Com pouco tempo restante para a
saída oficial da União Europeia (UE), e com limitações jurídicas que reduzem o poder do Parlamento
legislar para barrar uma eventual saída sem acordo, os Partidos de oposição
ao governo britânico se articulam para impedir que o país saia abruptamente no
dia 31 de outubro*. Jeremy Corbyn, líder do Partido Trabalhista (Labour Party),
o maior Partido de oposição no Parlamento, propôs um plano para um voto de não-confiança** ao governo
de Boris Johnson. De acordo com o plano, Corbyn lideraria um Gabinete
temporário com o objetivo de conseguir uma extensão ao prazo de saída junto à
UE e, por conseguinte, a convocação de novas eleições gerais.
O plano de Corbyn, porém, foi
alvo de crítica de membros de outras agremiações partidárias ao governo
Conservador. Caroline Lucas, membro do Parlamento pelo Green Party (Partido
Verde Britânico), apoiou o plano de Corbyn, mas declarou que prefere um segundo referendum antes de uma
nova eleição parlamentar. Posição similar adotada pelo Plaid Cymru, partido nacionalista
galês.
O grande entrave se encontra na
baixa aceitação da figura de Jeremy Corbyn como líder de um possível governo
temporário. Ele foi alçado líder do Labour Party em 2015 com o apoio
de mais de 250 mil correligionários. Apesar de ocupar cargo de membro do
Parlamento desde 1983, Corbyn nunca fez parte dos quadros principais de
liderança do Trabalhista, pelo contrário, ele foi um dos parlamentares que mais se
opôs às propostas de seu próprio Partido. A sua eleição em 2015
representou um direcionamento mais à esquerda em relação às tendências mais
liberais dos governos de Tony Blair e Gordon Brown.
Defensor de propostas polémicas
como a de renacionalização de certos setores da economia e desarmamento
nuclear nacional unilateral, Corbyn sofreu com grande resistência por parte
de seus colegas de Partido. Em 2016, em novo pleito pela liderança, reconfirmou
o apoio de seus eleitores, alcançando dessa vez mais de 300 mil votos na última
rodada de votações. Apesar do apoio recebido, ainda assim continuou sendo alvo
de oposições dentro de seu próprio grupo partidário. Em 2019, nove membros do
Parlamento abandonaram o Labour Party alegando serem contra
à hesitante abordagem de Corbyn em relação ao Brexit e à maneira com
que lidou com acusações de antissemitismo
dentro do Partido.
Além da resistência recebida, um
governo temporário liderado por Corbyn encontraria dificuldade ainda maior na
tentativa de convencer rebeldes do Partido Conservador a formarem a maioria
necessária para derrubar o governo de Boris Johnson. Após o anúncio do plano,
conservadores anti-Brexit, como o parlamentar Dominic Grieve, declararam-se firmemente contrários à
possibilidade de Corbyn liderar um governo temporário.
Jo Swinson, líder do Partido
Liberal Democrata (Liberal Democrats), também da oposição e que atualmente conta com
15 representantes no Parlamento, recebeu com pessimismo a notícia dos
planos de Corbyn. Swinson sugeriu, ao invés, a nomeação de Ken Clarke, do Partido
Conservador, ou Harriet Harman, do Labour, como líderes mais viáveis para
um governo temporário. Clarke e Harman são ambos o homem e a mulher com mais
tempo de serviço na House of Commons, como é chamada a Câmara dos Deputados
britânica, e possuem posições contrárias à um hard-Brexit***. A nomeação de um
desses dois líderes poderia ser mais agradável aos opositores de Jeremy Corbyn.
A viabilidade do plano de Corbyn
dependerá principalmente de como o governo de Boris Johnson lidará com a
tentativa de fazer alguma modificação ao que foi costurado durante dois anos
pelo gabinete de Theresa May. Boris assumiu publicamente o compromisso de levar a
cabo a saída do Reino Unido da UE, com ou sem acordo, no dia 31 de outubro. Ele
se encontrou na semana passada com Angela Merkel e Emmanuel Macron (em
antecedência ao encontro do G7 na França), para discutir possíveis pontos de
mudança em relação ao acertado.
Além da opção de um voto de não
confiança e a instalação de um novo governo, outra maneira de barrar uma saída,
sem um acordo, seria através de novas legislações propostas pelo Parlamento.
Porém, alguns especialistas vêem essa via com dificuldades,
já que, mesmo que consiga passar leis ou recomendações para barrar uma saída
abrupta no dia 31 de outubro, a decisão final ficaria nas mãos do gabinete de
Boris Johnson, que possui o
controle do calendário parlamentar, podendo, assim, barrar que os seus
membros aprovem nova extensão. E mesmo que uma nova legislação fosse aprovada,
caberia ultimamente ao governo colocá-la em prática.
O grande medo de repercussões
desastrosas para o futuro da economia britânica traz uma grande probabilidade
de que a oposição consiga convencer conservadores anti-Brexit a votarem
por um governo temporário. O dilema será aceitar ou não que Corbyn se torne
Primeiro-Ministro, mesmo que por um curto período de tempo.
Notas:
* Data atual acordada entre
a UE e Reino Unido para a saída oficial.
** O voto de não-confiança é
uma votação em sistemas parlamentares que indicam se o governo possui ou não a
maioria necessária para continuar no poder. Caso o governo perca essa votação,
inicia-se o processo para a formação de um novo Gabinete. No sistema britânico,
um voto de não-confiança não leva necessariamente à uma nova eleição. Um novo
governo pode ser formado pela oposição, desde que haja maioria suficiente para
isso.
*** Termo usado para se
referir à um possível Brexit sem nenhum acordo, e com uma conotação mais
pessimista.
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