Zillah Branco* | opinião
O Estado oligarca que serve aos
interesses da sua burguesia brasileira evolui com uma lentidão aflitiva. Ha
séculos delegou a responsabilidade de fazer avançar uma engrenagem, para
afastar a monarquia colonialista, ao patriarca da independência - José
Bonifácio de Andrada e Silva - promovendo o grito do Ipiranga por D. Pedro I.
Assumiu o papel de preparar o futuro Imperador instruindo-o para desenvolver
obras culturais e acolher os emigrantes europeus, e a Princesa Isabel para
assinar a Libertação dos Escravos. A oligarquia, à sombra do poder político
alimentado pelo sistema financeiro e comercial da Inglaterra, traçou os seus
caminhos de enriquecimento e opressão do povo que ficou livre, mas sem emprego.
Uma frase habitual, quando o
brasileiro não estava para se apoquentar na busca de solução para um problema
trabalhoso, era "ficou por conta do Bonifácio". Era a saida
irresponsável para quem tinha um lugarzinho no Estado. Com o tempo, e a
preguiça, deixaram de relacionar o Bonifácio que havia de resolver a questão,
com o Patriarca da Independência, que fez os seus trabalhos ha duzentos anos.
Mas a mesma engrenagem existe hoje, cheia de cracas e pedras coladas ás
roldanas que movem o Estado apesar das modernas tecnologias e os títulos
científicos dos que comandam as atividades. Comparado com as empresas privadas
fica como peça de museu.
Nunca foi posto ao serviço do
povo que, entretanto, formado como operário e classe média, frequentou a escola
pública onde desenvolveu a sua criatividade e chegou ás universidades com o
grande impulso dado por Lula a partir de 2003. A História produziu heróis que
foram criando as funções de um Estado para servir ao desenvolvimento nacional
com o povo integrado: com a escola pública, o Serviço Universal de Saúde, a
Previdência Social, e o desenvolvimento de estradas, transportes públicos. Mas
a elite dominante, obrigada a aceitar as instituições sociais, sempre ameaçou
de privatizar os serviços mais rentáveis para enriquecer as empresas vinculadas
às multinacionais. Para o povo, mantinha a idéia bucólica de subir no coqueiro
para tirar côco fresco, como se apenas fizesse parte da paisagem tropical que
encanta os turistas.
Lula inverteu este filme. A
partir da Bolsa Família, integrou a população nas condições de cidadania,
apoiou os estudantes com bolsas para cursarem as universidades, abriu o caminho
para acabar com os preconceitos étnicos, apesar de permitir o fortalecimento do
poder financeiro que permaneceu enriquecendo a velha elite acobertada pelo
setor produtivo do empresariado.
O que impressiona é que o golpe
de Temer veio exatamente para destruir a modernização do Estado em benefício da
Nação - na produção de minérios e energia - deixando o Brasil empobrecido com
seu povo miserabilizado. Na verdade, o que parece é que a oligarquia que apoiou
a ditadura de 64, aceitou a aparente democratização gerida por Sarney e depois
FHC e voltou, pela mão de Temer, para evitar que as mudanças democráticas de Lula
transformasse o Estado emperrado e mínimo (que convém a quem serve os
interessas imperialistas), abrindo as portas à verdadeira independência
nacional e patriótica.
Só que o povo agora não está em
cima do coqueiro nem chama de "virundú" o "grito do ipiranga".
Basta ver as suas organizações onde os oligarcas não entram, as escolas de
formação e as unidades produtivas de alimentos sem veneno do MST, as
associações de combate aos preconceitos racistas ou machistas, que se
relacionam com as congêneres de todo o mundo, a participação entusiástica nos
comícios de esquerda onde Manuela do PCdoB, Boulos do PSOL, João Paulo
ex-"sem terrinha" do MST, debatem os problemas nacionais que deverão
fundamentar um futuro Governo a sério para o Brasil e recuperar as suas riquezas
que foram enriquecer os patrões dos oligarcas. Deste despertar de consciência
sairá uma plataforma popular e brasileira para a defesa de um Estado realmente
democrático.
*Zillah Branco - Cientista
Social, consultora do Cebrapaz. Tem experiência de vida e trabalho no Chile,
Portugal e Cabo Verde.
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