Mesmo que a conjuntura melhore,
milhões de brasileiros devem continuar sem trabalho na próxima década, em meio
à digitalização e ao abismo entre baixa qualificação profissional e exigências
dos empresários.
O economista Daniel Duque, do
Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV IBRE),
divulgou nesta semana prognósticos desoladores: com um crescimento econômico
anual projetado de menos de 2%, só em 2033 o desemprego no Brasil retrocederá
novamente para abaixo dos 10%.
No momento, 12,5% da população
economicamente ativa está sem trabalho, depois de um mínimo de 6,2% em
2013. Contudo, na época o governo pagou caro por esse nível de ocupação, com um
déficit estatal alto – muito mais gastos do que arrecadação – e preços elevados
de energia e transporte, por exemplo. A economia do país sofre até hoje as
consequências dessa "política de emprego".
Hoje são 13,2 milhões de
desempregados, e os números são ainda mais desoladores, se considerados também
os que estão subempregados ou desistiram de procurar trabalho, com o total de
afetados chegando a 28,4 milhões.
Em comparação: com
512 milhões de habitantes, ou seja, cerca de duas vezes e meia a população
do Brasil, a União Europeia tem 16 milhões de desempregados, além de redes
de assistência social ausentes no Brasil. E isso apesar de alguns Estados
do bloco europeu também apresentarem taxa alta de desemprego.
Por mais sombrios que soem os
prognósticos de Duque, é preciso notar que eles se baseiam em estimativas
conjunturais otimistas. Um crescimento médio do PIB de cerca de 2% ao ano é bem
superior ao que o Brasil tem apresentado historicamente. Desde 1980 o
crescimento per capita tem estado bem abaixo da média da economia mundial,
limitando-se a cerca de 1% ao ano.
O país ainda não tomou
consciência da bomba prestes a explodir em seu mercado de trabalho. Pois o
desemprego ainda deve crescer, quando, devido à digitalização da sociedade
brasileira, ainda mais cidadãos perderem seus empregos. A recessão e o mercado
fechado, com pouca concorrência, proporcionou às empresas nacionais uma pausa
para respirar, em termos de modernização e automatização.
Há mais de duas décadas a
produtividade das empresas brasileiras está estagnada. Porém os planos de abertura
do mercado as forçam agora a modernizar suas unidades – do contrário,
não terão chance contra os produtos importados, e muito menos poderão competir
na exportação: a palavra-chave é "indústria 4.0". Nesse processo de
reestruturação, os brasileiros perderão postos de trabalho em massa,
acompanhando a reviravolta estrutural que se realiza em todo o mundo.
A grande diferença é que a
formação profissional dos brasileiros é especialmente deficiente. Um exemplo: a
firma Atento, que opera redes de call centers e telemarketing e se apresenta
como maior empregadora do país, recentemente anunciou 1.200 vagas na bolsa de
empregos de São Paulo. Apresentaram-se 600 interessados, e apenas sete vagas
foram preenchidas. A rede de supermercados Pão de Açúcar também ofereceu
2 mil empregos: 700 pessoas pareciam ser adequadas para vagas, mas somente
32 postos foram ocupados até agora.
Segundo Ricardo Patah, presidente
da União Geral do Trabalhadores (UGT), o motivo para tantas vagas abertas em
meio ao alto desemprego é a falta de candidatos que dominem as operações
aritméticas básicas, saibam se expressar e possuam conhecimentos mínimos de
informática que lhes permitam trabalhar no caixa ou operar um PC com monitor.
O abismo entre as exigências dos
empresários e a qualificação existente fica cada vez maior: dos
13,4 milhões de desempregados no primeiro trimestre de 2019, 635 mil
eram considerados difíceis de colocar no mercado – mais do que o dobro do que
em 2014, antes da recessão.
Fabio Bentes, economista-chefe da
Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), calcula
que dentro de dez anos 1,4 milhão de brasileiros não terão qualquer chance
de conseguir emprego por falta de qualificação, mesmo que o país volte a
crescer economicamente. Cada vez mais universitários ou jovens com ensino médio
completo assumem funções simples, de caixa ou num call center, os quais, a
rigor, são empregos típicos de baixa qualificação no Brasil.
Ainda assim, há um lampejo de
esperança no mercado de trabalho brasileiro: pela primeira vez em quatro anos,
no primeiro semestre de 2019 aumentou o número dos empregados fixos.
Alexander Busch (av) | Deutsche
Welle
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