Detenções em Cabinda e na Lunda
Norte geraram um debate sobre uma alegada dualidade de critérios no tratamento
dos direitos e liberdades. Quem protesta aqui não parece ter os mesmos direitos
de quem protesta em Luanda.
Os últimos protestos em Angola
mostram, sem sombra de dúvida, que o país caminha a duas velocidades. É o que
diz o jurista angolano Milonga Bernardo.
Há quase duas semanas, dezenas de
angolanos protestaram em Luanda contra o aumento do preço dos passaportes. E em
dezembro, jovens desempregados também foram para as ruas da capital angolana
pedir a criação de mais postos de trabalho. A polícia acompanhou os protestos,
mas não interveio. Já na Lunda Norte ou em Cabinda, a situação é outra.
"Infelizmente, estamos a
assistir a uma caminhada nessa dualidade. Se, por um lado, em Luanda, a
manifestação que ocorreu relativamente à revindicação de alguns cidadãos quanto
à subida do preço para tratamento do passaporte com uma atitude normal da
polícia, relativamente à província de Cabinda, não consigo perceber até
agora", entende Milonga Bernardo.
Polícia alega distúrbios
A Frente de Libertação do Enclave
de Cabinda (FLEC) denunciou esta quarta-feira (13.02.) que 77 ativistas estão
detidos desde o princípio do mês na província. A polícia impediu uma
marcha em Cabinda, agendada para 1 de fevereiro, para comemorar o aniversário
da assinatura do Tratado de Simulambuco e exigir a independência do enclave.
As autoridades justificaram
apenas, à imprensa, que teriam havido "alguns distúrbios na ordem
pública". Mas a FLEC fala em "detenções arbitrárias" e
"repressão".
O jurista Milonga Bernardo lembra
que todos os cidadãos devem ter tratamento igual à luz da lei: "Não só o
princípio da igualdade, constante no artigo 23 da nossa Constituição, como
também o próprio princípio da universalidade que, se quisermos aqui fazer um
resumo, quer um quer o outro, trazem aqui a questão do respeito, das garantias
dos direitos e deveres a todos os cidadãos, em pé de igualdade. Vamos aqui
dizer que os cidadãos que se manifestam em Luanda não têm mais direitos que
outros cidadãos que se manifestam noutros pontos do nosso país."
Um dos ativistas na prisão é
Sebastião Macaia, porta-voz do Movimento Independentista de Cabinda (MIC), que
foi detido esta terça-feira (13.02.).
Na Lunda Norte, ainda continuam
detidas várias pessoas depois de um protesto, no ano passado, a exigir a
autonomia da região.
Palavra de João Lourenço vs
realidade
Jeremias Benedito, coordenador da
recém-criada associação "Laulenu", que em língua nacional tchokwé
significa "acordem", diz que esta situação contrasta com os discursos
do Presidente João Lourenço sobre os direitos humanos em Angola.
"Estamos cada vez mais
preocupados com as detenções que estão ocorrer na região de Cabinda e da Lunda
Norte. Nós não vemos as razões que fazem o Governo tomar essa posição tão
radical de deter jovens, uma vez que o Presidente João Lourenço, no seu recente
discurso, comprometeu-se a melhorar a imagem de Angola, sobretudo abraçando
cada vez m ais os compromissos ligados aos direitos humanos", desabafa
Benedito.
Para Jeremias Benedito, a
repressão de cidadãos não vai resolver a situação vivida quer em Cabinda, quer
na Lunda Norte. O ativista apela ao diálogo entre o Governo angolano e os
manifestantes: "O Governo angolano deve sentar para dialogar com essas
pessoas que, volta e meia, vão anunciando a realização de manifestações nas
regiões de Cabinda e Lunda Norte."
E o coordenador da Lauleno
interroga: "Porque é que as pessoas hoje se revoltam e clamam pela
autodeterminação dos povos? Tudo é fruto da má governação."
Manuel Luamba (Luanda) | Deutsche
Welle
Imagem: Estátua no Largo Dr.
Agostinho Neto em Cabinda, Angola
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