terça-feira, 20 de agosto de 2019

Portugal | E depois da greve?


Mariana Mortágua | Jornal de Notícias | opinião

A greve dos motoristas chegou ao fim, na sequência de um pré-acordo assinado entre a associação patronal e a Fectrans e da reabertura de negociações com o Sindicato dos Motoristas de Matérias Perigosas. São boas notícias, se esse processo possibilitar um acordo que respeite os direitos até agora negados aos trabalhadores.

É verdade que esta greve, como todas, afetou a vida do país. Mas esse é o seu papel, e o seu poder: dar visibilidade a profissões e abusos que de outra forma não seriam vistos, ouvidos ou reconhecidos. São justas as reivindicações dos motoristas - horários seguros ou salários justos e pagos por inteiro, sem esquemas dos patrões para fugir à Segurança Social - e hoje sabemos que os graves problemas laborais, e mesmo ilegalidades, por eles denunciadas são do conhecimento governamental há anos.

Esteve mal o Governo quando definiu serviços mínimos que não o eram, e na forma desproporcionada como geriu a requisição civil. A pensar nas eleições, o Governo do PS aplicou uma visão restritiva do direito à greve e uma interpretação absurda da lei do trabalho.


Esteve mal, em particular, António Costa, que ontem escolheu agradecer em primeiríssimo lugar, não à larga maioria dos motoristas que exerceram o seu direito respeitando serviços mínimos excessivos, mas aos militares chamados a intervir na requisição civil. Não está em causa o desempenho destas forças, mas o sinal político dado pelas palavras do primeiro-ministro e o precedente que abre a porta a que no futuro se esvaziem formas semelhantes de luta através da imposição de serviços máximos.

Mas mal esteve também o porta-voz do Sindicato dos Motoristas de Matérias Perigosas, quando isolou a greve daqueles trabalhadores, tornando o processo e os objetivos negociais incompreensíveis aos olhos das pessoas. Ambições profissionais e políticas de Pardal Henriques terão prejudicado a condução de uma luta que é justa.

Agora, resta esperar uma real disponibilidade para a negociação, de todas as partes, e em particular do mediador, a quem se exige imparcialidade. O Governo é responsável por assegurar soluções negociadas que corrijam injustiças há muito diagnosticadas e por garantir a eficácia de medidas de fiscalização num setor onde ficaram evidentes os sistemáticos abusos patronais.

*Deputada do BE

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