Nuno
Saraiva – Diário de Notícias, opinião
A
semana foi diferente. Fofinha, vá. Dois ministros, dois, pediram absolvição por
transtornos e outras trapalhadas da governação. Paula Teixeira da Cruz, na
quarta-feira, após duas semanas de negação, caiu em si e pediu desculpas pelo
"estado de Citius" em que mergulhou a Justiça desde dia 1 deste mês.
No
dia seguinte, o matemático Nuno Crato pediu clemência pelo erro na fórmula de
cálculo utilizada para criar as várias listas de colocação de professores
contratados. Uma e outro assumiram a responsabilidade política pelos fracassos
mas não tiraram daí quaisquer consequências. Essas ficam para os bodes
expiatórios, arranjados à pressa ou em inquéritos internos, mesmo que se tenham
limitado a cumprir instruções dadas a partir dos gabinetes ministeriais.
Diz-se,
por estes dias, que o ambiente está a mudar. Que as desculpas pedidas esta
semana são sinónimo de uma nova era da comunicação política, mais próxima dos
eleitores. Talvez seja verdade. Afinal de contas, vamos a votos outra vez já
daqui a um ano. E nada seria mais ingénuo do que pensar que a proclamação
"que se lixem as eleições!", feita em julho de 2012, era coisa para
levar a sério.
Manda
a sabedoria popular que as desculpas não se pedem, evitam-se. Determina a
civilização que errar faz parte da natureza humana. Sabemos que pedir perdão é,
em muitas circunstâncias - quase todas -, um ato de nobreza. Foi assim com o
Papa Francisco, que o fez pelos pecados da Igreja. Foi também assim com Angela
Merkel quando, em 2008, em
pleno Knesset - Parlamento de Israel -, pediu desculpa pelo
Holocausto. O erro ou o pecado são, portanto, naturais. Fazem parte do
exercício de qualquer atividade, e o poder não é exceção. À atual maioria e
seus seguidores, no entanto, se trilhar o caminho do ato de contrição
permanente sobra-lhe pouco tempo para governar.
Senão,
vejamos: irá o dr. Passos Coelho pedir desculpas por ter mentido descaradamente
aos eleitores em 2011 ao jurar não subir a carga fiscal, cortar salários e
pensões, confiscar subsídios, despedir funcionários públicos, controlar a
dívida e um rol de outras promessas que serviram apenas para caçar o voto? Irá
o primeiro-ministro pedir desculpa por ter ido além da troika, com as
consequências económicas e sociais que se conhecem, ou pelos insultos constantes
à Constituição? Irá o dr. Portas pedir desculpa por ter ultrapassado todas as
linhas vermelhas que traçou? Irá o vice-primeiro-ministro pedir desculpa pela
crise irrevogável do verão passado, e que tanto dinheiro em juros custou aos
bolsos dos portugueses? Irá o dr. Pires de Lima pedir desculpa por, enquanto
gestor, defender à outrance a baixa do IVA e, depois de chegado ao Ministério
da Economia, ter metido na gaveta ideia tão absurda? Irá algum dia o professor
Gaspar pedir desculpa "ao melhor povo do mundo" pelo colossal aumento
de impostos? E, porque pecados não faltam, podia continuar por aqui fora, mas
não me sobrava papel.
Como
disse, o gesto de pedir perdão é, muitas vezes, um ato de nobreza e humildade.
Em política, no entanto, é dos livros, a assunção de responsabilidades faz-se
de outra maneira. Quando se falha, quando se transtorna a vida dos outros,
quando se é incompetente a resolver problemas, sai-se. Mas, porque não houve
grandeza em nada do que foi feito, resta-nos a humanidade de lhes perdoar,
porque não sabem o que fazem.
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