domingo, 25 de agosto de 2019

UMA LUTA SOBRE BRASAS VI -- Martinho Júnior


HOJE JÁ É TARDE DEMAIS

 Martinho Júnior, Luanda 

EM SAUDAÇÃO AO 25 DE MAIO, DIA DE ÁFRICA, QUANDO HÁ 56 ANOS, EM GRANDE PARTE EM FUNÇÃO DA LUTA DE LIBERTAÇÃO, SE CRIOU A ENTÃO “OUA”, ORGANIZAÇÃO DA UNIDADE AFRICANA (https://www.officeholidays.com/countries/africa/african_unity_day.php)!

No Cunene, de há pouco mais de 100 anos a esta parte, estão-se jogando algumas das sagas mais decisivas do povo angolano e da África Austral.

O poder colonial posto à prova em 1961 decidiu-se, (após a conquista de todo o território e reduzir as resistências à impotência, ou colocá-las em periferias tácitas), a injectar um contínuo processo de assimilação com implicações evidentes sobretudo nas cidades, procurando a formação duma pequena burguesia africana agenciada e dependente, ao mesmo tempo garante da eclosão das políticas do que veio a ser a “luta contra a subversão” em todo o território angolano, apesar dos contraditórios próprios que esse esforço acarretava sobretudo nas áreas de intervenção afectadas pela luta armada (https://comum.rcaap.pt/handle/10400.26/11921).

Esse expediente visava sobretudo combater a influência da luta clandestina do MPLA em Luanda, mas também na área do triângulo de ocupação do litoral e região central das grandes nascentes.

A água interior passou a merecer a atenção mais prioritária desse esforço que veio a exigir planificação geoestratégica por via dos sucessivos “planos de fomento”! (http://unidcom.iade.pt/designportugal/planos-de-fomento.html).

Atrasando a formação duma pequena-burguesia angolana em áreas rurais, implantado “sanzalas da paz” pata melhor dominar os “indígenas”, o colonialismo tardio disseminou colonatos com mão-de-obra excedentária importada da “metrópole” enquanto esteve dominada pela oligarquia rural portuguesa e com agricultores provenientes também de Cabo Verde (votado a climas áridos trans-saharianos), implantando-os no triângulo do litoral com vista a ocupar com malha administrativa mais apertada a região agricolamente mais suculenta do espaço angolano.

O Estado Novo, em vigor desde a Constituição de 1933, “pacificado o território” (neutralizando de facto as resistências à penetração portuguesa), até 1961 pôs em prática as insípidas capacidades agrárias que advinham de Portugal, mas a partir de 1961 foi procurando implantar polos industriais de pequena envergadura. (http://www.historiadeportugal.info/a-constituicao-de-1933/).

Defender Luanda obrigou a essa concentração num triângulo do litoral ocupado, enquanto os outros três triângulos passavam a ser de intervenção.



Esse expediente procurava isolar Luanda da infiltração da guerrilha do MPLA e contribuía para os impulsos coloniais visando a assimilação e o reforço das linhas de agenciamento e infiltração da PIDE/DGS em Luanda e nas outras cidades do litoral angolano, a fim de sustentar o próprio poder colonial.

Esse passou a ser portanto um processo de obstrução sobretudo às intenções de progressão da guerrilha do MPLA mas, a muito longo prazo, um processo que poderia minar o próprio MPLA de factores favoráveis de persuasão, alargando os expedientes de assimilação no após independência, infiltrando a enorme base de apoio em Luanda e nas cidades do litoral, de forma a antecipar a formação das actuais “novas” elites promotoras de marcado neoliberal.

O enquadramento dado ao Exercício ALCORA, contribuiu também para a proficuidade desses planos a curto, médio e longo prazo. (http://paginaglobal.blogspot.com/2017/04/portugal-sombra-de-ambiguidades-ainda.html).

De 1961 a 1975 a planificação geoestratégica que foi reafirmada deu continuidade à visão de quem chegava por mar ao território, pois ainda estavam muito frescas as linhas de conquista do interior a partir dele, assim como a neutralização das resistências, que foram ocorrendo enquanto Angola se tornava num depósito de degredados, muito poucos deles espalhados pelas áreas rurais e duma planificação colonial com ideias velhas longe de estarem até à altura da dimensão do território!

Por essa razão, as intervenções nos triângulos norte, leste e sul do território, obrigavam o colonialismo português ao controlo dos recursos hídricos no espaço angolano sem perder de vista contraditórios com origem em frescas resistências étnicas, o que se tornava evidente nas geoestratégias postas em prática através dos expedientes de contra insurreição, assim como na acomodação do etno-nacionalismo protagonizado por Savimbi. (http://paginaglobal.blogspot.pt/2016/01/geoestrategia-para-um-desenvolvimento.html).

É evidente que a preocupação com o território angolano jamais levou em conta a necessidade dum desenvolvimento sustentável alicerçado que tivesse como base o controlo e gestão da água interior, a partir da região central das grandes nascentes e é essa omissão que passou para os nossos dias, com as cargas de ilusão e alienação que foram desde então semeadas.

Hoje já é tarde demais, por que o possível esforço de luta contemporânea, o esforço angolano de hoje, só pôde ser realizado depois de vencido o colonialismo, depois de vencido o “apartheid”, depois de vencidas algumas de suas sequelas e ganhando consciência crítica e de vanguarda face ao capitalismo neoliberal que tem sido inculcado em África formatando mentalidades nas elites servis, quando tudo se deveria ter iniciado em tempo oportuno precisamente há pouco mais de 100 anos!

Também por esta razão tenho considerado que Angola tem apenas (sobre)vivido (?) em “séculos de solidão”!


11- O ano de 1961 foi um ano de charneira para Angola, por que também o foi para o colonialismo português do “Estado Novo” implantado em 1926 na república portuguesa e estimulado pelos termos eminentemente fascistas e coloniais da própria Constituição de 1933.

Antes de 1961, o criterioso analista da colonização portuguesa Gerald J. Bender, no seu livro “Angola sob o domínio Português, mito e realidade”, considera dois períodos da “colonização planificada portuguesa na Angola rural” (http://m.portalangop.co.ao/angola/pt_pt/mobile/noticias/lazer-e-cultura/2004/7/34/Intelectuais-aconselham-leitura-obra-Angola-sob-dominio-portugues-mito-realidade,29f0ac71-45bc-481c-a517-8bdf5e2b431a.html?version=mobile):

De 1900 a 1950 e de 1951 a 1960 e, se só em 1950 foi feito “o primeiro levantamento sociográfico organizado da agricultura europeia em Angola”, ter-se-ia de esperar mais 10 anos, para que em 1960 o colonialismo português realizasse “o primeiro levantamento sociográfico dos métodos agrícolas africanos”!

Gérald J. Bender em relação às capacidades do colonialismo português na ruralidade de Angola durante a década de 50/60 do século XX, considerou justamente que eram “ideias velhas” em “planos novos”, jamais abandonando a utilização da força dominadora em nome da“civilização”, justificando-se autênticos fracassos com as tão mirabolantes como retrógradas razões ideológicas:

“No início dos anos cinquenta o governo decidiu criar dois grandes colonatos agrícolas em Angola: Cela, nos planaltos centrais e Matala (Capelongo), no vale do rio Cunene.

O plano para a Cela exigia a instalação de 8.400 famílias de colonos (perfazendo um total de 58.900 indivíduos) por volta de 1958.

Um total de 1.700 famílias instalar-se-ia na Cela durante o Segundo Plano de Desenvolvimento Nacional (1959-1964).

Por sua vez, a ideia da Matala nasceu dos planos abandonados do final dos anos quarenta, segundo os quais se previa o estabelecimento de 15.000 famílias portuguesas em todo o vale do Cunene.

A Matala constituía uma modesta versão deste grandioso esquema e esperava-se que o novo colonato viesse a atrair cerca de 1000 famílias para se fixarem numa área de cerca de 3.000 quilómetros quadrados”…
(…)

…“Portugal nunca desistiu de uma infatigável defesa da política multirracial que afirmava desenvolver em África. No entanto, por volta de 1960, com excepção de dez agricultores africanos assimilados na Matala (nenhum deles originário da área da Matala), a Cela e a Matala eram na realidade colonatos europeus.

Em vez de contribuírem para o cumprimento da missão civilizadora de Portugal, tais colonatos segregaram ainda mais a sociedade rural angolana e exacerbaram o ressentimento dos indígenas contra os colonos brancos.

É quase uma ironia que a África do Sul, a seguir à sua invasão de Angola antes da independência, tenha estabelecido o quartel-general das operações, a base de fornecimento e o centro de tratamento médico na Cela.

De Novembro de 1975 a 21 de Janeiro de 1976, quando o MPLA capturou a Cela, o antigo colonato foi palco dos mais ferozes combates na guerra, que destruíram a maior parte das estruturas existentes na área”.

Segundo ainda o mesmo autor e ainda em relação ao povoamento planificado rural, é em 1961 que se altera o degradante quadro colonial, em resposta à eclosão da guerra, com uma cosmética que garantia a continuidade…

… “As mais importantes mudanças de orientação política ocorreram em 6 de Setembro de 1961, seis meses após o rebentar da guerra:

Entre as várias leis decretadas neste dia, havia seis que se destinavam a:

a) Eliminar o estatuto de indigenato, abolindo assim a distinção entre não-cidadãos e não-civilizados – mais de 99% da população africana – e cidadãos civilizados – que em 1950 incluíam todos os brancos, 89% dos mestiços e 0,7% dos africanos;

b) Alargar o regulamento das concessões e ocupação de terras;

c) Criar organismos administrativos e africanos locais;

d) Coordenar as leis gerais e consuetudinárias;

c) Criar a Junta Provincial de Povoamento de Angola (assim como a de Moçambique)”…

O “Estado Novo”, o auto rótulo do estado fascista e colonial, foi o mais longo regime ditatorial da Europa no século XX, em grande parte produto do facto de Portugal só tardiamente ter começado a produzir nos termos da Revolução Industrial, ainda que Portugal não entrasse directamente na convulsão de Espanha, nem na IIª Guerra Mundial.

Consumou-se assim Portugal enquanto potência colonial média e periférica, com todos os factores que se foram espelhando em Angola, quando teve início a indústria extractivista na África Austral.

Os contraditórios sociopolíticos e socioeconómicos que a força do colonialismo português implantou, reflectiram esse tipo de impactos, pelo que esses contraditórios agudizaram-se depois de 1961, com Portugal cada vez mais em cheque nos relacionamentos internacionais, em função do incómodo das relações de dependência de que não podia fugir.

Se nessa altura o domínio de espaços vitais era débil e longe de ser racionalmente aproveitado, também não havia qualquer veleidade de que alguma vez se chegar a ventilar qualquer iniciativa de desenvolvimento sustentável tendo como fundamento uma geoestratégia que partisse das condições de distribuição hidrográfica de Angola com origem na região central das grandes nascentes, apesar das evidências que já haviam naquela altura: Cela e Matala reforçaram apenas a ocupação da malha administrativa colonial no triângulo do litoral, implicando a colonização europeia nesse sentido (justificando assim a cada vez mais ideologia então propagada)! (http://jornaldeangola.sapo.ao/opiniao/artigos/a_administracao_colonial_e_o_colonato_da_cela).

É evidente que ao mito do luso-tropicalismo, se sucedeu por osmose o mito da lusofonia (instalado também por via da CPLP), ou seja, por tabela continua-se, por razões óbvias dos correntes processos de assimilação, com a aversão completa à premente necessidade duma geoestratégia para um desenvolvimento sustentável a partir do conhecimento, controlo e gestão do espaço vital do país rico em água interior, em função da inépcia que se arrasta desde o passado colonial!

O tema da luso-portugalidade colonial e do seu sucedâneo “lusofonia” começou a ser aliás a ser dissecado, ainda que timidamente, por alguns angolanos como Filipe Zau, conforme a intervenção lúcida sob o título “Mitos e construção de falsas identidades” (http://jornaldeangola.sapo.ao/opiniao/artigos/mitos_e_construcao_de_falsas_identidades)...

Conclui Filipe Zau:

…”Depois das independências em África nasceu um novo mito: o da lusofonia, que no Dicionário de Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa, apresenta os seguintes significados: 1. Qualidade de ser português, de falar português; o que é próprio da língua e cultura portuguesas. 2. Comunidade formada pelos países e povos que têm o português como língua materna ou oficial. Difusão da língua portuguesa no mundo.

Como diria a historiadora angolana Maria da Conceição Neto, os angolanos (e também os moçambicanos), em primeira instância são bantuófonos. Não lusófonos. De acordo com Valentin Mudimbe, em The Invention of Africa – Gnosis, Philosophy, and the Order of Knowledge, identidade e alteridade são sempre dadas a outros, assumidas por um Eu ou Nós-sujeito, estruturadas em diferentes opiniões e expressas ou silenciadas de acordo com desejos pessoais face a uma episteme.”


12- Qualquer abordagem sobre a descolonização de Angola deve levar em consideração as questões que se prendem à antropologia cultural dos povos, à história, às candentes questões físico-geográficas, que tanta influência geram no comportamento dos seres humanos e aos focos interpretativos de ordem sociopolítica e psicológica da própria abordagem.

Efectivamente pensar-se que descolonizar é qualquer coisa que tenha que ser realizada por decreto é uma irresponsabilidade de muitas abordagens que têm sido feitas e publicamente disseminadas (muitas delas em tempo oportuno e sob suspeito apoio ou até financiamento)… por essa razão os autores devem não parar no tempo, devem não se deixar cristalizar, por que em função das profundas alterações globais em curso que repercutem em todos os estados, nações e povos da Terra, a honestidade intelectual obriga a reinterpretar do lado do oprimido e para que haja a liberdade consciente de não haver mais qualquer tipo de opressão. (https://paginaglobal.blogspot.com/2019/06/angola-aprender-reinterpretando.html?fbclid=IwAR3hAiPK_odIDYVcoAf2aRUtHGRQKzBLdtPoC_7VleNjt7kglsMJkdmWxaA).

Na África Austral, muito do que era retrógrado em tempo colonial e em tempo de “apartheid” o capitalismo neoliberal recuperou, alimentando a intensidade dos propósitos de domínio em função dos interesses e conveniências do império da hegemonia unipolar e da poalha de fazedores de equívocos e de mitos, que além do mais contribuem para os processos correntes de vassalagem que põem em causa a libertação dos povos.

O livro de António de Spínola “Portugal e o futuro” não servindo para o luso-tropicalismo, a oligarquia portuguesa e o regime de sua feição que eclodiu a partir de 25 de Novembro de 1975, recuperou-o para a “lusófona”. (https://www.dn.pt/artes/livros/interior/o-livro-portugal-e-o-futuro-e-o-25-de-abril-1539703.html).

Todas as premissas desse livro foram sendo reinterpretadas, colocadas à disposição do campo doutrinário, filosófico e ideológico para que o regime português norteasse sua superestrutura integrando um papel original (mas garante de continuidade) na União Europeia e sobretudo na NATO, no campo sociocultural, no campo sociopolítico, no campo económico, no campo da inteligência externa, no campo jurídico-institucional e no campo militar.

 A lógica com sentido de vida, que tanto tinha a ver como esforço armado do movimento de libertação, merece sem dúvida uma abordagem não-retrógrada, que não tenha parado no tempo, sem sombra para dúvidas uma abordagem que é um desafio contemporâneo por que há que reinterpretá-la e em tudo o que lhe dá sequência do lado dos que sofreram a opressão e sofrem hoje os termos desequilibrados dum relacionamento globalizado e bilateral que se aproxima dum multifacetado neocolonialismo!

Em relação a Angola, os que se atribuem “do lado do colonizador, mas do lado certo da história” devem desfazer-se da atracção sistemática aos conceitos portugueses inerentes ao 25 de Abril de 1974, quando por via do 25 de Novembro de 1975 se tornou evidente que houve uma repescagem das linhas de conduta ideológica de António Spínola por parte da oligarquia lusa, inculcadas no regime do “arco de governação” e ainda da “geringonça” enquanto sucedâneo em curso! (https://noticiasdaguerra.com/2018/03/17/a-descolonizacao-nos-testemunhos-de-pezarat-correia/).

Descolonizar mentalmente é criticar consciente e inequivocamente essa estafa e por isso considero que a oligarquia portuguesa recria a partir do passado retrógrado a mentalidade colonial e os mitos e equívocos arrastam-se até hoje por que nos relacionamentos com Angola e com África, essa recriação está bem presente nas capacidades de inteligência, é “soft power” nos seus termos de domínio quando além do mais se evoca a “lusofonia”, ou até os “bons ofícios” do Instituto Camões, como se tornasse imperioso continuar a conformação à ideia de “dilatar a fé e o império” em pleno século XXI!

A superestrutura ideológica da “civilização judaico-cristã ocidental” com a “lusofonia” continua funcional e garante os nexos entre sectores críticos da oligarquia portuguesa e seu regime, com sectores afins da “nova elite” angolana, nutrindo as duas faces da moeda da assimilação-corrupção!

A “lusofonia” está a recuperar para a assimilação a “solução do problema ultramarino” segundo Spínola: …”devem convergir todos os esforços no sentido de se encontrar uma saída coerente com o que fomos, conciliável com os condicionalismos do presente e, sobretudo, visando as potencialidades e virtualidades do futuro”… (página 48 de “Portugal e o futuro”).

Um dos impulsionadores da “lusofonia”, Mário Soares, foi um dos recuperadores do “spinolismo” sem Spínola, até pelo relevo que deu jáno âmbito do regime oligárquico português dado à luz pelo 25 de Novembro de 1975 (http://www.notapositiva.com/old/trab_estudantes/trab_estudantes/historia/historia_trab/spinola.htm):

“O importante papel que desempenhou é oficialmente reconhecido a 5 de Fevereiro de 1987, pelo então Presidente da República Mário Soares, ao empossá-lo como chanceler das Antigas Ordens Militares, e ao entregar-lhe as insígnias da Grã-Cruz da Ordem Militar da Torre e Espada, pelos feitos de heroísmo militar e cívico e por ter sido símbolo da Revolução de Abril e o primeiro Presidente da República após a ditadura.”

Todos os portugueses que abordam a descolonização, devem sujeitar-se à crítica do que foi feito em função e a partir dos postulados inerentes ao 25 de Novembro de 1975 e deixar de sistematicamente evocar o que foi feito com o 25 de Abril de 1974, por que os oprimidos do século XXI se alguma vez se quiserem libertar, não têm de ser enganados com rótulo oligárquico algum, muito menos injectado a partir do exterior (de boas intenções está mesmo o inferno cheio)…

Prevalece a evocação do 25 de Abril, quando o relacionamento bilateral com Angola tem tudo a ver com o 25 de Novembro de 1975 e isso está a acontecer por que o relacionamento dos interesses da oligarquia portuguesa com os interesses das “novas elites” angolanas surgidas no após Bicesse (31 de Maio de 1991) com o fim das guerras, estão em rota de (completa) coincidência e sincronização, têm assinado termo de identidade próprio e conduzem a uma assimilação que aprofunda a dependência angolana muito para lá das questões económicas, sociopolíticas e literárias, o que contribui para a implementação do quadro de corrupção!

Só a partir da eclosão da guerra em 1961 e por causa dos aspectos das planificações militares, o colonialismo português começou a levar em consideração na escala de todo o espaço angolano, a rica rede hidrográfica interior, a região central das grandes nascentes e a distribuição da população angolana rarefeita por causa das tardias campanhas de penetração no território angolano, nos triângulos norte, leste e sul:

Pode-se verificar, a título de exemplo, no estudo “A classificação etnográfica dos povos de Angola”, a evolução dos próprios conceitos coloniais em relação ao povo angolano (https://journals.openedition.org/mulemba/473).

Para aplicar a teoria da contrassubversão, os factores físico-geográficos-ambientais e humanos tinham necessariamente de ser levados em conta, até por que se relacionavam com a malha político administrativa, assim como com as áreas mais, ou menos povoadas do território, em redundância das conquistas de penetração que só acabaram na 2ª década do século XX, com largas repercussões demográficas…

A geoestratégia militar do colonialismo, nos termos de luta contrassubversão que foi desencadeada contra o movimento de libertação em África, foi decisiva para o estudo da rede hidrográfica só a partir de 1961, o que é claramente espelhado pela historiografia militar portuguesa, pelo que, nas condições da luta que se travou até ao 25 de Abril de 1974, não se deu valor a essa reda hidrográfica como um factor de primeira ordem para alguma vez se estabelecerem as premissas duma geoestratégia para um desenvolvimento sustentável. (https://www.wook.pt/livro/contra-subversao-em-africa-john-p-cann/165046).

Não seria com um colonialismo “luso-tropicalista” retrógrado capaz de se chegar tão longe e por isso não é com a “lusofonia” vocacionada à assimilação que a tal se pode hoje, ou amanhã, chegar!...

Martinho Júnior - Luanda, 9 de Agosto de 2019

Imagens:
.01- A apologia do fascismo e do colonialismo – “Exposição do Mundo Português” na “Praça do Império” em 1940, próximo do que é hoje o Palácio de Belém, residência oficial do Presidente da República Portuguesa e do Mosteiro dos Jerónimos, um dos símbolos do Império Colonial Português – https://www.youtube.com/watch?v=2QdO6sXEoTI ;
.02- Crítica insofismável ao colonialismo português em Angola – capa de uma das edições do livro de Gérald J. Bender “Angola sob o domínio português, mito e realidade” –https://www.coisas.com/GERRALD-JBENDER-ANGOLA-SOB-O-DOMINIO-PORTUGUES-MITO-E-REAL,name,228663760,auction_id,auction_details;
.03- Colecção de penteados de mulheres “indígenas”, habitantes do “planalto de Mossâmedes”, no início do século XX – http://tudosobreangola.blogspot.com/2010/08/povos-indigenas-na-angola-colonial.html;
.05- O General António de Spínola com seus livros, de que se destaca “Portugal e o futuro”, forneceu por via do “spinolismo” todos os argumentos de relacionamento do regime oligárquico português nascido do 25 de Novembro de 1975 para com África e em particular para com Angola, via Mário Soares e os militares do golpe de 25 de Novembro de 1975, (entre eles Ramalho Eanes, que foi outro dos presidentes portugueses) – https://www.jn.pt/infos/Embeds/mariosoaresinfos/mariosoares_cap3.html

Anteriores: 

Sem comentários:

Mais lidas da semana