Pedro
Tadeu – Diário de Notícias, opinião
Uma crítica de
Sousa Tavares, no Expresso, à hipótese que apresentei de eliminar o sigilo fiscal, como na
Suécia, levantou questões muito boas.
Saber
o salário dos colegas ou do patrão aumenta a conflitualidade nas empresas? Nas
grandes firmas do nosso tempo, onde o CEO pode ganhar 300 vezes o salário médio
dos trabalhadores - nos anos 80 essa diferença rondava as 40 vezes - esse
confronto não é um inconveniente, é uma necessidade. Nas outras empresas essa é
uma arma contra o nepotismo, o sexismo, o racismo e respetivas desigualdades
salariais, ilegais e nunca resolvidas.
Na
função pública, na saúde e no ensino estatais a maioria dos salários são tabelados
e os índices publicados. Quem aí fizer as contas sabe quanto ganham colegas e
chefes. Nas empresas em bolsa os salários dos gestores são declarados. Os
salários dos eleitos são públicos. O atual sigilo sobre os restantes salários
é, portanto, uma discriminação.
O
dinheiro que uma pessoa possui é assunto que só diz respeito à própria e ao
Estado? Ninguém ganha dinheiro sozinho: os rendimentos individuais resultam
sempre de uma interação com a sociedade. O direito a proteger a vida privada
deve ser sagrado no que diz respeito à forma como cada um gasta o seu dinheiro
- direito que o Estado, de resto, viola - mas deve subordinar-se ao direito da
comunidade em saber, com dados exatos, se a distribuição da riqueza - um bem
finito - é justa e legal.
A
comunidade tem também o direito de saber se o Estado cumpre o seu papel
fiscalizador e regulador, coisa que o segredo fiscal e a não prestação de
contas que ele permite impedem. Estão aí os escândalos financeiros a
demonstrá-lo.
Parece-me
errado misturar numa lista de dados sigilosos o estado civil ou a residência
com as dívidas e as pensões. As duas primeiras só não são públicas para quem
não tenha vizinhos, as outras duas já são em grande parte divulgadas: o fisco
revela todos os que devem mais de 7500 euros ao Estado e a Caixa Geral de
Aposentações publica mensalmente os nomes de novos pensionistas, numa lista que
soma 640 mil pessoas.
Resta
o problema da "pobreza envergonhada", que seria revelada com o fim do
sigilo fiscal. Este é o problema mais humano e delicado dos que Sousa Tavares
levanta, mas confronta-se com ações diárias, banalizadas, de humilhações
públicas feitas por credores, privados e estatais, a devedores: milhares de
penhoras de salários provam-no.
Cada
indivíduo deveria saber, via internet, o que o fisco, a Segurança Social e o
serviço de saúde guardam e trabalham sobre si próprio. Pelo menos esta medida,
uma lista VIP com todos, poderia ser imediata e defenderia cada cidadão dos
abusos, estatais e privados.
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