Luís
Rosa – jornal i, editorial
Por
cada euro dos 4900 milhões que foram injectados no Novo Banco, Ricardo Salgado
deve uma explicação aos portugueses. Não deve refugiar-se no silêncio
“Quando
a história do mundo for escrita, isso não vai estar nela.” Era o que Ben
Bradlee, o mítico director do “Washington Post” durante o caso Watergate,
costumava dizer sobre uma história que não era importante. É uma fatalidade:
para saírem todos os dias, os jornais necessitam dessas histórias menores.
A
investigação do i ao caso BES representa certamente o que Bradlee consideraria
uma “história importante” e fará parte de qualquer manual sobre a derrocada do
império da família EspíritoSanto. Por isso mesmo, decidimos fazer hoje uma
edição especial do i com um suplemento de 40 páginas inteiramente dedicado ao
caso BES, para os leitores percebe-rem melhor por que razão Ricardo Salgado e
José Maria Ricciardi são chamados hoje à comissão parlamentar de inquérito do
BES. Lemos as 35 cartas trocadas entre o Banco de Portugal e o BES, que
permitem perceber as exigências e cedências do supervisor bancário à família
Espírito Santo; descrevemos as grandes questões a que Salgado, Ricciardi e
outros gestores do BES terão de responder; e republicamos os melhores trabalhos
da nossa investigação, seguindo uma linha narrativa que permite perceber todo o
caso. Leia que vale a pena.
A
audição de Ricardo Salgado marca uma nova fase da comissão parlamentar de
inquérito. Depois das responsabilidades dos reguladores e das responsabilidades
políticas do governo, é chegada a hora do escrutínio parlamentar dos gestores
da família Espírito Santo.
É
um dado adquirido que a forma criminosa como se verificou a derrocada do Grupo
Espírito Santo (GES) pouco tem a ver com a incúria ou incompetência dos
reguladores. O prejuízo recorde de 3577 milhões de euros apresentado em Julho
não se explica, como Ricardo Salgado quis fazer crer no início deste ano, com
erros de um contabilista. Pelo contrário, está relacionado com actos de
gestores que sabiam perfeitamente o que estavam a fazer. A alegada falsificação
da contabilidade das holdings do GES ou a forma como foram retirados cerca de
800 milhões de euros do BES para as empresas familiares através da Eurofin, por
exemplo, são actos dolosos que exigem explicações aos representantes dos
portugueses. Por cada euro público (a classificação de fundos públicos é da
Comissão Europeia) dos 4900 milhões que foram injectados no Novo Banco, Ricardo
Salgado deve uma explicação aos portugueses.
Há
uma probabilidade de Salgado nada afirmar esta manhã aos deputados,
refugiando-se nos diversos segredos que tem ao seu dispor: segredo de justiça,
sigilo bancário ou sigilo fiscal. Constituído arguido em Julho pelo Departamento
Central de Investigação e Acção Penal, por burla, abuso de confiança,
falsificação e branqueamento de capitais no âmbito de um inquérito relacionado
com o caso Monte Branco, investigado no processo judicial que visa escrutinar a
gestão do BES e alvo de diversos processos de contra-ordenação do Banco de
Portugal, Salgado pode ler uma declaração e ficar calado. Tem direito ao
silêncio em nome do princípio da não auto-incriminação, mas esperemos que não o
faça. Os portugueses merecem e têm de ter uma explicação.
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