sábado, 20 de fevereiro de 2016

UNIÃO EUROPEIA À LA CARTE



Fernando Teixeira dos Santos – Jornal de Notícias, opinião

Com o Tratado de Maastricht de 1992, os então estados-membros da União Europeia definiram uma nova ambição para o projeto europeu iniciado em 1958. A criação do Mercado Único Europeu e o lançamento da Moeda Única permitiram um salto significativo no processo de integração. O Mercado Único Europeu impulsionou a crescente integração e livre circulação nos mercados de bens e serviços, de capitais e de trabalho. A Moeda Única, bem como a abolição de fronteiras entre os estados-membros (espaço Schengen), impulsionaram também a livre circulação no seio da UE. Mais, a livre circulação de pessoas e o uso de uma moeda comum desenvolveram e enraizaram, de forma gradual, a consciência de que somos cidadãos de um espaço que ultrapassa as nossas fronteiras. Um primeiro passo, sem dúvida importante, para gerar a noção de uma cidadania europeia.

A crise iniciada em 2008 interrompeu este processo e causou danos sérios. A crise das dívidas soberanas acabou por fragmentar os mercados financeiros. A UE dividiu-se e estabeleceu-se um cisma entre os "virtuosos" do Centro-Norte europeu e os "gastadores" da periferia. A austeridade orçamental gerou descontentamento e descrença. Os nacionalismos ressurgiram. A incapacidade de resposta das autoridades europeias é manifesta. Incapacidade em muito justificada pela falta de políticas orçamentais e financeiras comuns e de meios de intervenção capazes de fazer com que os termos solidariedade e coesão sejam mais que retórica no discurso político europeu. Há mais de seis meses, os cinco presidentes das instituições europeias (Parlamento, Comissão, Conselho Europeu, Eurogrupo e BCE) divulgaram um relatório com este diagnóstico e apontam o rumo a seguir: aprofundar a União Económica e Monetária e reforçar a sua coesão e equidade.

A UE confronta-se atualmente com dois grandes riscos que podem gerar um forte movimento de desagregação. Em primeiro lugar, a onda de refugiados para a Europa tem vindo a suscitar fortes reações no sentido do encerramento de fronteiras intra-UE, o que provocará um retrocesso significativo na livre circulação de pessoas e bens. Em segundo lugar, o Reino Unido ameaça com uma eventual saída da UE (Brexit) se não lhe for dada a possibilidade de limitar, por exemplo, os benefícios sociais para os imigrantes, mesmo oriundos de países da UE, ou de não participar nas regras de regulação e supervisão financeira que venham a ser definidas. A saída do Reino Unido será um revés para a UE, mas a cedência às suas pretensões abre um precedente perigoso. Legitima que outros países possam chantagear os seus parceiros no sentido de usufruírem de estatutos privilegiados e se furtarem ao necessário processo de aprofundamento da integração. Em vez de uma União Europeia integrada, teremos uma UE à la carte?

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