O Reino Unido está em guerra
civil. Churchill, aquele que Johnson (um tanto pateticamente) quis emular, uniu
o país no momento mais difícil da sua história recente. Boris, que vive agora
perto dos “War Rooms” a partir de onde Churchill dirigiu o país em guerra,
empenha-se em estilhaçar o Reino.
Ana Sá Lopes | editorial | Público
A
decisão do novo primeiro-ministro britânico de suspender o Parlamento até à
véspera do Brexit – para impedir a democracia parlamentar de funcionar
- é um ultraje inominável para um país que se orgulhava justamente das suas
instituições democráticas. O que Boris Johnson fez ao suspender a democracia
põe também em causa outra instituição que até agora tem funcionado como factor
de coesão daquelas várias nações em risco de se desintegrarem por estes dias: a
rainha de Inglaterra. No
ocaso do seu reinado, Isabel II é envolvida numa golpada institucional sem
moral nem ética – mas é assim que Boris é, é assim que Boris funciona.
Isabel II não teria forma de dizer que não ao chefe do “Governo de Sua
Majestade”, já que os seus poderes são meramente simbólicos, os de “rainha de
Inglaterra”. Para todos os efeitos, a partir de uma decisão tomada nas suas
férias no Castelo de Balmoral, na
Escócia que agora já vê a independência inevitável, a rainha envolve-se num
dos maiores escândalos institucionais de que há memória no Reino Unido. É
duvidoso que aceite a enorme quantidade de pedidos de audiência que lhe foram
dirigidos depois do anúncio da decisão do primeiro-ministro. Mas as multidões
que saíram à noite um pouco por todo o Reino Unido a protestar contra a decisão
de Boris, dirigem-se também ao carimbo da Rainha.
É verdade que a Europa foi dura com o Reino Unido da mesma forma que agiu de forma grostescamente malévola com a Grécia depois do referendo. Domina nas instituições europeias um “efeito castigador”, vinda de cabeças educadas em escolas primárias de meados do século XX, segundo o qual a punição grosseira é a única via para tratar um país “rebelde”, mesmo que esse país esteja apenas a respeitar o voto legítimo do seu povo. A Europa já está a pagar por este género de políticas e pagará ainda mais no futuro.
É verdade que a Europa foi dura com o Reino Unido da mesma forma que agiu de forma grostescamente malévola com a Grécia depois do referendo. Domina nas instituições europeias um “efeito castigador”, vinda de cabeças educadas em escolas primárias de meados do século XX, segundo o qual a punição grosseira é a única via para tratar um país “rebelde”, mesmo que esse país esteja apenas a respeitar o voto legítimo do seu povo. A Europa já está a pagar por este género de políticas e pagará ainda mais no futuro.
Não foi a Europa que nomeou Boris
primeiro-ministro – como fez em Itália, ao “substituir” Berlusconni por
Mario Monti em plena crise financeira – mas ajudou à criação de um
sentimento que facilitou o sucesso do discurso básico e populista. Mas Boris já
era um vândalo, antes de ter chegado a primeiro-ministro (Os comentários que
ontem muitos deputados do parlamento britânico dirigiram ao seu
primeiro-ministro tornam esta expressão “vândalo” não tão violenta assim).
O Reino Unido está em guerra
civil. Churchill,
aquele que Johnson (um tanto pateticamente) quis emular, uniu o país no momento
mais difícil da sua história recente. Boris, que vive agora perto dos “War
Rooms” de Churchill, empenha-se em estilhaçar o Reino.
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