Paulo Morais* | Jornal de Notícias
| opinião
Marcelo Rebelo de Sousa celebrou,
por estes dias de março, dois anos de mandato, com níveis invejáveis de
popularidade. Mas, não tendo resultado dessa atividade nada de
significativamente positivo para o quotidiano dos cidadãos, toda esta
popularidade é um desperdício.
O presidente comenta todos os
assuntos, importantes ou banais. Desta forma, transforma os assuntos banais em
relevantes e vice-versa. Os temas de facto importantes ficam diluídos na
voracidade noticiosa. Assim, temas como a limpeza das florestas, ou o excesso
de IVA na eletricidade (23%), podem ser preteridos, em termos políticos e
noticiosos, pela inauguração duma exposição de um pintor local de Cascais,
tão-só porque o artista convenceu Marcelo a marcar presença no evento. E assim,
a falta de manutenção de pontes e vias-férreas ou o desvio de centenas de
milhões de fundos públicos da Misericórdia para o Montepio - todas estas
situações calamitosas ficam reduzidas à condição de episódios quotidianos com
efémera vida mediática.
Marcelo, para além da condição de
comentador permanente, assume ainda a condição de juiz que a todos absolve.
Quando os cidadãos se revoltam porque morrem, estupidamente, mais de cem
pessoas em incêndios evitáveis, Marcelo anuncia que "foi feito tudo o que
se podia", abraça e consola as famílias das vítimas, apelando à
solidariedade dos portugueses. Assim, anestesia a opinião pública, previne
quaisquer reivindicações de justiça, evita tumultos e desculpa os verdadeiros
responsáveis pelas tragédias. Se roubam armas no paiol de Tancos, Marcelo
anuncia, mais uma vez, que "se fez tudo o que se podia", prevenindo
críticas mais ferozes.
Quando veta - e bem - a lei de
financiamento partidário que permite transformar partidos em máquinas de lavar
dinheiro, Marcelo é contrariado pelos partidos e, incompreensivelmente, cede.
Pior, é ele próprio quem vem depois justificar a lei que havia vetado. Esta atitude
do presidente - que tudo desculpabiliza a um Estado de que é primeiro
responsável - coloca-o na posição de anestesista-mor da sociedade.
Apesar de tudo, Marcelo vê
aumentar a sua popularidade, graças à sua hiperexposição televisiva. Talvez
assim continue, enquanto os portugueses preferirem políticos que os consolem na
desgraça, que assumem como uma qualquer fatalidade; em vez de escolherem
representantes que de facto lhes resolvam os problemas.
* Presidente da Frente Cívica
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