quarta-feira, 2 de janeiro de 2019

Era uma vez um Bolsonaro...


Era uma vez um Bolsonaro, da laia fascista, eleito pelo eleitorado brasileiro. Tomou ontem posse da presidência da República Federativa do Brasil. Houve pompa e circunstância e muitos odores bolorentos vindos das antigas fossas de ditaduras e ditadores que já anteriormente pulularam por aquele país prantado na América do Sul e a falar português.

É dessa "novela" e atualidade que Pedro Candeias dispõe os “quadros” do Expresso Curto de hoje. Pode ler a seguir. Outros apontamentos e considerações que suscitam interesse também estão incluídos no Curto. Vá lá. Não adiantamos mais. Somos breves nesta espécie de apresentação. Acabamos a nossa tarefa por aqui. Bom dia. Bom ano… se deixarem e conseguirem. Duvidamos que o tal “bom” afague a maioria dos que aqui nos lêem. Avante. (PG)

Bom dia este é o seu Expresso Curto

Deus, bala e família

Pedro Candeias | Expresso

Já deve ter lido por aí que o 38.º presidente do Brasil se chama Jair Messias Bolsonaro, que o apelido é do lado paterno e que o primeiro e segundo nomes são homenagens a dois personagens queridos da família: Jair, um futebolista de quem o pai Bolsonaro era fã; e Jesus Cristo, a quem a mãe atribuía o... 38.º milagre pelo nascimento do filho no dia 21 de março de 1956, após uma gravidez complicada.

A fonte destas informações é o livro “Jair Messias Bolsonaro – Mito ou Verdade”, escrito por Flavio Bolsonaro, filho do presidente brasileiro cujo slogan orelhudo na campanha foi “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos” e a quem os seus brasileiros devotos simbolicamente tratam por “Mito, Mito, Mito”. Como um Messias, percebem?, divinamente ungido, pelo que tudo parece estar ligado e às tantas não se distinguem os factos presidenciáveis do fato presidencial.

É provável que esta ambiguidade tenha ajudado o triunfo inesperado da caminhada “mais barata” da história do Brasil, como disse o novo presidente na tomada de posse numa das poucas referências económicas do seu discurso no Planalto. Uma candidatura assente em palavras fáceis, diretas, amplificadas sem contraditório nas redes sociais – uma câmara, um candidato, alguém escreve a mensagem e outro alguém carrega no botão de upload do vídeo. Simples, rápido e assustadoramente eficaz.

Aliás, a expressão “economia” surgiu apenas três vezes no discurso, o que não surpreende, pois são conhecidas as fragilidades de Bolsonaro nesta e noutras matérias estruturais; o métier dele são as emoções e a religiosidade de um povo formidável traído pela corrupção, pela criminalidade e pelo “viés ideológico” que subverteu as boas “tradições”, destruindo “famílias, alicerce da nossa sociedade”. Tudo isto será combatido por ele e com a ajuda d'Ele, que o salvou de um esfaqueamento mortal, parafraseando a abertura do sermão, perdão, da comunicação.

Pois então, Bolsonaro prometeu o regresso a essas convenções e, por outro lado, garantiu, com mais ou menos eufemismos, um estado policial e militarizado, e uma sociedade civil literalmente armada com “meios para se defender” pelo “direito à legítima defesa”. A propósito, estiveram 12 mil elementos de forças de segurança, entre bombeiros, polícias, militares do Exército, Marinha e Força Aérea na musculada tomada de posse com agentes à paisana, snipers, arame farpado e revistas minuciosas.

Ou seja, Bolsonaro confirmou as balas para atacar o bandidoaté agora defendido por “uma ideologia” que ele diz ser “socialista” e que tingiu o país com uma certa cor “nefasta”. “A nossa bandeira jamais será vermelha. Só será vermelha se for preciso o nosso sangue para mantê-la verde e amarela”, atirou Bolsonaro, soltando o papão comunista do alçapão em plena Esplanada dos Ministérios. O Partido dos Trabalhadores, o Partido Socialismo e Liberdade e o Partido Comunista do Brasil não estiveram presentes.

Pelo meio do hino cantado com a mão no peito, ouviram-se frases de Trump em português do Brasil: “temos uma grande nação para reconstruir” e “trabalharei incansavelmente para que o Brasil se encontre com o seu destino e se torne a grande nação que todos queremos”. Trump reconheceu a sua própria voz na voz de Bolsonaro e foi obviamente ao Twitter dar-lhe os parabéns que rapidamente foram retribuídos na mesma rede social. Os falcões Viktor Órban (primeiro-ministro da Hungria) e Benjamin Netanyahu (primeiro-ministro de Israel), na primeira fila entre convidados, abraçaram-se energicamente e posaram para a posteridade com Bolsonaro.

O mundo já mudou.

OUTRAS NOTÍCIAS

Sobre a ubiquidade de Marcelo Rebelo de Sousa: o presidente esteve em Brasília na tomada de posse, mas a meio da noite entrou televisão dentro com a tradicional mensagem de Ano Novo aos portugueses. E deixou recados e alertas para os políticos dos novos partidos, que devem ser responsáveis na mensagem que passam, pois o populismo está à distância de um discurso demagógico – e o populismo não serve pois abre espaço a coisas bem piores. Tipo o partido de Bolsonaro. Mas o PR também pediu mais transparência e políticos “mais confiáveis”, uma declaração que tem um subtexto claro: senhoras e senhores, cuidado com as presenças-fantasma no Parlamento, com as viagens inventadas e com os currículos mal-amanhados que não ficam bem a ninguém. Está aqui a análise do Expresso e as reações dos partidos estão aquiaquiaquiaqui e aqui.

De Belém (mais ou menos) para o resto do mundo do poder, Macron, Merkel e Putin disseram os seus discursos de Réveillon, devidamente contextualizados pela realidade que os rodeia. O líder francês pediu tempo aos “Coletes Amarelos”, identificou-se com a impaciência deles e deixou uma certeza: renunciar ao cargo está fora de questão. Merkel, por sua vez, pediu união entre os alemães e dessacralizou o isolacionismo crescente no Velho Continente. E Putin... bem, Putin falou sobre a Rússia que não pode depender de ninguém, a não ser dela própria, e que isso exige a colaboração de todas as pessoas.

Algumas pessoas ficaram feridas em três ataques em três cidades de três países diferentes, Tóquio (Japão), Bottrop (Alemanha) e Manchester (Inglaterra) – nos dois primeiros, dois homens conduziram carros sobre transeuntes com a clara intenção de matar por motivos diferentes: o japonês terá querido marcar uma posição ideológica contra “a pena de morte” com o seu pequeno citadino de frente amolgada e pára-brisas arruinado; o alemão procurou atropelar sírios e afegãos ao volante de um Mercedes prateado. Em Manchester, um agressor empunhando uma faca de cozinha com uma longa lâmina esfaqueou três indivíduos; as autoridades estão investigar o caso como se de um atentado terrorista se tratasse. A violência não tem fronteiras.

O espaço é a última fronteira e Ultima Thule é um objeto que fica a 6,4 mil milhões de quilómetros da Terra; é, por definição, um vestígio congelado da formação do sistema solar e foi sobrevoado pela sonda espacial New Horizons da Nasa que fotografou 900 imagens nos curtos instantes em que o sobrevoou a 3.500 quilómetros. Nunca o Homem alcançou tão longe. Veja a viagem da New Horizons neste trabalho interativo do New York Times e perceba que o futuro é a tecnologia – para explorar o espaço sideral, mas também os jornais.

Por falar em jornais, aquele em que trabalho traz-vos um resumo sobre o que muda em 2019 com o novo Orçamento do Estado: custos de vida, IRS e IRC, função pública, fraude e evasão fiscal e saúde, está tudo aqui.

MANCHETES

Correio da Manhã: “Negócios ruinosos da Caixa sem arguidos - em causa estão créditos na ordem dos 2,5 milhões de euros”

Jornal de Notícias: “Mortes na estrada atingem pior resultado em 22 anos - pelo menos 512 pessoas perderam a vida em 2018”

Público: “Bolsa de Lisboa sofre maior perda de empresas desde 2010”

A Bola: “A principal caraterística de um treinador é ser genuíno” – entrevista a Sérgio Conceição

Record: “Rafael Camacho a caminho do Sporting”

O Jogo: “Quero as 30 vitórias seguidas” – entrevista a Marega

FRASES

“Eu o que quis foi, apenas, apreciar a questão formal - mas toda a forma tem algum conteúdo - que era a aplicação da lei do Orçamento através de um processo negocial já agora no ano em que nos encontramos. Foi só isso”, Marcelo Rebelo de Sousa, críptico e evasivo, sobre a o veto ao diploma dos professores na chegada a Brasília para a tomada de posse de Bolsonaro

“Temos de ter segurança nas fronteiras e o muro [com o México] é muito importante para isso”, Donald Trump, em entrevista à amigável Fox, sobre o shutdown americano, os democratas, etc.

“Foi uma prestação fraca desde o primeiro minuto”, Marco Silva sobre a derrota do Everton diante do Leicester, a segunda consecutiva, terceira nos últimos cinco jogos disputados

“Estas alternâncias [de forma] acontecem connosco como também com outras equipas. Não sejamos líricos” Rui Vitória, lançando o Portimonense - Benfica desta noite

“Espero é que o Benfica não nos acuse da morte do adepto às portas do Estádio da Luz ou daquele com o very-light”, Pinto da Costa, em entrevista ao Jornal de Notícias

O QUE ANDO A LER

Cleo é apenas a Cleo e serve o Sr. Antonio e a Sra. Sofia, e os filhos deste casal, Toño, Paco, Pepe e Sofi, a avó Sra. Teresa, e, em certa medida, também serve o cão da família que faz o que os cães fazem nos sítios menos recomendáveis. Cleo é a criada desta ampla casa de dois andares e um anexo onde dormem as empregadas no chique barrio de Roma, na Cidade do México. Cleo é invisível, humilde, discreta e submissa, traços determinantes para conservar um trabalho desta natureza, e ela esforça-se por manter-se assim – ser destratada por patrões frustrados ou insatisfeitos, mas com um teto e o afeto das crianças, é melhor do que a vida miserável nas barracas em guetos enlameados.

E assim se apresenta “Roma”, o filme autobiográfico do mexicano Alfonso Cuarón que é uma homenagem à empregada que o viu crescer na Cidade do México. É uma história simples e dolorosa da separação de um marido e de uma mulher, de um namorico e do fim trágico de uma gravidez, de pobreza e de ostentação, de homens cobardes e mulheres corajosas, e de um amor difícil de explicar entre Cleo e quem lhe paga o salário. Está na Netflix e no cinema.

Quanto a leituras, recomendo o curtíssimo livro “A Angústia do Guarda-Redes Antes do Penalty” [Relógio D'Água], de Peter Handke, que é muito mais sobre o progressivo enlouquecimento de um homem socialmente alienado – com consequências irreversíveis para uma das suas amantes – do que sobre aquilo que o título poderá sugerir.

Por hoje é tudo, espero que o seu ano tenha começado da melhor forma e, se estiver ainda de férias, demore-se um bocadinho mais do que o costume nos sites Expresso, Tribuna, Blitz e Vida Extra. Pela parte que me toca, há muita bola para ver e sobre a qual ler nestes próximos dois dias. A cobertura mais original estará na Tribuna, à distância de um clique: Portimonense - Benfica (hoje, 20h), Sporting - Belenenses (quinta-feira, 18h),Manchester City - Liverpool (quinta-feira, 20h) e Aves - FC Porto (quinta-feira, 21h15).

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