Díli, 04 jul 2019 (Lusa) -- As
bancadas do Governo no parlamento timorense querem alterar a lei que cria a
Região Administrativa Especial de Oecusse-Ambeno (RAEOA) para retirar o
Presidente da República do processo de nomeação do responsável regional.
Uma emenda que, a ser aprovada,
impediria o Presidente da República, Francisco Guterres Lu-Olo, de poder
bloquear qualquer tentativa de substituir o atual responsável regional, Mari
Alkatiri, opção defendida pelos partidos do Governo.
Em causa estão mudanças à lei
3/2014 que alteram a forma de nomeação e exoneração do presidente da RAEOA, sem
passar pelo Palácio Presidencial.
A emenda determina que o
presidente da RAEOA passa a ser "nomeado pelo Governo, através de
resolução, para um mandato de cinco anos, renovável uma única vez".
A lei atualmente em vigor
determina que "o Presidente da Autoridade (...) é nomeado pelo Presidente
da República, sob proposta do primeiro-ministro, para um mandato de cinco anos,
renovável sucessivamente", aplicando-se o mesmo processo na exoneração.
Qualquer alteração a esta
legislação teria que ser promulgada pelo Presidente da República, sendo que em
caso de veto basta um voto de confirmação da maioria do Governo no parlamento
para obrigar o chefe de Estado a aprová-la.
Questionado pela Lusa sobre a
proposta, o atual presidente da RAEOA, Mari Alkatiri -- que termina o seu
mandato este mês -- disse que se esta lei entrar em vigor, o projeto da região
"deixa de ser um programa de todo o Estado" para ser apenas de alguns
setores políticos.
"O garante da unidade do
Estado é o Presidente da República. A RAEOA não é uma autonomia política onde o
Presidente é eleito. Se o presidente regional é nomeado, então tem que haver
consenso a nível dos órgãos do Estado", afirmou.
"A partir do momento em que
não envolvam o Presidente da República neste processo, está-se a retirar o
caráter de uma política de Estado que foi a de encontrar um novo modelo de
desenvolvimento em Oecusse", disse ainda.
Alkatiri, 69 anos, considerou
"absolutamente inaceitável" o limite de dois mandatos, afirmando que
não faz sentido fazê-lo quando está em causa "um programa e um modelo de
desenvolvimento, que não se faz em cinco ou 10 anos".
"Se tiver condições para
ficar, fica. No meu caso dois mandatos seria o máximo. Mas no caso de um jovem,
pode ficar dois, três ou quatro mandatos desde que haja resultados",
disse.
A proposta de alteração
legislativa, a que a Lusa teve acesso, foi assinada pelas bancadas do Governo,
estando o seu debate em plenário ainda à espera de agendamento por parte da
mesa do parlamento.
A proposta de alteração foi
assinada por deputados das três bancadas dos partidos que integram o Governo,
nomeadamente Duarte Nunes, do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense
(CNRT), Francisco Vasconcelos, do Partido Libertação Popular (PLP), e António
Tilman, do Kmanek Haburas Unidade Nacional Timor Oan (KHUNTO).
As bancadas justificam a emenda
considerando que a lei dá ao Governo a tutela sobre os órgãos regionais, mas a
"nomeação do presidente da RAEOA e a sua exoneração, têm lugar sob impulso
do Governo, mas a decisão sobre as mesmas recai na esfera de competências do
Presidente da República".
Os deputados manifestam
"reservas" constitucionais por a lei em vigor poder representar um
"alargamento das competências do Presidente da República por via de ato
legislativo ordinário", algo "desproporcional (...) que não decorre
de qualquer comando constitucional", dificultando a responsabilização do
presidente da RAEOA perante o Governo (...) e perante o Parlamento
Nacional".
Recorde-se que Alkatiri foi
nomeado para o mandato de cinco anos por um decreto presidencial assinado em 25
de julho de 2014 pelo então chefe de Estado, Taur Matan Ruak, tendo em conta
uma proposta do então chefe do Governo, Xanana Gusmão.
Alkatiri disse que a cooperação
entre a RAEOA e Taur Matan Ruak, atual primeiro-ministro, tem sido "muito
positiva".
"Fui para Oecusse
representar o Estado. Isso significa que os órgãos de soberania devem estar
todos envolvidos nos desafios em Oecusse. Tem que haver equilíbrio para
representar todo o Estado", afirmou.
"Quando fui para Oecusse, o
Governo estava do meu lado, e o Presidente da República [na altura Taur Matan
Ruak] tinha reservas. Mas mesmo assim não foi força de bloqueio", disse.
"Agora, o Governo quer
totalmente fazer depender o programa de Oecusse da maioria parlamentar, da
maioria do Governo e se for esse o caso, então tenho todo o direito de dizer
que não", afirmou.
Alkatiri é líder da Frente
Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin), o maior partido com assento
parlamentar, mas atualmente na oposição, e a sua recondução no cargo tem sido
rejeitada pelos partidos da coligação do Governo.
ASP // VM
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