quarta-feira, 1 de maio de 2019

Venezuela | O estranho "golpe" de que pouco se sabe


Era para ser esta quarta-feira a maior manifestação de sempre na Venezuela. O autoproclamado presidente interino antecipou-se, num vídeo filmado à porta da base aérea de La Carlota, rodeado de duas mãos cheias de militares.

"O 1.o de Maio, o fim definitivo de usurpação, começou hoje [terça-feira]", dizia Juan Guaidó, anunciando ter conquistado os militares, único garante da força do poder do presidente venezuelano que tenta há mais de três meses derrubar, Nicolás Maduro. Guaidó pediu ao povo que descesse à rua e chamou à sublevação "fase final da Operação Liberdade". Maduro desmentiu Guaidó e anunciou estar a debelar um golpe de Estado, as redes sociais e televisões foram limitadas e, ao final do dia, pouco se sabia. A não ser que a mobilização nas ruas não era tão massiva quanto o esperado e que, mais uma vez, sobraram imagens de confrontos que incluíram um blindado a avançar sobre manifestantes e 71 feridos ao final da tarde.

A questão permanecia a da tendência dos militares. O dia começara com a libertação de Leopoldo López, líder do partido Vontade Popular de Guaidó, a cumprir em prisão domiciliária uma pena de 14 anos. Garantia ele que a libertação coube aos agentes do Serviço Bolivariano de Informações que o vigiavam, que não contrariaram o indulto decretado por Guaidó aos presos políticos. Ambos se encontrariam depois junto a La Carlota, com o dito punhado de militares que pareceu manter-se à sua roda ao longo do dia, até no comício promovido depois, com a já famosa imagem de um megafone brandido de cima do tejadilho de um carro.



Versão norte-americana

Mais adiante, López afirmaria aos jornalistas que tudo estava a ser feito em contacto com elites militares e, até, com membros do Governo de Maduro. Dos EUA, que apoiaram imediatamente a operação, o conselheiro para Segurança Nacional da Casa Branca, John Bolton, garantiria pouco depois que o presidente do Tribunal Superior de Justiça, altas patentes militares e o ministro da Defesa, Vladimir Padrino López, eram defensores da saída de Maduro. Ora, o próprio Padrino denunciaria "uma tentativa de golpe de Estado de magnitude medíocre" e republicava tweets alheios glorificando o presidente. E Maduro garantia ter falado com todas as hierarquias militares e obtido garantias de lealdade, aplaudindo "nervos de aço".

Já à noite, regressava a polémica vinda de Washington. O secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, completava a informação de Bolton, assegurando que o próprio Maduro estaria pronto a descolar para Cuba, mas foi convencido a ficar pela Rússia, apoiante fiel (e credor) do Governo de Caracas, apesar de, alegadamente, parte dos seus ministros defender essa partida.

Nas ruas, Guaidó mantinha consigo a mesma quantidade de militares e López refugiava-se com a família na Embaixada do Chile, enquanto 25 militares de baixa patente pediam asilo na Embaixada do Brasil. "Os levantamentos militares parciais não mobilizam a tropa", recorda o "El País". E Maduro - que não apareceu durante o dia - contava, logo às primeiras horas da "operação", com a mobilização da Guardia Nacional, das Forças de Ações Especiais e dos "motorizados, coletivos e milícias".

Guaidó antecipou-se ao 1.o de Maio para marchar até Miraflores. Esta quarta-feira, terá lá à sua espera esta barreira provavelmente impossível de vencer.

Ivete Carneiro | Jornal de Notícias | Foto: EPA/Miguel Gutierrez

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