quarta-feira, 17 de outubro de 2018

A Rússia pode afundar todos os porta-aviões dos EUA navegando a leste da Gronelândia


Valentin Vasilescu*

Num artigo precedente, Valentin Vasilescu havia demonstrado a impossibilidade para o Pentágono de montar um bloqueio anti-Russo no Mediterrâneo e, de uma maneira mais geral, de proceder a qualquer bloqueio naval, seja qual fôr, contra a Rússia. Prosseguindo o seu raciocínio, ele mostra hoje que os Estados Unidos já não têm a capacidade para conduzir uma guerra naval contra a Rússia a leste da Gronelândia. Moscovo já demonstrou a superioridade das suas armas terrestres, na Síria. Mesmo se, com cuidado, o confronto entre os dois Grandes foi evitado, hoje em dia está claro que a Rússia não teme mais um eventual ataque convencional dos EUA.

Os Estados Unidos tem uma posição geográfica isolada e possuem a força naval mais poderosa. Eles são capazes de intervir em qualquer parte do mundo. Um bloqueio imposto pelos Estados Unidos à Rússia no mar Negro e no Mediterrâneo, tal como declarou o Secretário do Interior, Ryan Zinke, em Pittsburgh, durante o evento Consumer Energy Alliance, é quase impossível, uma vez que os novos mísseis hipersónicos Kh-47M2 Kinzhal e 3M22 Zirkon podem neutralizar o grupo naval dos Estados Unidos a partir do Estreito de Gibraltar.

O Reino Unido anunciou que ia enviar 800 comandos para o Norte da Noruega para fazer face a uma possível «agressão» russa.

No meio da colocação de outras tropas suplementares da OTAN nos países Bálticos e na Polónia, a marinha norte-americana anunciou a reactivação da Segunda Frota, sete anos após a sua desactivação, com uma zona de intervenção no Norte, no Báltico e no Oceano Ártico.

O posto avançado de Kaliningrado, no Báltico, e o gasoducto Nord Stream são as principais vulnerabilidades da Rússia sobre o flanco leste da OTAN. Os Estados Unidos, apoiados pela OTAN, poderiam impôr um bloqueio naval contra a Rússia com a Segunda Frota no Atlântico, no mar Báltico e no Ártico ? Os porta-aviões não se arriscam no Ártico, já que podem ficar presos no gelo. Para as duas outras zonas, tal é possível, mas sem nenhuma chance de sucesso.

A Rússia pode atacar o grupo naval que montasse o bloqueio, com mísseis hipersónicos contra navios de superfície, assim que estes entrassem no Estreito de Skagerrak (ligando o mar do Norte ao Báltico). Por outro lado, os submarinos russos de propulsão nuclear, armados de mísseis hipersónicos, podem atingir um grupo naval dos EUA logo que ele esteja a 1. 000 quilómetros da costa leste do Oceano Atlântico, ao Sul da Islândia. Os Russos podem igualmente lançar mísseis hipersónicos KH-47M2 transportados por bombardeiros de longo alcance, Tu-160 e Tu-23M3, se o grupo naval dos EUA chegar ao Sul da Gronelândia. Afim de evitar serem interceptados, a trajectória dos aviões passará por cima do Polo Norte.

Quais são as chances de sobrevivência do grupo naval dos Estados Unidos? O tempo de reação do Pentágono em caso de ataque com mísseis hipersónicos é muito pequeno, tendo em vista a alta velocidade de movimento e o lapso de tempo mínimo necessário aos mísseis hipersónicos para entrar na zona de reação dos sistemas antiaéreos. O míssil Kinzhal tem um alcance de 2. 000 quilómetros, uma velocidade de 12.250 km/h e um tecto-limite de cruzeiro de 40.000 a 50.000 m, no máximo. O míssil Zirkon tem um alcance de 1. 000 km, uma velocidade de 9.800 km/h e um tecto-limite de cruzeiro de 40.000 m.

A probabilidade de destruir um porta-aviões com os dois tipos de mísseis hipersónicos, ultrapassando a defesa AA, é de 88%. Isto significa que, em 100 mísseis hipersónicos lançados, 88 ultrapassarão a defesa AA e destruirão os seus alvos. No caso dos Estados Unidos, se 11 mísseis russos hipersónicos forem lançados, contra os 11 porta-aviões dos EUA existentes, apenas 1,3 mísseis não atingiriam os alvos. Isso significa que restariam ao Pentágono apenas dois porta-aviões a flutuar, dos quais um danificado, após a primeira salva de mísseis hipersónicos russos. Para a frota norte-americana, isso significa uma catástrofe incomensurável.

Valentin Vasilescu | Voltaire.net.org | Tradução Alva

*Perito militar. Antigo comandante-adjunto da base aérea militar de Otopeni.

A reputação perdida da Arábia Saudita


O caso Khashoggi lança uma luz macabra sobre o reinado do suposto reformador Salman. Cinismo e repressão caracterizam um governo brutalmente autoritário. O país começa a sentir as consequências, opina Kersten Knipp.

Assim funcionam as coisas no mundo da penumbra: quem se mete com figuras duvidosas não deve contar com a lealdade delas. Isso é o que constatam os 15 membros de um comando especial que, no início de outubro, viajaram da Arábia Saudita até o consulado do país na Turquia e lá supostamente assassinaram o jornalista Jamal Khashoggi.

O caso desencadeou ondas com que os autores do crime nem de longe contavam. Agora está sendo esperada uma declaração pública da casa real saudita, cuja mensagem central, segundo informações da emissora americana CNN, é que os regentes em Riad de nada sabiam sobre o assassinato.

A ideia é que algumas figuras obscuras teriam se juntado por conta própria, viajado para a Turquia e então atacado o jornalista saudita – sem o conhecimento da família real e para absoluta indignação desta. Agora os ousados malfeitores devem ser até punidos. Nem um escritor especializado em histórias de máfia conseguiria imaginar uma trama tão perfeita.

Pelo menos um não saudita já foi atrás dessa versão do escandaloso episódio: o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Após uma conversa com o rei Salman, ele adotou a noção de uma "quadrilha assassina", que teria conspirado para cometer os atos malignos. Khashoggi teria morrido nas mãos de "rogue killers", assassinos renegados. Cúmplices na família real: nenhum.

Os serviços secretos americanos aparentemente veem a coisa diferente. Segundo fontes de imprensa, teriam sido interceptadas conversas em que autoridades sauditas planejavam sequestrar Khashoggi e levá-lo para a Arábia Saudita. Especula-se que o novo homem forte em Riad, Mohammad bin Salman, apelidado MbS, estaria pelo menos informado sobre a operação.

Com isso, a reputação do príncipe-herdeiro estaria pelo menos arranhada diante da opinião pública global. O caso Khashoggi não surpreende, pelo contrário. Ele representa o atual clímax na carreira política de um dirigente que, em seu ainda breve reinado, por diversas vezes já chamou a atenção por uma política altamente cínica e inescrupulosa.

Dela faz parte, por exemplo, a briga, ampliada em boicote, com o vizinho Catar, iniciada simplesmente por a tendência política do pequeno emirado não agradar ao príncipe Salman.

Dela faz também parte a guerra aérea contra o Iêmen, de longe o país mais pobre do mundo árabe, na qual, segundo dados da ONU, só até agosto último já morreram quase 5.600 civis e outros 10.400 ficaram feridos. Devido ao bloqueio marítimo saudita, mais de 12 milhões de iemenitas estão enfrentando fome extrema.

Em caso de dúvida, o governo de Riad também investe brutalmente contra a própria população. O blogueiro Raif Badawi, que há anos está encarcerado, devido a críticas políticas relativamente inofensivas, é apenas o mais conhecido de uma série de oposicionistas atrás de grades.

Em meados de 2018, além disso, diversas ativistas dos direitos femininos foram presas. Também elas defenderam reivindicações que só podem ser consideradas provocações sérias num sistema dominado pelo absolutismo. Outros tiveram destino ainda mais duro: a Anistia Internacional registrou a morte de diversos oposicionistas em 2017.

Mohammed bin Salman, o rosto de uma Arábia Saudita supostamente moderna, que permitiu a suas cidadãs dirigir e na qual os cinemas puderam voltar a funcionar, se encena como reformador apaixonado. Suas demonstrações nesse sentido foram, até agora, coroadas de êxito: o país conquistou – um pouco – simpatias. Mas agora se constata que, debaixo de uma política exclusivamente cosmética, ele segue um curso inflexível, brutalmente autoritário.

Esse curso visa assegurar o futuro da Casa de Saud. Seu sucesso não está nem de longe garantido: chovem os cancelamentos, por parte da elite empresarial global, para a Future Investment Initiative, marcada para a terceira semana de outubro, em Riad. A moeda do reino, o rial, atingiu sua cotação mais baixa dos últimos dois anos.

Sucesso econômico é também uma questão de imagem. No momento, várias empresas ocidentais parecem ter notado que uma cooperação com a Arábia Saudita poderá prejudicar gravemente a imagem delas. Nos círculos relevantes em Riad, isso talvez lance a questão se MbS, o garoto-propaganda do pseudo-reformismo saudita, é realmente a pessoa certa para guiar o país em direção ao futuro.

Kersten Knipp (av) | Deutsche Welle | opinião

Portugal | A IGAI e as 40 balas

Fernanda Câncio | TSF | opinião

São 3h30 da manhã. A mulher entra às 4h00 no trabalho, no aeroporto de Lisboa. Sai de casa, entra num carro. Ao volante está um homem. Ainda na rua onde mora, a mulher é atingida a tiro.

Tem 36 anos. Saiu do Brasil, um país violento, para este, dos mais pacíficos. Mas é aqui que vai morrer. Num carro, a caminho do trabalho, quando uma de 40 balas disparadas por seis agentes da PSP a atinge no pescoço.

Nas notícias, a PSP dá a versão dos agentes: que confundiram o carro onde ia a mulher com o usado por assaltantes de um multibanco nessa mesma noite. Que estranharam o carro e o mandaram parar. Que não parou e tentou atropelá-los.

Por isso, dizem, dispararam. 40 vezes.

Foi a 15 de Novembro de 2017 e ainda está em investigação criminal. Mas na semana passada soubemos o resultado da investigação disciplinar, a cargo da Inspecção-Geral da Administração Interna, ou IGAI.

A IGAI concluiu que todos estes 40 tiros foram, e cito, "em situação de legítima defesa própria ou de terceiros, encontrando-se, como tal, justificados."

Mas diz também que para chegar a esta conclusão se socorreu do princípio "in dubio pro reo".
Ou seja, "na dúvida, decide-se a favor do réu".

Há portanto dúvidas. A IGAI tem dúvidas. Quais? Não sabemos, provavelmente nunca saberemos. A IGAI nunca publica os seus inquéritos e faz depender o acesso de um pedido que pode ou não ser aprovado.

A IGAI, criada em 1996 para combater a opacidade, o corporativismo e a cultura de encobrimento das polícias, para investigar com independência e transparência abusos de poder e violência, é hoje isto: uma instituição opaca, que se parece cada vez mais com o que visava combater.

Para fazer fé em tudo o que os agentes dizem, para fechar os olhos e justificar todas as acções policiais, não precisávamos da IGAI.

Não precisávamos da IGAI para arquivar o caso das agressões a jovens da Cova da Moura na esquadra de Alfragide, em 2015 - um caso que está a ser julgado porque o Ministério Público viu crimes onde a IGAI nada viu.

Não precisávamos da IGAI para enumerar agressões e detenções ilegais no pós manifestação de 14 de Novembro de 2012, para a seguir concluir nada poder fazer porque os agentes responsáveis tinham a cara tapada com capacetes e viseiras - e portanto não podiam ser identificados.

Não precisávamos da IGAI para nos dizer que, na dúvida, arquivou a morte de Ivanice Costa.

Desta IGAI, não há dúvidas, não precisamos. É altura de, como o Reino Unido, termos uma instância de investigação de abusos policiais verdadeiramente independente e transparente. Que queira realmente saber a verdade e combater os abusos. Contribuir para que as polícias portuguesas descubram, enfim, os direitos humanos.

*a autora não escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

Em: "A Opinião" de Fernanda Câncio, na Manhã TSF

Portugal | Passos Coelho: uma oportunidade perdida


Ana Alexandra Gonçalves* | opinião

Numa altura em que se exige que os democratas se insurjam contra as diferentes ameaças autoritárias, torna-se ainda mais evidente a importância de algumas palavras e de alguns gestos como a manutenção do apoio de Pedro Passos Coelho à candidatura à Câmara de Loures de André Ventura. Recorde-se que o inefável candidato pelo PSD à edilidade apostava num discurso racista contra um grupo étnico. Consequentemente, e nessa altura, tornou-se claro que Ventura era um populista em potência, para não dizer mais e ainda assim Pedro Passos Coelho manteve o seu apoio, pese embora o CDS, por exemplo, o tenha retirado.

Ora, uma das formas dos democratas combaterem a ameaça autoritária, venha ela sob a forma de um populismo aparentemente inócuo ou sob a forma de fascismo mais difícil de disfarçar, é precisamente retirar toda e qualquer forma de apoio. De resto, Mussolini e Hitler contaram com o apoio de políticos ou partidos seus contemporâneos, com os resultados conhecidos.

Por conseguinte, importa lembrar quem se posicionou do lado certo da História e quem, por mero calculismo político, se colocou ao lado de quem promove as divisões como forma de fazer política e de quem agora se apresenta com um novo partido com medidas como a castração química, o regresso às penas de prisão perpétua, à proibição constitucional da eutanásia ou à proibição do casamento entre pessoas do mesmo sexo. E como se sabe estas medidas constituem apenas a entrada, faltando o prato principal.

*Ana Alexandra Gonçalves  | Triunfo da Razão

Remodelação no governo. E na família militar?

O Expresso Curto a seguir. Trata de imensas vertentes. Entre as quais da política, da cultura, do desporto. Tancos está em linha no Curto. É caso para se prolongar no tempo e nos modos de baralhar e dar de novo. Transparência? Ora, ora. Não se espere a dose de opacidade da “aventura” Tancos.

"História de Tancos" começou assente em mentiras, em “operações militares” por militares sem dignidade e respeito pelo país e pela instituição que teimam em conspurcar. O que ali é preciso são homens e mulheres de tintins que não dêem espaço a “aventureiros” e trapaceiros – independentemente dos galões que possam usar sobre os ombros e nas contas bancárias.

A soldadesca já pergunta se os implicados no crime e nas “operações” de ocultações e mentiras, os dos galões, vão ficar impunes. E é provável. Excepto algum “mexilhão zézito” que esteja a jeito para ser bode expiatório e levar uma “porrada” a sério. Porque os dos galões são impunes às “porradas” previstas nas leis civis e militares… Deixai os trapaceiros vir a mim, disse o estratega do roubo das armas… Disse? Pois. Dito e feito. E agora? Pois. Aguentemos.

O que mais e melhor percebemos deste Caso Tancos foi a evidência que no exército abundam os militares de galão fácil e de plástico, à semelhança da comida no MacDonald e similares. Lamentável. Uma vergonha à espera de “desinfestação”.

Remodelação do governo é coisa que ainda é cedo para abordar aqui, por nós. Dito. Feito. Adiante.

Pobreza. Hoje falam de pobreza, pobreza, pobreza. Até parece que é o dia disso. Pois. Mas a pobreza tem todos os dias do ano para martirizar quase um terço de portugueses. São milhões desses que até parece que só hoje são falados mais a sério. Um faz de conta para aplacar as consciências dos que se estão marimbando para a pobreza e para os pobres. Hoje é dia da pobreza e dos grandes hipócritas e ladrões de colarinhos brancos mergulhados na impunidade. Pois. Adiante.

Adiante desembocamos no Curto, do Expresso. Vá nessa. Boa de ler. (MM | PG)

Bom dia este é o seu Expresso Curto

A remodelação acaba hoje. O caso de Tancos não

Filipe Santos Costa | Expresso

Bom dia.

Hoje tomam posse quinze secretários de Estado, completando-se a mais profunda remodelação promovida por António Costa, à boleia da demissão de Azeredo Lopes. Cinco secretários de Estado são reconduzidos e dez estreiam-se neste Governo. Ei-los. Entre as novidades, João Galamba é a estrela da companhia, apesar de saber pouco sobre energia, o setor que vai tutelar. Como escreve o diretor-executivo do Eco, “se não percebe, vá aprender”.

Mas há outras escolhas curiosas nos secretários de Estado estreantes. A nova secretária de Estado da Saúde tem, no seu passado recente, uma ação de protesto contra o Governo e a falta de condições no Serviço Nacional de Saúde. Raquel Duarte Bessa demitiu-se em março de um cargo de direção que exercia no Hospital de Gaia, “por falta de condições”. A médica pneumologista integrava a direção da Unidade de Gestão Integrada do Tórax e Circulação daquele hospital e, com essa demissão, antecipou-se a protesto idêntico de 52 colegas da mesma unidade de saúde.

Luís Filipe Goes Pinheiro, a partir de hoje secretário de Estado da Modernização Administrativa, esteve envolvido no caso dos vistos gold, ainda em julgamento. Segundo o Público, uma escuta indiciava que o novo governante poderá ter sido favorecido num concurso para cargos públicos. Foi ouvido como testemunha, mas nunca chegou a ser constituído arguido.

Quanto a João Correia Neves, novo secretário de Estado da Economia, é alguém que já conhece bem os cantos à casa - foi chefe de gabinete de Manuel Pinho. Sim, esse mesmo: o ministro de Sócrates que era em simultâneo assalariado de Ricardo Salgado e é suspeito de ter tomado decisões para favorecer a EDP.

Por falar em chefe de gabinete, o folhetim de Tancos está para durar.

A aventura ministerial de Azeredo Lopes acabou, mas o mistério que o fez cair não. Ontem, o ex-porta-voz da Polícia Judiciária Militar, Vasco Brazão, um dos militares suspeitos de terem encenado a devolução do armamento, encobrindo os autores do roubo aos paióis nacionais, voltou a ser ouvido, a seu pedido, pelos procuradores do Ministério Público. E não desarma: não só reafirma que entregou um memorando ao ex-chefe de gabinete de Azeredo Lopes relatando o essencial da operação de encobrimento, como garante que “só há um memorando”. Foi o que disse o seu advogado, Ricardo Sá Fernandes, acrescentando que “o memorando elaborado pelo major Brazão corresponde no essencial à verdade."

Problema: se o “essencial” da “verdade” foi revelado há coisa de um ano ao então chefe de gabinete do ministro, podia o ministro não saber? E o primeiro-ministro? E o Presidente da República? É por isso que, com Azeredo ou sem ele, com ou sem remodelação, este caso ainda se pode transformar num “problema de regime”, como nota a Ângela Silva na Comissão Política desta semana.

Ainda no podcast de política do Expresso, falamos de três situações que podem fazer com que a remodelação desta semana não seja a última deste Governo. E os candidatos à remodelação são nada menos do que três pesos pesados: Mário Centeno, Augusto Santos Silva e Pedro Siza Vieira. Saiba porquê.

OUTRAS NOTÍCIAS

Finalmente uma entidade oficial diz o óbvio: o problema da habitação, sobretudo nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, é uma consequência do excesso de procura e da escassez de oferta. E não será com incentivos fiscais mais ou menos tímidos que a situação será invertida - se o desequilíbrio está entre a procura e a oferta, só se equilibra... com mais oferta. Parece tão evidente que é estranho que tenha de ser dito aos partidos políticos pela Unidade Técnica Técnica de Apoio Orçamental (UTAO). No Parlamento, só o PCP tem chamado a atenção para aquilo que agora fica claro num parecer da UTAO, entregue esta semana ao grupo de trabalho da habitação.

“O nível de fiscalidade sobre os rendimentos prediais” não está na base do desequilíbrio do mercado, que decorre “do enorme excesso de procura”, lê-se no parecer, conforme escreve o Abílio Ferreira. Por isso, a UTAO defende que os deputados devem atender a que algumas causas do excesso de procura “são conjunturais e a sua efemeridade tida em conta”. Não só as regras fiscais que estão a ser estudadas pelos deputados podem ter efeitos contraproducentes, dificultanto o arrendamento, em vez de o favorecer, como o caminho deve ser outro: menos burocracia nos processos de licenciamento e construção, para permitir que haja mais casas no mercado.

Marcelo Rebelo de Sousa, que tinha alertado contra as tentações eleitoralistas no último Orçamento da legislatura, admite que a proposta do Governo pode mesmo estar contaminada pelo “clima eleitoral”. O Presidente da República ainda não tem uma opinião definitiva mas, apesar disso, vai desdramatizando agora o eleitoralismo que andou a dramatizar antes. “É possível utilizar folgas que vêm do crescimento económico, da redução do peso dos juros da dívida pública e, em geral, da gestão orçamental, para ir mais longe num conjunto de despesas”, diz Marcelo, que admite ser esse o “exercício que está retratado neste Orçamento”.

António Costa e Mário Centeno andaram ontem em mini-tournée em defesa da sua proposta OE, que começa a ser discutida na semana que vem. Depois da conferência de imprensa de apresentação do documento, o ministro das Finanças esteve à noite na TVI para, ao contrário de Marcelo, jurar que o documento que entregou na AR não tem sombra de eleitoralismo. Sobre este pingue-pongue entre Centeno e Marcelo em torno de uma palavra, vale a pena ler a análise do Vitor Matos.

Já o primeiro-ministro foi motivar o balneário socialista, levando no discurso a simplicidade de um adjetivo: bom. O OE, insistiu Costa, “é bom para todos” e “dá continuidade a boas políticas que têm dado bons resultados”.

PCP e BE não vacilam na aprovação do último orçamento da “geringonça”, mas também não lhes tremem os músculos no braço-de-ferro que mantêm à esquerda, como pode ler aqui.

Se o ano que vem promete o alívio da austeridade, este ainda será um ano a doer. Basta ver a carga fiscal: terá uma ligeira redução em 2019, mas só depois de atingir novo recorde em 2018, com 34,7% do PIB, segundo o Público. Ainda de acordo com o mesmo diário, as famílias portuguesas continuam a pagar mais IRS do que antes da chegada da troika.

Eis o mistério do açúcar: com a nova configuração do imposto sobre refrigerantes, a Coca-Cola vai ficar mais cara, mas o preço do Ice Tea vai baixar.

O CDS quer que a Procuradoria-Geral da República investigue o que se passa com os terrenos da antiga Feira Popular de Lisboa. O pedido é entregue hoje.

Hoje é o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza. Portugal surge em 11º lugar numa lista que compara o risco de pobreza em 26 países da UE. Cerca de um quarto da população portuguesa (23,3%) está “em risco de pobreza ou exclusão”, diz o relatório, segundo o qual em Portugal a percentagem de população em risco baixou mais do que na UE .

Noutra tabela que será divulgada hoje, o nosso país surge em 34º lugar no 'ranking' mundial de competitividade. Portugal subiu oito lugares nesta avaliação do World Economic Forum.

Elliot Management, um “fundo abutre” (o nome diz tudo) que já teve na mira o BES e a PT, é o novo accionista de referência da EDP, com uma posição de 2,3%. A empresa de Paul Elliot Singer ganhou (má) fama a atacar empresas em situação débil, mas também países, como a Argentina.

Jair Bolsonaro ultrapassou a barreira dos 50% nas sondagens para a segunda volta das presidenciais brasileiras. E, nos Estados Unidos, o histórico líder do Ku Klux Klan, David Duke, fez o que à sua maneira é um elogio ao candidato da extrema-direita brasileira: “Ele soa como nós.” Alguém se surpreende? (já agora: o último candidato presidencial apoiado por Duke foi... Trump.)

Há mais portugueses, de vários quadrantes políticos, a dizer #elenão.

Também no Brasil, o ainda Presidente Michel Temer e outras dez pessoas estão indiciadas por corrupção, branqueamento de capitais e organização criminosa. Alguém se surpreende?

Os líderes da União Europeia reunem-se esta quarta-feira com o Brexit na agenda. Apesar de parecer cada vez mais provável que o Reino Unido saia da UE sem acordo, parece haver disponibilidade para dar mais tempo a Theresa May.

Continua a haver duas versões radicalmente distintas sobre o que se passou em Serralves nos dias que precederam a abertura da exposição de Robert Mapplethorpe. João Ribas, o ex-diretor artístico, mantém preto no branco que foi objeto de "pressão intolerável" e interferências abusivas da administração, e não evita a palavra censura. Contou a sua versão dos factos ontem na Assembleia da República, onde garantiu que só não bateu com a porta mais cedo porque havia a ameaça da exposição ser cancelada. Seguiu-se a administração da Fundação, que jura não saber do que está a falar o ex-diretor.

A irlandesa Anna Burns venceu o Prémio Man Booker, com o livro “Milkman”, sobre uma rapariga de 18 anos vítima de assédio sexual.

George R. R. Martin deu uma entrevista ao New York Times em que considera que a personagem de “Game of Thrones” mais parecida com Donald Trump é... o execrável Joffrey Baratheon. Vale a pena ler a justificação.

Se gosta de cerveja, tem razões para estar preocupado.

AS MANCHETES DE HOJE

Jornal de Notícias: "Contas de Centeno dão mais 121 euros por mês à Função Pública"
Negócios: "O défice zero não é um íman"
Jornal Económico: "Temos o melhor défice dos últimos 40 anos"
Correio da Manhã: "IRS castiga aumentos salariais"
Público: "Famílias ainda pagam mais IRS do que antes da crise"
i: "O sobe e desce que vai afetar a carteira dos portugueses"

O QUE ANDO A LER

“Morrer Sozinho em Berlim”, de Hans Fallada (edição Relógio d’Água, 2016), conta a história de duas personagens condenadas numa missão impossível: um casal idoso decide, em Berlim, em 1940, lutar à sua maneira “contra o Führer, o exército, a SS, a SA”, como resume, perto do final do livro, uma das personagens principais. Não há ilusões: o destino de Otto e Anna Quangel está traçado desde que se dispõem a fazer o que entendem que tem de ser feito: denunciar o mal nazi na própria cidade de onde ele emana - uma Berlim opressora, fria, cinzenta e triste, esmagada pelo medo. Otto e Anna são velhos, associais e dissidentes improváveis - e na verdade não se juntam à resistência, decidem antes fazer a sua resistência caseira, escrevendo postais de denúncia sobre a guerra e o nazismo que vão espalhando pela cidade, na esperança de fomentar um sobressalto que mine o apoio dos berlinenses a Hitler. É uma empresa tão arriscada quanto fútil.

Esta é a grande obra de Hans Fallada, cuja vida dava outro romance. “Morrer Sozinho em Berlim”, escrito em 1946, um ano depois da derrota do nazismo, e publicado poucos meses antes da morte do seu autor, só várias décadas depois seria reconhecido como a obra-prima que é. Foi o primeiro romance de um alemão sobre a resistência levada a cabo por alemães comuns. E tudo é comum na sua banalidade: o mal, a miséria (material e humana), a falta de escrúpulo, a necessidade de sobreviver numa sociedade dominada pelo terror e a paranóia - é isso que impulsiona uma galeria de personagens onde se cruzam poderosos e miseráveis, delinquentes e cidadãos cumpridores. Todos (os de baixo, os do meio e os de cima, os que têm algum, pouco ou nenhum poder) são peças de uma máquina devoradora que obriga cada um a esmagar o outro, a denunciá-lo, a persegui-lo, para evitar ser esmagado, denunciado e perseguido.

Fallada, que sobreviveu ao nazismo mas não a uma vida de alcool, drogas, prisões e internamentos psiquiátricos, conhecia bem o mundo e o submundo onde se desenrola a sua narrativa. E entrega-a com uma objetividade quase clínica, que é a melhor forma de servir uma história baseada em factos reais - o romance foi escrito a partir dos ficheiros da Gestapo sobre o caso de um casal que não se chamava Quangel, mas Hampel.

Ao longo de quinhentas páginas, a questão nunca é se os Quangel podem ter aquilo a que se chamaria um final feliz (não podem), mas se podem ter um final redentor. Essa é a sua felicidade.

Tenha uma excelente quarta-feira.

“Made in China” – A ascensão de um império e potência económica


Xi Jinping representa a “nova era” da República Popular da China e o sonho chinês. O marasmo da “Revolução Cultural” deu lugar a estratégicos investimentos em diplomacia, armamento, investigação e inteligência artificial.

Luísa Gaspar* | Público | opinião

Uma das maravilhas da economia é a sua imprevisibilidade e capacidade de reinventar a cada segundo que passa. Recentemente, um relatório divulgado pela PwC apresentou as previsões de crescimento para as 32 maiores economias do mundo e os países que dominarão o planeta em 2050, colocando a China como o grande líder mundial, ao representar 20% do PIB mundial. Surpreendente? Diria que não, quer por mérito próprio, quer por desmérito dos seus rivais, que ao tentar conter a sua expansão, poderão favorece-la ainda mais.

Depois de um regime pautado pela miséria, opressão e fome, o atual presidente ambiciona tornar a China na maior referência à escala global, prosperando e legitimando o seu sistema económico e político. Fruto desse objetivo, inúmeras medidas, parcerias e planos estratégicos têm sido estruturados e implementados, seguindo um regime comunista assente em princípios do mais puro capitalismo.

Em 2016, o gigante asiático converteu-se no segundo maior investidor do mundo com um total de 170.110 milhões de dólares, tendo um quarto desse valor (41.150 milhões) tido a União Europeia como destino. Portugal é um dos países que melhor pode testemunhar a estratégia chinesa, ao ser o segundo país europeu que mais investimento direto recebeu da China entre 2010 e 2016, tendo em conta a sua dimensão económica. A venda da EDP, REN e Fidelidade estarão ainda gravadas na memória dos portugueses ao marcar a triunfal entrada dos grandes grupos chineses – China Three Gorces, State Grid e Fosun - no mercado português. Na América Latina, o país já concedeu mais crédito que o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), representa um terço de todas as aquisições nas economias latino-americanas e adquire mais de quarto de toda a exportação de produtos de extração.

Para culminar este domínio, a Rota da Seda da China, a efetivar-se, poderá ser o passo final na transformação da China como potência económica mundial. Aquele que é já um projeto antigo, ambiciona reativar as antigas vias comerciais entre a China e a Europa através da Ásia Central, África e Sudeste Asiático. Zhang Qian foi o pioneiro desta estratégia há cerca de 2000 anos, ao ligar economicamente a China com a Ásia Central e o mundo árabe. Enquanto no passado o seu nome estava intrinsecamente associado ao principal produto exportado – seda, atualmente o objetivo é transacionar produtos de todos os tipos, desde matérias-primas a eletrónicos. Este ousado projeto incluirá 60 países e divide-se numa numa rota terreste, que ligará a China à Europa através da Ásia Central e Ocidental, e marítima, que ligará a China a outros países da Ásia, África e Europa. Para apoiar o financiamento desta iniciativa, que implica a construção de infraestruturas de transporte e comunicação, o governo chinês investiu cerca de 40 bilhões de dólares através do “Silk Road Fund, criado em 2014, e do Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura.  

Portugal é, também, parte interessada, e pode aproveitar os estímulos dados por Pequim para valorizar os seus portos, revitalizar a sua atividade marítima e renascer como importante ponto nas rotas comerciais, tirando partido da sua posição central e histórica no Oceano Atlântico.

Dada as fortes relações empresariais entre Portugal e a China, será de aproveitar os valiosos recursos, nomeadamente os portos continentais de águas profundas, caso de Sines, o posicionamento estratégico das ilhas e a Zona Económica Exlcusiva (terceira maior da União Europeia e com um pedido de extensão pendente). Adicionalmente, poderá desempenhar um papel importante no contecto energético da mobilidade marítima, ao inserir-se nas rotas de transporte e reabastecimento de gás natural liquefeito (GNL).

* Aluna da Universidade Nova de Lisboa

China diz que campos de reeducação no Xinjiang servem para "treinos vocacionais"


Pequim, 16 out (Lusa) - O governador da região do Xinjiang, extremo noroeste da China, descreveu hoje o internamento massivo de membros da minoria étnica chinesa de origem muçulmana uigure como um "sistema de formação" que "salva" do extremismo religioso.

Shohrat Zakir admitiu que foi criado um "modelo" que ensina a "língua comum do país, conhecimentos legais e competências profissionais", e salva os que foram enganados pelo extremismo religioso.

As autoridades do Xinjiang transformaram, nos últimos anos, a região num estado policial, através de uma campanha repressiva, que foi reforçada a partir de 2016, quando o secretário do Partido Comunista Chinês (PCC), Chen Quanguo, foi transferido para a região, após vários anos no Tibete.

Numa rara admissão pelas autoridades chinesas da detenção extrajudicial de uigures, Zakir afirmou que os centros são destinados a pessoas "influenciadas pelo terrorismo e extremismo, mas apenas suspeitos de delitos menores, que podem assim ser isentos de repressão penal".

A Comissão Executiva para a China do Congresso dos Estados Unidos e organizações não-governamentais denunciaram já o "internamento massivo e arbitrário de até um milhão ou mais de uigures" em campos onde são forçados a criticar o islão e a própria cultura, a aprender mandarim e a jurar lealdade ao PCC.

Citado pela agência noticiosa oficial Xinhua, Zakir não menciona detenções, mas admite que as instituições mantêm agentes de segurança à entrada.

As declarações de Zakir ilustram a visão de Pequim, na qual grupos étnicos da Ásia Central que habitam Xinjiang devem ser submetidos a uma intensa assimilação da língua, cultura e história da China, e pressionados a adotar o que o PCC considera um estilo de vida moderno e civilizado.

Em 2009, a capital do Xinjiang, Urumqi, foi palco dos mais violentos conflitos étnicos registados nas últimas décadas na China, entre os uigures e a maioria han, predominante em cargos de poder político e empresarial regional.

Zakir afirmou que os "formandos" participam em atividades culturais e desportivas e que a formação coloca-os no caminho de uma "vida moderna" e torna-os "confiantes no futuro".
Na semana passada, a China criou uma nova lei que permite o uso de centros para "educar e transformar pessoas influenciadas pelo extremismo" religioso.

Os esforços de Pequim para legitimar as medidas no Xinjiang surgem numa altura de crescente pressão internacional.

No mês passado, a Alta-Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, afirmou que a região devia permitir a entrada de observadores internacionais.

JPI // JMC

Feira Internacional de Macau abre quinta-feira e reforça aposta no mercado lusófono


Macau, China, 16 out (Lusa) - A Feira Internacional de Macau (MIF), o maior evento para a promoção do comércio e investimento do território, regressa na quinta-feira com um espaço alargado dedicado aos produtos e serviços dos países lusófonos, anunciou a organização.

Moçambique, que tem reforçado o intercâmbio cultural com Macau, e a província chinesa de Fujian, no norte de Guangdong, serão, respetivamente, o país e a região parceiros da 23.ª edição, que volta a receber a participação de mais de 50 países e regiões.

De acordo com o Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM), a edição deste ano vai centrar-se nas vantagens de Macau como plataforma de negócios e serviços comerciais entre a China e os países de língua portuguesa.

"Promover intercâmbios e cooperação económicos e comerciais regionais" é o principal objetivo das dezenas de fóruns, conferências e workshops integrados na MIF, que pretende também "ajudar as empresas participantes a explorarem oportunidades no âmbito das iniciativas chinesas 'Uma Faixa, Uma Rota' e 'Grande Baía', indicou o IPIM.

Ao mesmo tempo, vai decorrer a Exposição de Produtos e Serviços dos Países de Língua Portuguesa (PLPEX), com o objetivo de reforçar o papel de Macau enquanto plataforma de cooperação entre a China e o espaço lusófono.

Inaugurada em 2015 sob a forma de "exposição dentro de uma exposição", no mesmo recinto da MIF, a PLPEX cresceu em 2017, ano em que decorreu de forma independente pela primeira vez e atraiu mais de 210 instituições e empresas dos países lusófonos.

Este ano, o IPIM duplicou a área dedicada à exposição -- agora com 6.000 metros quadrados -- e conta receber mais de 300 stands.

De acordo com o IPIM, foram assinados na MIF do ano passado 67 protocolos, incluindo projetos de cooperação entre governos e associações comerciais, nas áreas da agricultura, turismo, desporto, educação, tecnologia e comércio de produtos alimentares.

Em 2017, a MIF contou com a participação de empresas de mais de 50 países e regiões, ao longo de mais de 1.500 stands. Realizaram-se, ainda, 389 sessões de bolsas de contacto entre os compradores presentes, de acordo com dados do IPIM.

"A realização dos dois eventos [MIF E PLPEX] no mesmo período produziu um efeito ainda melhor, tendo apresentado resultados satisfatórios e recebido comentários muito positivos tanto por parte de empresários como por parte de cidadãos", sublinhou o instituto em comunicado.

FST // JMC

Timor-Leste debate presente e futuro da língua portuguesa a 18 e 19 de outubro

Díli, 16 out (Lusa) - O presente e o futuro da língua portuguesa em Timor-Leste e os processos tanto da sua aprendizagem como do ensino são os aspetos centrais das III Jornadas Pedagógicas do Centro de Língua Portuguesa que decorrem quinta e sexta-feira em Díli.

Domingas Bachita, da comissão organizadora, explicou que a terceira edição do encontro é integralmente organizada por alunos do Departamento de Língua Portuguesa da Universidade Nacional Timor Lorosa'e (UNTL) sob a coordenação de docentes do Centro de Língua Portuguesa da instituição.

"Ao longo dos dois dias de trabalhos, estudantes de diferentes departamentos e faculdades e convidados de diversas áreas relacionadas com a Educação e a Língua Portuguesa em Timor-Leste partilharão saberes e experiências nestas Jornadas, que têm como tema "Presente e Futuro do Português em Timor-Leste", explica Bachita numa nota enviada à Lusa.

O programa das jornadas integra painéis temáticos sobre Didática, Linguística e Literatura e Cultura, mas também mesas-redondas sobre o português "enquanto elemento de identidade cultural e enquanto veículo de transmissão de conhecimentos, as vantagens pessoais e profissionais de dominar a língua portuguesa e o papel das línguas maternas em Timor-Leste", indicou.

Promovidas pelo Centro de Língua Portuguesa da UNTL, as jornadas decorrem no final da semana no Auditório da Faculdade de Educação Artes e Humanidades daquele centro educativo.

Entre os participantes contam-se o reitor da UNTL, Francisco Martins, o comissário nacional de Timor-Leste no Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), Crisódio Araújo, o embaixador Domingos Sousa e o jornalista Max Stahl.

Motivação dos alunos para a aprendizagem da leitura na sala de aula de português, a importância da pré-leitura na compreensão do texto em língua portuguesa e "vantagens e desvantagens do uso do manual de português" são alguns dos temas em análise.

"Vantagens pessoais e profissionais de dominar a língua portuguesa", lendas tradicionais timorenses, o papel das línguas maternas em Timor-Leste e o português enquanto veículo de transmissão de conhecimentos, estão também entre os assuntos a debater.

O encerramento estará a cargo de Benjamim Corte-Real Araújo, diretor do Centro de Língua Portuguesa da UNTL e do Instituto Nacional de Linguística.

ASP // JMC

Festival radical marca inauguração de troço da primeira autoestrada de Timor-Leste


Díli, 16 out (Lusa) - Timor-Leste recebe em novembro um amplo festival de seis dias, que inclui várias atividades radicais, antes da inauguração de parte da primeira autoestrada do país, na região de Suai, a sudoeste da capital, Díli.

O secretário de Estado da Juventude e Desporto, Nelio Isaac Sarmento, explicou que o festival de seis dias, que decorre entre 12 e 17 de novembro, engloba desporto, música, cultura e aventura.

"O Suai Extreme é um projeto ambicioso para Timor-Leste. Ao longo de seis dias, em novembro de 2018, milhares de timorenses participarão ou apoiarão os doze eventos que compõem o festival em geral", explicou.

"Alguns destes eventos serão realizados pela primeira vez na história de Timor-Leste", disse, notando que o evento é uma oportunidade de mostrar o que o país evolui desde a restauração da independência, em 2002.

Artes marciais mistas, motocross, 'off road', um rali que visitará os dois lados da fronteira entre Timor-Leste e a Indonésia, parapente e até lutas de galo fazem parte do festival que inclui uma maratona, uma meia maratona e uma prova de 10 mil metros.

Além da participação de atletas nacionais e internacionais em várias modalidades, o Suai Extreme apostará num amplo envolvimento da comunidade local, com competições desportivas, uma feira alimentar e de café, bem como outros eventos musicais.

"É com grande prazer que convidamos os nossos amigos internacionais para participar. Espero que centenas de pessoas de toda a região e de outros países se juntem a nós nesta incrível celebração", disse Nélio Isaac.

A autoestrada, uma ligação de 151,6 quilómetros, com duas faixas em cada sentido, entre as vilas de Suai e Beaço, ao longo da costa sul, ainda está em fase de construção, mas o primeiro troço - 30,4 quilómetros entre Suai e Fatukai - já está praticamente concluído.

A obra faz parte de um projeto mais ambicioso conhecido como Tasi Mane (Mar Homem, uma referência ao mar mais agitado da costa sul, em contraste com o Tasi Feto, ou Mar Mulher, o mais calmo da costa norte).

O Tasi Mane é um projeto de desenvolvimento de toda a costa sul do país que inclui a construção da Base de Apoio de Suai - zonas logísticas, residenciais e industriais -, a refinaria de Betano, uma unidade de processamento de Gás Natural Liquefeito (GNL), um porto e o gasoduto até ao campo Greater Sunrise, no Mar de Timor.

Para fortalecer a sua defesa da opção do gasoduto para Timor-Leste, rejeitada por várias petrolíferas envolvidas no Greater Sunrise, o Governo timorense chegou a acordo em setembro para a compra da participação de 30% da ConocoPhillips no consórcio dos campos.

Essa operação foi aprovada já em Conselho de Ministros, mas terá que ser inscrita nas contas públicas de 2019 que devem chegar ao Parlamento Nacional no inicio de novembro e que terão também que ser aprovadas pelo parlamento.

Além do troço da autoestrada, o Governo já construiu também o novo aeroporto de Suai, para já usado apenas para alguns voos internos e, desde setembro, como 'escala' entre Darwin, no norte da Austrália, e as plataformas no Mar de Timor.

Estimativas da organização timorense La'o Hamutuk apontam a que a autoestrada já custou 200 milhões, estando orçamentados ainda para o primeiro troço 105 milhões de dólares, entre 2018 e 2020.

Isso implicaria que o custo dos primeiros 30 quilómetros da obra se cifrou nos 10,17 milhões por quilómetro.

Falta ainda concluir três troços da ligação, os 34,3 quilómetros entre Faticai e Dotik, os 42 quilómetros entre Dotik e Buikarin e os 36 quilómetros entre Buikaran e Beaço.

Se o preço por quilómetro se mantiver, o Governo ainda terá que gastar aproximadamente mais 1,2 mil milhões de dólares na obra, nota a La'o Hamutuk.

ASP // JMC

Autárquicas em Moçambique: Jornalistas alvo de ameaças de morte


Na sequência da cobertura eleitoral das eleições em Moçambique, alguns repórteres das rádios Encontro e Watana afirmam estar a receber ameaças de morte. A polícia diz que ainda não recebeu nenhuma queixa formal.

Está instalado o clima de medo entre os jornalistas de Nampula que fizeram a cobertura integral da votação da última quarta-feira. Desde sábado (13.10), o diretor e o diretor-adjunto da Rádio Encontro, os padres Benvindo Tápua e Cantifula de Castro, estão a ser alvo de ameaças de morte por parte de indivíduos desconhecidos, alegadamente por terem influenciado as eleições com vista à derrota da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) na cidade de Nampula.

"Consideramos este ano de 2018 como sendo o ano das ameaças e intimidações contra a Rádio Encontro, porque tudo começa aquando da realização das eleições intercalares aqui no município de Nampula", começa por explicar o padre Cantifula de Castro.

 "Primeiro, a rádio recebeu uma interferência na sua frequência de emissão. Alojou-se lá uma outra [rádio] que obstruiu o nosso trabalho. Seguiram-se as ameaças de morte depois das eleições intercalares que culminaram com a vitória do partido RENAMO na cidade de Nampula. Depois de um tempo, parece que a situação tinha amainado, mas aquando da realização destas últimas eleições, eu e o meu colega começámos a receber telefonemas de números privados a ameaçarem-nos de morte", relata o sacerdoce. "Chamaram-me à atenção para que me cuide, porque os nossos dias estão contados", denuncia Cantifula de Castro.

Cobertura em toda a província

Durante as eleições, a Rádio Encontro enviou 40 repórteres para fazer a cobertura dos acontecimentos, em tempo real, a partir das assembleias de voto. O padre Cantifula de Castro diz que a emissora não reportou à polícia as ameaças recebidas, acusando as autoridades de passividade em relação a queixas anteriores da Rádio Encontro.

No entanto, o diretor-adjunto da rádio católica já reportou o caso a outros órgãos, como o núcleo do Instituto de Comunicação Social da África Austral (MISA-Moçambique) em Nampula, o Fórum Nacional das Rádios Comunitárias (FORCOM) e a Embaixada da Suécia. "Para nós isto é uma clara perseguição para nos intimidarem e fragilizarem", lamenta o clérigo.

Outra rádio alvo de intimidação

Também jornalistas da Rádio Watana na cidade de Nacala-Porto, uma outra estação afeta à igreja católica e também estação parceira da DW África, dizem estar a ser ameaçados por pessoas desconhecidas. À semelhança dos colegas da Rádio Encontro, os repórteres da Rádio Watana são acusados de contribuir para a derrota do partido no poder nas autárquicas.

Um jornalista daquela rádio, que pediu o anonimato, descreveu à DW África outra das ameaças recebidas. "Eu e os meus colegas temos vindo a receber ameaças, através de chamadas telefónicas com números estranhos a dizerem-nos que temos que nos cuidar porque fomos culpados da derrota da FRELIMO em Nacala. Já denunciámos ao MISA e o MISA também nos encorajou a denunciarmos o caso à polícia e hoje já o fizemos por escrito", garante o repórter.

Em comunicado, o MISA-Moçambique condena a situação, lamentando "que os partidos políticos transfiram a responsabilidade das suas derrotas aos profissionais de comunicação social". A organização pede às instituições da justiça que identifiquem os autores das ameaças para que possam ser responsabilizados criminalmente.

A DW África tentou, sem sucesso, ouvir a polícia sobre este caso, esta segunda-feira. Na noite deste domingo, contactado pela DW, o porta-voz do Comando Provincial da Polícia moçambicana, Zacarias Nacute, afirmou que as autoridades ainda não tinham recebido qualquer denúncia relativa às ameaças contra jornalistas na sequência das autárquicas.

Sitoi Lutxeque (Nampula) | Deutsche Welle

RENAMO precisava de "preparação mais séria" para fiscalizar autárquicas


Dentro da RENAMO, há quem questione o nível de preparação do próprio partido nas eleições de 10 de outubro. António Chichone, membro do partido na diáspora, diz que faltou mais organização para evitar a fraude.

António Chicone, membro do maior partido da oposição moçambicana na diáspora, a residir em Portugal, considera que a RENAMO deveria, por exemplo, ter apresentado os seus resultados paralelos da contagem dos votos imediatamente, como forma de travar a fraude eleitoral nas eleições de 10 de outubro.

Em entrevista à DW África, o membro da RENAMO entende que há conformismo em relação aos alegados ilícitos eleitorais.

DW África: Como avalia o processo de votação em Moçambique?

António Chichone (AC): Várias críticas. É preciso frisar que tudo começou no ato da votação. Ocorreram vários ilícitos que foram sendo denunciados por populares, membros e fiscais dos partidos. O processo em si, no geral, foi uma fraude de um descaramento total. É importante também realçar que isto poderia ter sido evitado, na minha óptica, se a denúncia fosse feita consoante a apresentação de elementos por parte dos fiscais. As pessoas iam denunciando que estavam a circular camiões, editais, que havia movimentação de pessoas de um lado para o outro com a intenção de votar e a própria CNE e o STAE são cúmplices desse processo todo. Falhou, num geral, mais pressão, mais fiscalização séria e cerrada deste processo todo.

DW África: Como membro da RENAMO, acha que o seu partido estava devidamente preparado para este processo? Não falhou em nada?

AC: O partido, segundo as informações que tenho, prepara-se como os outros partidos neste processo. Creio que toda a preparação tem de ser cuidada. Agora, até que nível o partido se preparou nesse aspecto? Deixo aqui as minhas dúvidas. Podia ser uma preparação mais séria. Note-se, por exemplo, a contagem paralela: na minha opinião, deviam ser logo apresentados os resultados paralelos, caso houvesse dúvidas. A CNE, até aqui, apresentou os seus resultados adulterados e ainda não há uma resposta em termos do que é o resultado verdadeiro. Quando falo de preparação, é neste sentido. A RENAMO devia ter um resultado muito bom se estivesse muito preparada em termos de organização. Faltou uma organização a 100% para que a questão da fraude não fosse efetivada.

As coisas estão a andar naturalmente e há um conformismo nesse sentido: 'está feito, está feito, deixa estar assim'. A população que defendeu a RENAMO, votou na RENAMO, que andou em massa a fazer campanha durante os quinze dias, sem transportes, sem meios, fica sem resposta. Não estou a dizer que devia ser uma resposta em termos de violência, mas convocar a comunidade internacional, apresentar evidências, no sentido de dizer que houve violações e editais adulterados.

DW África: Fez referência ao eleitorado da RENAMO. Há relatos de que alguns destes eleitores atacaram alguns cabeças de lista na província de Cabo Delgado na sequência de resultados que indicam a derrota da RENAMO em alguns municípios. Como vê essa reação?

AC: É indignação frustrada, porque votaram na RENAMO e percebem que o partido, efetivamente, ganhou. Muitos estão a entender aquela lógica do presidente [Afonso] Dhlakama, quando dizia 'a RENAMO está sendo roubada', as pessoas agora estão a entender. O povo, sentindo isso, reagiu – porque são eleições locais. Agiram violentamente, mas não porque a RENAMO determinou.

DW África: As organizações da sociedade civil e indivíduos é que têm reportado a maior parte dos ilícitos eleitorais. Dos observadores internacionais que estiveram no país, há pareceres positivos, como é o caso da CPLP, por exemplo. Como é que vê o trabalho dos observadores?

AC: Apesar do Acordo Geral de Paz ter como uma das exigências as eleições livres, justas e transparentes, não há, neste momento, quem possa dizer ‘sim, as eleições em Moçambique foram livres'. Há aquilo a que chamamos de interesses económicos da comunidade internacional que, muitas vezes, validam as eleições. Isto não poderia acontecer. Com uma pequena suspeita nos Estados Unidos ou na Europa, as eleições seriam anuladas. Acho que deve haver uma recontagem dos votos quando há suspeita.

DW África: Comparando com os anteriores processos eleitorais, acha que a RENAMO evoluiu em termos de fiscalização, agilidade e empenho no processo de votação?

AC: Sem sombra de dúvida, há uma evolução muito importante. Isto mostra que há um crescimento. Se a RENAMO não tivesse uma organização a esse respeito, as eleições autárquicas seriam uma catástrofe. Mas há que evoluir ainda mais. Os partidos devem fazer uma formação contínua, não apenas esperar pelos momentos eleitorais e, na véspera, fazer formação de fiscais. Com dados concretos, para que a comunidade internacional seja posta em causa nas suas análises. Até agora, isto não está a acontecer. Por isso, depois de fazerem a sua observação, os observadores dão pareceres que não são justos.

Nádia Issufo | Deutsche Welle

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