sábado, 21 de novembro de 2015

Timor-Leste. ROGÉRIO LOBATO, O PATRIOTA INJUSTAMENTE MAL-AMADO



Tráfico de diamantes era para comprar armas - Rogério Lobato

O primeiro ministro da Defesa de Timor-Leste, Rogério Lobato, disse à Lusa que o tráfico de diamantes em que participou em Angola, pelo qual cumpriu seis anos de prisão, pretendia financiar o envio de armas para o território.

"Digo-lhe francamente, eu fiz aquilo não para me enriquecer. Penso que fiz um juízo errado", disse à Lusa, admitindo que o objetivo inicial era financiar um navio de pesca para vir das Canárias a Timor. "Claro que não vinha só pescar, trazia algumas coisas a bordo. Isso era o projeto inicial".

O navio nunca chegou a vir porque Rogério Lobato é preso e condenado a uma pena de seis anos de prisão, um período que diz ter sido de "maus bocados, tristes e de grande humilhação".

"Eu reconheço isso como parte da minha história pessoal, da minha dedicação à luta. Não guardo rancor a ninguém, tanto mais que depois disso já voltei a Angola, fui recebido com todas as honras, fui até ao sítio onde estive preso", garantiu.

O projeto do navio foi uma de muitas tentativas de Rogério Lobato cumprir a missão com que tinha saído de Timor-Leste "a 03 ou 04 de dezembro de 1975" - o de conseguir apoio militar para Timor-Leste.

Apesar da disponibilidade mostrada por vários países, nomeadamente China, Angola e Moçambique, Lobato garante que o braço armado da resistência timorense, as Falintil, nunca recebeu armamento do exterior.

"Não, nunca. Eu consegui armamento. Consegui armamento na China. E nós tivemos apoio não apenas militar, como financeiro. Apoio militar para armar à vontade 7 mil homens e na altura era um apoio substancial, só que a guerra em Timor-Leste teve lugar numa conjuntura internacional muito desfavorável para Timor-Leste", sublinhou.

Rogério Lobato recorda que a China disse que não tinha condições de fazer chegar o material a Timor - "não se queria envolver em conflitos com os Estados Unidos" - e o apoio do Vietname e Camboja foi essencialmente político.

"O arsenal que tínhamos era do exército português e de algum que íamos capturando das infiltrações da Indonésia na fronteira, mas não dava para fazer uma luta prolongada", disse.

"Naturalmente que numa guerra de posição as forças têm de ser continuamente abastecidas de material. Nós gastávamos o nosso material de guerra sem sermos reabastecidos, enquanto a Indonésia tinha um reabastecimento ilimitado das suas forças. Tinha uma retaguarda muito grande e podia ser reabastecida facilmente", afirmou.

Tentou várias opções, chegando a discutir as alternativas para "apoiar a luta armada em Timor e introduzir o armamento em Timor" com o primeiro ministro da Defesa angolano, Henrique Teles "Iko" Carreira e o também ministro da Defesa Pedro Maria Tonha "Pedalé" e o ministro da Defesa moçambicano Alberto Chipande.

"Uma das hipóteses era lançar o armamento em para-quedas e o general Iko disse que isso era muito fácil de fazer, dar a localização aos aviões que se deslocam para o local através de um polígono de fogueiras durante a noite, ou através de reflexão de espelhos", afirmou.

Lobato garante que tinha armamento à vontade, com "vários paióis, um barco inteiro", fornecido pela China e que teve que guardar em Moçambique, a que se somava o que Luanda e Maputo também tinham disponibilizado.

"O senhor nem imagina. Eu estive hospedado em casa de Kaúlza de Arriaga (general e antigo comandante militar das tropas coloniais portuguesas em Moçambique), em Nampula, só para visitar os paióis que os portugueses deixaram de armamento. Moçambique colocou todo aquele arsenal à nossa disposição", recordou.

"Estávamos bastante afastados da realidade. Porque, só para trazer um avião de Moçambique tínhamos de reabastecer em algum sítio e tínhamos que sobrevoar zonas controladas pelo inimigo", ironiza.

Frustrado por não conseguiu canalizar o apoio para Timor-Leste - "não ia trazer para aqui bolinhos para os indonésios" - Lobato acaba por se distanciar cada vez mais dos outros líderes da Frente de Libertação do Timor-Leste Independente (Fretilin) na diáspora.

"Penso que fiz o erro de não ter comunicado isso aos meus colegas, aos meus colegas. Sabe, a luta era difícil e a uma dada altura começamos a ficar um pouco divididos. Tivemos os nossos problemas em Maputo e isso de certa forma afastou-nos um bocadinho. E eu como era responsável militar pensava que podia fazer as coisas por decisão própria", afirmou.

"Houve um afastamento entre mim e todos os outros, porque eu defendia de facto que tínhamos de encontrar uma forma de entrar em Timor. Eu tinha a minha família toda cá (em Timor), a minha mulher, os meus pais, os meus irmãos", disse, acrescentando que como militar sentia que tinha a obrigação de fazer alguma coisa para entrar em Timor.

"A minha preocupação foi encontrar formas de entrar em Timor e foi nessa altura que eu me envolvi nessa atividade dos diamantes", explica.

Lobato diz que usou o tempo na prisão - "uma fase negra" - para dar aulas de matemática e garante que não guarda rancor.

"Não fiz isso para me enriquecer ilicitamente, tanto mais que continuo pobre, como antes. Se eu tivesse conseguido concretizar esse plano, talvez tivesse feito alguma coisa por Timor", concluiu.

ASP // EL – Lusa

Rogério Lobato diz ter sido usado em 2006 como "bode expiatório"

O ex-ministro do Interior timorense Rogério Lobato diz que foi usado como "bode expiatório", quando foi condenado em 2006 por armar civis, insistindo em entrevista à Lusa que só atuou para defender um Governo democraticamente eleito.

Em entrevista à Lusa, Lobato analisou a situação que se viveu em 2006 que colocou de um lado o então primeiro-ministro, Mari Alkatiri e ele próprio e do outro o Presidente Xanana Gusmão.

"Eu como Ministro do Interior e com a lei subsidiária da Indonésia - que na altura estava em vigor -, dava-me esses poderes e eu estava a defender um Governo democraticamente eleito. Portanto, eu tinha esses poderes, para armar", afirmou.

"Fui condenado, porque interessava às Nações Unidas encontrar um bode expiatório, porque o representante da ONU que esteve cá, não foi um indivíduo equilibrado, foi um indivíduo que fez o jogo de uma parte contra a outra, não esteve no meio a servir de ponte", acusou ainda.

Rejeitando que Timor-Leste tenha estado à beira da guerra civil, Lobato diz que a situação que se viveu na altura - que acabou com a queda do Governo liderado por Mari Alkatiri e pela Fretilin - foi "maquinação que veio de fora".

"É pena, é triste aquilo que se passou", afirmou, considerando que o conflito demonstra que "o diálogo é o único caminho" para os timorenses se entenderem e para evitar mais problemas no futuro.

Hoje, disse, "Mari Alkatiri e Xanana Gusmão estão numa coabitação que eu considero exemplar, embora alguns não gostem. Inclusive, dentro da Fretilin [Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente]" com ambos a "chegarem à conclusão que é melhor entenderem-se, coabitarem, do que entrarem em jogos de palavras".

"Nós aprendemos essa lição e estamos juntos, felizmente e espero que essa coabitação dure no tempo. A coabitação entre as duas partes como a única arma para Timor travar as interferências exteriores", afirmou.

No momento em que Timor-Leste celebra 40 anos da proclamação unilateral da independência - Lobato diz que a independência política pode estar conquistada mas falta ainda "a independência económica" e um "Estado como instituição a funcionar no seu pleno, com leis a funcionar no seu pleno".

"A lei é soberana, ninguém pode estar acima da lei. Penso que nós ainda estamos muito aquém. Ainda há pessoas que pensam que podem estar acima da lei. Isto é um processo que vai levar algum tempo. São as fragilidades de um país que se quer construir, de uma nação nova de um Estado que quer afirmar-se como Estado. Um Estado tem de afirmar-se através da solidificação das suas instituições, de todas as instituições", salientou.

Para Lobato é essencial perseverança para garantir que Timor-Leste "se torna um dia um país onde o Estado de Direito funcionará em pleno".

"O meu irmão já dizia, quando era vivo e no mato, quando fazia a guerrilha, que tinha mais medo da luta pelo desenvolvimento de Timor, do que da luta pela independência e está a confirmar", frisou, referindo-se a Nicolau Lobato, segundo Presidente da República, entre 1977 e 1978.

"Sempre que haja conflito, sempre que haja diferenças, o Estado como uma pessoa de bem deve esgotar os seus recursos para encontrar soluções. Não deve nunca recorrer à violência para poder encontrar soluções", afirmou.

Sobre as suas próprias ambições, diz que quer continuar a servir Timor "não necessariamente como ministro, como presidente" - candidatou-se em 2007 - mas abrindo o caminho para a nova geração.

"Eu não entendo a política só ser alguém como ministro, ou ser alguém como Presidente. Já tenho sido convidado para assumir certas posições políticas e tenho recusado. Penso que já dei o meu contributo politicamente", afirmou.

"Perdi a família toda por Timor. Isso é uma grande contribuição que eu dei por Timor, agora é dar oportunidade aos outros de mostrarem aquilo que valem", concluiu.

ASP // EL - Lusa - Título PG

1 comentário:

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