NBC é o nome artístico do rapper
luso-são-tomense considerado uma das maiores vozes do soul em Portugal. Já conta
com uma carreira de 20 anos e é um dos fundadores do movimento hip-hop nos anos
90. Conheça a figura.
Timóteo Tiny é o seu nome
verdadeiro. Originário de uma família são-tomense, NBC desde muito cedo começou
a preocupar-se com as desigualdades sociais. A incursão na música começa em
1993, por força da religião, através da Igreja Evangélica.
"Eu e o meu irmão, na
altura, tínhamos um grupo que se chamava "Filhos d'1 Deus Menor",
exatamente por essa alusão à divisão entre os seres, essa alusão às diferenças
sociais. Foi uma alusão assim interessante e usamos esse nome durante muito
tempo", recorda o rapper.
A dada altura passa a ser um
artista a solo e decide adotar outro nome: "Criei este nome NBC, que quer
dizer Natural Black Color e que a partir daí até aos dias de hoje se
mantém".
Consciente muito cedo
Nasceu em 1974. Veio para
Portugal com a família quando tinha cinco anos de idade. Nem fazia ideia o que
seria a revolução que deu lugar aos acontecimentos do 25 de abril daquele ano.
Só aos sete ou oito anos começa a ter noção do momento político por que
atravessou Portugal, até Mário Soares, então primeiro-ministro, encabeçar o
processo de adesão à União Europeia (UE).
E NBC continua com a sua viagem
no tempo: "Comecei a ter noção disso muito cedo, exatamente por essa
indicação que na altura houve do apertar do cinto. Isso foi mais ou menos na
altura em que vieram os fundos monetários para a primeira ajuda que houve a Portugal,
do FMI. Portanto, essas indicações apareceram na minha vida muito cedo".
Era essa a forma de estar em casa
dos pais, onde os livros estavam sempre presentes. A direita e a esquerda eram
assuntos muitas vezes debatidos pelo pai, uma pessoa muito ligada à forma como
se falava de política.
A partir daí, NBC sempre se
interessou pela política sem se assumir como militante de nenhum partido. Isso,
de certa maneira, determinou a opção pela música e influenciou o rumo da sua
carreira, segundo revela: "isso foi sempre muito interessante para mim. Na
minha música falo disso, principalmente pela igualdade entre as pessoas, porque
sabemos que perfeitamente que a única coisa que nos desiguala é o nosso poder
económico."
Movimento de vanguarda do hip-hop
em Portugal
As suas canções desde o primeiro
disco "Afrodisíacos", de 2003, são de intervenção, com apelos à
emancipação. O rapper fala sobre a temática das suas músicas: "Desde o
tema como "Homem", que é um apelo à igualdade entre as espécies,
entre as pessoas, essa talvez tenha sido a minha música que fala disso com uma
poesia mais elaborada mas ainda assim com dor muito maior, também por sabermos
toda a dinâmica histórica que acontece entre África e a Europa, por
exemplo."
NBC é reconhecido por fazer parte
do grupo de jovens responsáveis pelo movimento do hip-hop em português, que
nasceu na margem sul do Tejo. "Faço parte desse grupo de pessoas que quis
trazer para Portugal um género musical que na América também estava a dar os
seus primeiros passos", recorda.
"Em Portugal, por uma
questão politica e social, no início dos anos 80, na altura em que está a
terminar a Lisnave, todas as ex-colónias estavam, de alguma forma, ligadas a
isto; do facto de esta Lisnave congregar pessoas das ex-colónias, que em determinada
altura os pais dessas pessoas lutavam também pelos seus direitos de igualdade
e, consequentemente, os filhos ao crescerem dentro desta dinâmica, quando
existe este motivo, este género musical que lhes dá liberdade para poderem
falar também de si mesmos, então embarcam e é a partir daí que o hip-hop nasce,
exatamente por causa disso", contextualiza NBC.
Uma geração que hoje é referência
Recorda-se do moçambicano General
D como percursor principal do referido movimento, bem como do cabo-verdiano
Boss AC, que também surgiu a cantar nessa altura. Eram tempos difíceis. Viveu
momentos críticos, com alguns episódios que recorda com sorriso. Diz que remou
contra a maré e hoje ganhou maturidade e já é cabeça de cartaz em vários
festivais.
"O que acontece hoje é que,
como o género hip-hop tomou as rédeas – digamos assim – da música em Portugal e
fazemos parte como cabeças de cartaz dos festivais principais, os nomes mais
antigos que ainda estão no ativo, como é o meu caso, são sempre relembrados
pelos artistas novos que estão a ser mais falados, por exemplo", diz o
rapper.
Além disso, tem várias
participações em produções cinematográficas: "Já participei em vários
filmes de renome, tal como o "Desassossego". Já participei também num
filme espanhol que se chama "Fados", de Carlos Saura". E ainda sonha:
"O momento alto será eventualmente a espera na passadeira vermelha de uma
limousine que nos espera para nos levar."Daí o título do seu último álbum
de originais "Toda a Gente Pode Ser Tudo", considerado pela imprensa
portuguesa um dos melhores de 2016: "É preciso acreditar. Vai haver sempre
portas que se vão fechar, mas vai haver outras portas que se vão abrir. E da
energia que nós temos com as portas que nos fecham é que nos vão ajudar para as
portas que se abrem."
Os projetos de NBC
É com este espírito que já tem
outro disco em preparação, que pensa lançar em 2019. "É um disco muito
diferente dos que fiz até agora, com uma outra dinâmica, também numa perspetiva
de compreensão do que é a música negra e que ela não é só o hip-hop; nós também
fizemos rock, os blues e o soul. Estas também são a nossa raiz, se falarmos da
América", garante NBC.
E confiante remata: "Sempre
nesta dinâmica de desbravar terreno e mostrar que nós estamos aqui e que nosso
background, naquilo que somos lá atrás, tem muito peso."
Outro dos projetos do NBC é
montar um concerto na terra natal. Os preparativos estão em curso, segundo
revelou o músico que já esteve em
São Tomé , interessado em aproximar-se mais da sua identidade
cultural.
João Carlos (Lisboa) | Deutsche
Welle
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