bloomberg, defendeu-se dizendo que era um “investidor passivo” e que,
por isso, não podia ser penalizada pela poluição que causou o encerramento da
indústria pesqueira e interesses turísticos desde o Texas à Florida, mas também
casos de saúde como cancro e outras infecções.
As
discussões entre os técnicos da BP e da Anadarko envolvidos no acidente de
Macondo revelam uma insistência daquela firma em perfurar mais o poço com o fim
de encontrar reservas adicionais de crude. Nalgum estágio das discussões, a
Anadarko concordou em interromper a perfuração, de acordo com os e-mails, sem no
entanto deixar de dizer que “no caso de a BP concluir que é seguro e prudente
continuar a perfuração, não se oporia”. E os seus gestores continuaram a
discutir formas de persuadir a BP a ir mais a fundo na perfuração.
Acidente
da Deepwater Horizon
Aquele
que é considerado o maior derrame da história dos mares da América Latina tem a
“mão” da Anadarko. Às 10h:00 de 20 de Abril de 2010, houve uma explosão na
plataforma de petróleo Deepwater Horizon Transocean, a 41 milhas (cerca de 64 quilómetros ) fora
da costa da Louisiana, no Golfo do México. O óleo foi extraído a partir de
uma plataforma de perfuração no fundo do mar a uma profundidade de mais de 1.500 metros no rio
Mississipi. E 115 dos 126 operadores desta plataforma foram evacuados com
sucesso, uma vez que os operadores foram mortos na explosão.
Apesar
de as companhias de petróleo terem uma larga experiência de perfuração, com
mais de uma década, em profundidades de mais de 1.525 metros , nunca
tinha havido um acidente como este. São cotados num relatório como
“sociedades de responsabilidade” a British Petroleum, a Anadarko e a
japonesa Mitsui & Co. A outra empresa envolvida é a Halliburton.
Eventuais
consequências…
De
acordo com um ambietalista ouvido pelo @Verdade, o óleo derramado pode afectar
as zonas húmidas costeiras ricas em biodiversidade, aves e animais marinhos. E
“podem ter começado a ser afectados”. De salientar que os trabalhadores que
limpam os produtos do derramamento estão sujeitos ao contágio, como sucedeu com
vários dos funcionários que estiveram envolvidos na limpeza do vazamento no
Golfo. De acordo com a nossa fonte, neste local os trabalhadores queixavam-se
de “náuseas, tonturas e dores de cabeça”.
No
seu plano de gestão ambiental, a Anadarko propõe as seguintes medidas de mitigação
para evitar ou reduzir impactos na navegação: avisos aos navegantes e
informação adequado relacionada com as actividades sísmicas da embarcação,
através da capitania dos portos de Maputo, da Beira, de Nacala e de
Dar-es-Salaam, bem como demais notificação de procedimentos.
Sobre
as transmissões de rádio a Anadarko indica que vai informar da actividade e
posição da embarcação sísmica em canais de navegação apropriados, tais como a
Rádio Naval. Isto irá garantir que outros navios tenham notificação adequada
para alterar a sua pretendida rota e impedir atrasos ao ter que aguardar até
que a embarcação sísmica esteja fora da sua rota.
A
companhia vai garantir que a embarcação sísmica esteja munida de um adequado
equipamento de radar para detectar quaisquer outros navios que possam ameaçar a
segurança e potencialmente interferir com o processo de levantamento. O “navio
escolta” deve utilizar esta informação para proteger, a toda a hora, a
integridade da zona de segurança ao redor da embarcação sísmica. O que terá
acontecido poderá dar respostas à passividade até agora demonstrada pelo
Governo moçambicano.
Deve
haver uma investigação independente
Relativamente
ao derrame acidental de lama oleosa no mar pela companhia petrolífera Anadarko,
a Justiça Ambiental (JA) entende que o Ministério para a Coordenação e Acção
Ambiental (MICOA) não tem capacidade técnica e material para fazer uma
investigação independente sobre o incidente, o que coloca o país num situação
vulnerável e de dependência de terceiros.
Vanessa
Cadanelas, técnica daquela organização que promove acções de protecção do meio
ambiente, explicou ao @Verdade que é necessário que a água da Bacia do Rovuma
seja testada para se avaliar os níveis de toxidade que podem ter sido causados
pelo derrame de lama oleosa, ou se a mesma contém ou não substâncias nocivas.
Segundo
a nossa entrevistada, aquela firma petrolífera divulgou tarde a informação
relativa ao derrame, o que deve merecer uma certa desconfiança por parte do
Governo. Caso as instituições do Estado não tenham mecanismos para monitorar as
acções da Anadarko recomenda a não realização de trabalhos desta natureza. O
MICOA, disse Vanessa Cadanelas, deve tomar uma posição imparcial e uma das
formas de garantir isso é contratar investigadores independentes, ou seja, que
não façam parte da sua instituição. E é preciso que as causas do acidente sejam
apuradas.
Issufo
Tankar, coordenador do Centro Terra Viva (CTV), corroborou a posição de Vanessa
ao referir que aquela instituição do Estado debate-se com falta de meios
técnicas para averiguar de perto as causas e os danos do derrame de lama oleosa
na Bacia do Rovuma.
À
nossa Reportagem, Tankar disse ainda que, apesar de a organização ter enviado
uma equipa para apurar os factos, a informação obtida é aquela que foi avançada
pela Anadarko logo depois do derrame. Não houve indícios de ocorrência do
incidente em alusão, como algum peixe, por exemplo. As declarações da população
não dão conta de algo de anormal.
Para
a coordenador do CTV, o facto de o derrame ter acontecido a sensivelmente 46 quilómetros de
Mocímboa da Praia, numa grande profundidade, pode dificultar a detecção de
qualquer problema. Contudo, 30 mil litros de lama oleosa é uma quantidade
susceptível de causar algum dano. O país deve estar preparado para monitorar o
trabalho realizado pelas empresas de extracção mineira. Alguns estudos
ambientais mostram uma tendência para que haja acontecimentos idênticos ao da
Anadarko, o que deixa transparecer a ideia de que o Executivo não acompanha de
perto as empresas.
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