Primeiro Macron, depois Merkel:
líderes europeus vão aos EUA tentar convencer Trump a não abandonar o pacto
nuclear. Mas há ceticismo dos dois lados do Atlântico.
As visitas do presidente francês,
Emmanuel Macron, e da chanceler alemã, Angela Merkel, a Donald Trump nesta
semana configuram o esforço europeu mais visível até aqui para convencer o
presidente americano a permanecer no acordo nuclear iraniano, que ele descreveu
repetidas vezes como "o pior de todos os tempos".
A ofensiva diplomática para
salvar o acordo de 2015 é apenas a ponta do iceberg. Ainda correm as
negociações entre o chamado grupo E3 (Alemanha, França e Reino Unido) e os EUA
para alcançar um pacto capaz de satisfazer as demandas feitas por Trump em 12
de janeiro, quando decidiu - "pela última vez" - manter as sanções
suspensas.
Antes das viagens de Macron
(nesta segunda) e Merkel (na quinta) a Washington, centenas de
parlamentares europeus escreveram uma carta aberta exortando o Congresso
americano a apoiar o acordo nuclear. Mas, segundo ex-funcionários de alto escalão
americanos e diplomatas europeus baseados em Washington, a força-tarefa
europeia pode não surtir efeito.
Eles estão céticos de que Trump
possa ser convencido antes de 12 de maio, data em que terá que ser renovado o
alívio de sanções ao Irã, passo tido como fundamental para manter o acordo
vivo. Até agora, segundo a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA),
Teerã vem cumprindo sua parte no acordo.
"Infelizmente, no momento
atual, eu não conheço ninguém nos EUA que esteja particularmente otimista em
relação à renovação da assinatura de alívios das sanções", prevê Laura
Holgate, embaixadora dos Estados Unidos junto à Agência Internacional de
Energia Atômica (AIEA) até a posse de Trump, em janeiro de 2017.
Richard Nephew, principal
especialista em sanções na equipe americana que negociou com Teerã durante o
governo Barack Obama, e Elizabeth Rosenberg, que se ocupava do mesmo tema
durante sua passagem pelo Departamento do Tesouro, compartilham do ceticismo de
Holgate.
"Estou muito
pessimista", diz Nephew. "Estou pessimista desde que Trump foi
eleito. Eu simplesmente acho que o que queremos alcançar é muito pequeno e
realmente será necessária uma combinação de fatores muito difícil de visualizar
funcionando", comenta.
"Estou muito menos
esperançosa sobre o fato de os EUA continuarem cumprindo suas obrigações com o
acordo. Ou seja, tenho dúvidas de que os EUA vão continuar no acordo",
afirma, por sua vez, Rosenberg.
Quem fala pela Europa?
Parlamentares europeus que
pediram para não serem identificados expressaram à DW a esperança de que os
negociadores sejam capazes de encontrar pontos em comum. Mas continuam céticos
sobre se isso, em última instância, será suficiente para Trump.
"Estou esperançoso, mas não
confiante", disse um diplomata europeu. "Ninguém sabe o que Trump
acabará fazendo".
Um diplomata de outro país
europeu ouvido pela DW afirmou que espera que um documento conjunto possa ser
negociado, mas que, no momento atual, até mesmo funcionários do governo
americano não podem dizer com certeza se o presidente vai aceitá-lo.
Trump exigiu que sejam corrigidos
três "defeitos" para que ele prolongue o alívio de sanções ao Irã – o
programa de armas balísticas de Teerã, o aumento do acesso da AIEA a
instalações iranianas e as chamadas "cláusulas de temporização", que
determinam, essencialmente, por quanto tempo vale o acordo. Especialistas dos
EUA e da Europa afirmam que este último ponto é o mais difícil para se achar um
meio termo.
Enquanto o governo Trump quer
ampliar efetivamente os limites para o programa nuclear de Teerã – que, segundo
o acordo, deverão expirar completamente em 2031 – os europeus relutam em
fazê-lo, dizendo que isso representaria, na verdade, uma renegociação do pacto.
Para o analista de sanções ao Irã
Richard Nephew, da perspectiva dos Estados Unidos, o que complica as
negociações é: até que ponto Alemanha, França e Reino Unido realmente podem
falar por todos os outros países europeus, já que alguns defendem uma abordagem
mais branda em relação a Teerã?
"A Alemanha não pode forçar
retaliação de sanções à Itália. E o Reino Unido, com tudo o que está
acontecendo com o Brexit, certamente não pode exigir nenhuma resposta da
UE", explica Nephew.
Mas a raiz do problema talvez
esteja simplesmente na oposição fundamental e de longa data de Trump ao acordo
nuclear com o Irã – uma visão que possivelmente só será ampliada com o novo
assessor de Segurança Nacional da Casa ;branca, John Bolton. Num artigo
publicado há três anos, Bolton defendeu, por exemplo: "Para impedir a
bomba iraniana, bombardeiem o Irã".
"Há tanta ênfase no
histórico de Trump – tanto quanto candidato, quanto como presidente –
direcionada, mesmo de forma ideológica, contra esse acordo, que parece difícil
acreditar que vai haver alguma solução diplomática mágica que permitirá que ele
desdenhe do pacto ao mesmo tempo em que ele o deixe em paz", avalia
Elizabeth Rosenberg.
Dada a animosidade profundamente
enraizada de Trump contra o acordo nuclear iraniano – a conquista marcante da
política internacional de seu antecessor – o que, de maneira realista, Merkel e
Macron podem fazer para tentar convencer o presidente americano a não deixar o
pacto?
A influência dos dois líderes é
limitada, argumentam os especialistas americanos. Eles sugerem que os europeus
tentem estabelecer uma relação pessoal cordial com Trump, e que eles sejam
transacionais – ou seja, tenham uma oferta pronta que possa incentivá-lo a
apoiar a permanência dos EUA no acordo.
Porém, segundo Laura Holgate,
Merkel e Macron deveriam tentar explicar o motivo pelo qual não acabar com o
pacto internacional é do interesse de Washington.
"O único argumento em que eu
consigo pensar é realmente demonstrar como seria o dia após a quebra de um
acordo", exemplifica a ex-embaixadora dos Estados Unidos junto à AIEA.
"Como pode ser do interesse dos EUA ver a nossa aliança europeia em
frangalhos, ter um Irã sem restrições e talvez ainda mais motivado do que
nunca, em 15 anos, a sentir que eles realmente precisam de uma bomba nuclear
para se defenderem contra alguma ação futura dos EUA? Simplesmente não consigo
conceber como um mundo sem o acordo seria mais interessante para os EUA",
diz
Michael Knigge | Deutsche Welle
Leia também: Entenda
o acordo nuclear com o Irã, em Deutsche Welle
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