Pequenos
produtores acusam os principais candidatos presidenciais de ignorar e
marginalizar a agricultura nos seus manifestos eleitorais em benefício do
agronegócio e acusam as multinacionais de usurpação das terras.
Para
alertar a elite política sobre a exclusão dos pequenos agricultores
moçambicanos dos programas dos candidatos à presidência, a Ação Académica para
o Desenvolvimento das Comunidades Rurais organizou uma conferência, no inicio
deste mês, na qual reivindicou mais direitos para os camponeses.
Clemente
Ntauaze, responsável do organismo, afirma que os agricultores estão a ser
esquecidos pelos políticos do país e que osetor que está a ser marginalizado.
"Veja
que, a grande preocupação dos candidatos à presidência é, efetivamente, a
priorização do agronegócio, das grandes empresas. Porque, se calhar, eles
acreditem que o agronegócio possa alavancar a agricultura, possa alavancar o
desenvolvimento em Moçambique," explica.
Mas,
continua Clemente Ntauaze, para os pequenos produtores, "isso representa
uma grande ameaça, porque, como se bem sabe, o agronegócio trata-se da ocupação
de grandes terras, são terras que os próprios camponeses usam."
Agricultura
familiar ameaçada
Filipe
Nyusi, candidato do partido no poder - a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO)
-, Afonso Dhlakama, candidato do maior partido da oposição mocambicana - a
Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) -, e Daviz Simango, candidato do
terceiro maior partido do país - o Movimento Democrático de Moçambique (MDM) -,
defendem nos respetivos programas eleitorais a mecanização do agronegócio. Ou
seja, uma aposta na agricultura em grande escala.
Porém,
para os camponeses, este modelo de negócio não gera emprego, nem põe comida em
cima da mesa.
Augusto
Mafigo, presidente da União Nacional dos Camponeses, defende que faltam mais
apoios para os agricultores.
"Em
termos de apoio material, em termos de tudo o que é subsídio à agricultura,
como nos outros países, esta é a preocupação que desde muito sempre falamos. Se
nós, os pequenos agricultores, estamos mesmo a ser excluídos, não é?"
questiona.
Augusto
Mafigo diz que o agronegócio é um modelo que não serve aos pequenos
agricultores, mas sim às grandes empresas, e que as promessas dos políticos são
pouco concretas.
"Tenho
medo. Falam 'queremos os pequenos, que partam para um nível mais alto' e é
preciso mesmos encontrar um modelo de como vamos passar de pequenos para
grandes. E é este modelo que me preocupa bastante," pondera Mafigo.
Incompatibilidade
histórica
Os
grandes produtores já estão no terreno há alguns anos e os pequenos
agricultores acusam-nos, insistentemente, da usurpação dos terrenos agrícolas,
o que põe em causa o meio de subsistência de mais de 80% da população ativa de
Moçambique.
Clemente
Ntauaze, da Ação Académica para o Desenvolvimento das Comunidades Rurais,
salienta que a terra é, para muitos, o único modo de subsistência.
"Não
havendo isto, é claro que a própria vivência, o tecido social em si, é
praticamente distorcido, é destruído," considera.
"Vejo
famílias a passar fome. Vejo famílias a não conseguir colocar as suas crianças
na escola, porque a terra não é só para a subsistência, mas também produzem
para o rendimento," avalia Ntauaze.
A
União de Camponeses da Província de Maputo recorda que a região do Corredor de
Nacala, que liga o porto de Nacala ao terminal férreo da província, possui
condições excecionais para prática da agricultura, o que tem vindo a atrair
corporações internacionais do agronegócio.
Muitas
destas empresas estão associadas ao Programa de Cooperação Tripartida para o
Desenvolvimento Agrícola da Savana Tropical em Moçambique (ProSAVANA)e ao Fundo
Nacala.
De
acordo com um comunidado da organização, esses investimentos empurram as
comunidades para terra inférteis, e conduzem ao aumento da pobreza.
Para
Clemente Ntauaze, o próximo Governo de Moçambique deveria, pelo contrário,
criar mais condições para os camponeses.
"O
que se devia fazer é: priorizar a agricultura familiar, priorizar os serviços de
extensão, criar condições de forma que os próprios camponeses possam produzir
mais e possam ter meios e também mecanismos, não só de produzir, mas também de
comercializar os seus produtos," sugere.
Nuno
de Noronha – Deutsche Welle
Sem comentários:
Enviar um comentário