quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Passos Coelho - Tecnoforma. PORTUGAL PRECISA DE UM ESCLARECIMENTO RÁPIDO



Luís Rosa – jornal i, opinião

O pedido do PM dirigido à PGR não deixa de ser o reconhecimento da fragilidade da sua posição e destina-se a ganhar tempo

Quando menos se esperava, voltamos a ter no horizonte um cenário de instabilidade política. O mais surpreendente é que não são as consequências da política de austeridade nem qualquer problema estrutural com o CDS que levam o próprio primeiro-ministro a admitir uma eventual demissão. É um caso judicial que está a gerar suspeitas numa altura em que é fundamental que o governo leve o seu mandato até ao final. A estabilidade foi um valor essencial para termos apenas um programa de assistência financeira. E continua a ser importante para não pôr em causa os frágeis sinais de retoma económica.

É importante que se diga que o caso Tecnoforma ainda não é totalmente claro. Há suspeitas mas ainda não há certezas. Há suspeitas de que Passos Coelho terá recebido cerca de 150 mil euros de uma organização não-governamental ligada à empresa Tecnoforma. Há suspeitas de que o então deputado do PSD estava em exclusividade mas, apesar de ter invocado tal estatuto para receber o subsídio de reintegração, não há a certeza de que estava mesmo impedido de receber outras remunerações. Partindo da hipótese de que não estaria em exclusividade, Passos Coelho não devia ter recebido 30 mil euros a título de subsídio de reintegração. Partindo da hipótese de que estaria em exclusividade, e de que recebeu 150 mil euros do grupo Tecnoforma, poderá ter violado a lei. Se se confirmar que recebeu entre 1997 e 1999 uma remuneração mensal de uma terceira entidade que não o parlamento, e não declarou os respectivos valores à administração fiscal, poderá ter cometido um crime fiscal. A concretização de qualquer destas hipóteses faria com que a situação de Passos Coelho fosse insustentável e levasse à queda do governo. Mas, como se vê, ainda estamos no campo da especulação. Tendo em conta os quase 20 anos que já passaram sobre os factos, não é certo que consigamos sair desse campo. Uma certeza existe, porém: os eventuais crimes já prescreveram.

Esta última realidade faz com que o pedido de Passos Coelho dirigido ontem à Procuradoria-Geral da República (PGR) não possa ter uma resposta criminal. Isto é, o Ministério Público está impedido de investigar.

O Conselho Consultivo da PGR poderia eventualmente, e a pedido de Joana Marques Vidal, pronunciar-se sobre o que está em causa neste caso mas não é líquido que o possa fazer. Por isso mesmo, a atitude de Passos Coelho não deixa de ser o reconhecimento da fragilidade da sua posição mas é um contra-ataque político que parece ter o objectivo de ganhar tempo.

O escrutínio apertado a que José Sócrates foi sujeito enquanto primeiro-ministro nos casos da licenciatura ou do Face Oculta, entre outros, introduziu práticas novas no escrutínio da comunicação social que não deixam de representar uma evolução do nosso sistema democrático. Por razões diferentes, Passos Coelho está a sentir agora na pele o mesmo escrutínio. Ao contrário de Sócrates, que sempre lidou pessimamente com essa actividade normal em qualquer democracia, Passos não está a vitimizar-se. Diz que não se lembra com uma sinceridade que não foi reconhecida ao seu antecessor. Isso é de saudar, mas é fundamental que esclareça rapidamente todo o caso, sob pena de a nuvem de suspeita não desaparecer de cima da sua cabeça.

*Título ligeiramente alterado por PG mas fiel ao sentido formulado pelo autor

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