Jorge Rocha* | opinião
Se eu quisesse ser mal
intencionado poderia pensar que alguém no Ministério Público estaria a encarar
com grande preocupação a provável substituição de Joana Marques Vidal por quem
se revele menos zarolho nas investigações passíveis de gerarem capas do
«Correio da Manhã» e decidiu enviar um recado ao governo sob a forma da
investigação sobre os bilhetes para o futebol do ministro Mário Centeno. Algo
do género: «atrevam-se a mexer no nosso arranjinho, que nem o presidente do
Eurogrupo escapa!» É que, não só a ministra da Justiça se descaíra a prever a
mudança de rosto à frente da Procuradoria-Geral da República, como vem
crescendo em volume o intenso clamor pela urgente substituição de quem tem
mostrado uma tão explicita passividade face à facilidade com que tem sido
violado o segredo de Justiça nos processos confiados aos seus subordinados.
Se o mandato de Joana tivesse acabado
em vésperas do final da anterior legislatura, Passos Coelho repetiria o que fez
com o Banco de Portugal, conseguindo ter mais um dos «seus» em funções durante
os quatro anos da governação socialista. Para azar dos que têm garantido neste
seis anos de mandato da Procuradora uma contínua parcialidade a seu favor, está
na hora de mudar o rumo no comportamento do Ministério Público, tornando-o
efetivamente respeitador da legalidade democrática - não só salvaguardando o
referido segredo de Justiça, mas também investigando e condenando quem o viola
(desde as fontes internas até quem as publica!), só assim se cumprindo o
principio da presunção de inocência dos arguidos desde a fase instrutória dos
processos até ao fim do seu julgamento).
É claro que a campanha dos «da
Joana» vai tendo várias vertentes: esta semana até regressou à boca de cena um
magistrado - conhecido por organizar um Congresso da sua classe com o alto
patrocínio do Grupo Espírito Santo -, a pretexto de um livro em que defende a
tese absurda de nunca a Justiça ter estado tão afetada na sua independência
relativamente ao poder político como terá sucedido quando Pinto Monteiro era o
Procurador e José Sócrates o primeiro-ministro. Está visto que aquele sobre
quem o anterior Procurador comentou que o facto de ter chegado onde chegou só
denota a mediocridade que hoje grassa no Ministério Público, quer-nos tomar por
tolos. Algo que manifestamente não somos.
Apesar dos danos suscitados
durante uns dias à irrepreensível reputação do ministro - inclusive com
repercussões internacionais! - quem terá tido a peregrina ideia de lançar esta
lebre a coberto de uma manchete do «Correio da Manhã», logo secundada pelo
«Observador» e pelo «Expresso», deve estar arrependido de o ter feito. Porque a
investigação revelava-se tão coxa, tão desconchavada, que acabou por ser
criticada pelos próprios tenores da direita comentarista nos diversos jornais e
canais de televisão, deixando sem rede de proteção - a não ser no anonimato com
que estas coisas são escondidas - o clandestino autor. Depois do sucedido ficou
ainda mais demonstrado - se ainda mais provas fossem necessárias! - que já
ontem era tarde para que Joana Marques Vidal seja substituída.
No meio disto tudo o nosso selfieman,
que tanto gosta de comentar tudo e mais alguma coisa, procedeu para com esta
ignomínia com a mesma «distração», que dedicou ao caso Tecnoforma ou à luta das
operárias da Triumph. Assobiou para o lado, tirou mais um boneco, deu mais um
abraço … e seguiu em frente como se fosse algo com que não tivesse a haver...
*Jorge Rocha | Ventos Semeados
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