quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Golpe de estado na Bolívia teve apoio externo e das Forças Armadas


A Bolívia, depois do golpe de Estado com o apoio dos EUA e Brasil, que obrigou à renúncia de Evo Morales, corre o risco de caminhar para uma ditadura com a conivência das Forças Armadas e da extrema direita.


Evo Morales, presidente da Bolívia antes do golpe de estado, foi obrigado a renunciar por pressão das chefias militares, na medida em que foi o general Williams Kaliman a “solicitar” que Morales, sob o pretexto de haver violência, renunciasse para se resolver o “impasse na crise política” provocado após a sua vitória nestas eleições presidenciais com mais de 40% dos votos.

Extrema direita manipulou vários sectores sociais com informações distorcidas

A ajuda ao golpe militar na Bolívia que derrubou o presidente Evo Morales, na opinião de Luís Arce, antigo ministro, segundo declarações prestadas à BBC News, teve apoio de empresários.

De facto, ainda esta madrugada tive oportunidade de ouvir depoimentos de analistas, tais como Aumauri Chamorro, localizado em Bruxelas, e Daniel Cara, cientista político no Brasil, e a opinião generalizada é a de que os elementos de extrema direita instalados na Bolívia souberam explorar sectores da  classe média, principalmente da Província de Sta. Cruz, e de alguns movimentos universitários menos avisados.

Por informações distorcidas alguns sectores universitários aderiram ao golpe de estado, totalmente manipulados pela ultra direita do país. Esta é a verdade que não se conta, quer a renúncia de Morales não ser devidamente explicada, quer a saída de parte da população à rua, nomeadamente os tais movimentos universitários que “queriam” a saída de Morales, terem sido manobrados por Fernando Camacho, como se sabe, líder evangélico de extrema direita e altamente envolvido no golpe militar.

Esta forma de actuar que antecedem golpes de Estado no sentido mais tradicional, verificada em outros contextos, era previsível. Efectivamente, como também está a ser amplamente divulgado em meios de comunicação social, no caso da Bolívia, houve apoio do exterior, em particular dos sectores conservadores dos EUA e do Brasil, havendo mesmo relatos de contactos directos entre Jair Bolsonaro e Fernando Camacho.

Sabe-se que o líder da oposição boliviana, Fernando Camacho, conotado com a extrema direita, considerado agora o Bolsonaro da Bolívia pelas suas posições religiosas, é o homem que tem  o apoio dos golpistas, com o auxílio formal da ala conservadora das Forças Armadas bolivianas.

Na verdade, os golpistas terem apoio da extrema direita não causa espanto a ninguém porque Fernando Camacho, empresário, é filho de um dos homens que trabalhou com o ex-ditador Hugo Banzer Suárez, general boliviano que foi presidente por duas vezes em contexto de ditadura militar.


Evo Morales parte para o México após renúncia forçada e ameaças de morte

A situação na Bolívia após o golpe de estado provocou o caos. Muitas casas de dirigentes ligados a Morales foram incendiadas e diz-se que a casa da irmã também foi saqueada. Familiares de governadores,  deputados e dirigentes do MAS (Movimento para o Socialismo) foram ameaçados e vários ministros e o presidente da Câmara dos Deputados foram obrigados a renunciar pelas Forças Armadas.

Neste cenário, o presidente eleito da Bolívia com mais de 40% dos votos, em virtude de estar a sofrer sérias  ameaças e de correr risco de vida, após a sua residência ter sido saqueada por apoiantes golpistas, de haver casas incendiadas e de diversos sequestros de militantes do MAS, aceitou asilo político no México.

Ao abandonar a Bolívia, o presidente boliviano deposto demonstrou a sua revolta, tendo afirmado que  iria “abandonar o país por razões políticas..” e que “voltaria com mais força e energia”. Na minha opinião o presidente Evo Morales demonstrou um grande sentido de Estado em defesa do seu povo, tudo para tentar evitar uma guerra civil sangrenta.

O México foi um dos primeiros países a denunciar o golpe de Estado ocorrido na Bolívia. O seu presidente defendeu que deve haver novas eleições o mais rapidamente possível, tendo criticado fortemente o golpe, afirmando que “os golpes militares nunca trouxeram nada de positivo” porque “suspendem a vida democrática, as liberdades e os direitos das pessoas..”.


Situação social e política na Bolívia é grave e pode originar guerra civil

O que se está a passar na Bolívia é muito preocupante. Sabendo-se que Morales é o homem forte da Bolívia, há notícias de que os líderes do MAS estão a ser perseguidos e torturados por milícias com o claro intuito de se criar pânico junto dos apoiantes de Morales para estes não participarem em próximas eleições, que serão inevitáveis.

Por outro lado, é preciso ter em atenção, há neste momento um movimento crescente de contestação social contra o golpe militar, uma forte reacção popular dos movimentos sociais e de indígenas que descem da cidade mais alta em direcção a La Paz, receando-se o pior, com possíveis confrontos que poderão originar uma guerra civil na Bolívia.

*M. AZANCOT DE MENEZES - PhD em Educação / Universidade de Lisboa

Publicado em Jornal Tornado - 12 de Novembro de 2019 | Imagens em Google


Leia mais em Jornal Tornado sobre a situação na Bolívia

“O advogado direitista boliviano é testa de uma oposição que não esconde o que fará quando governar. Camacho citou publicamente Pablo Escobar como sinónimo do que deveria ser feito na Bolívia – sugeriu que escrevesse traidores no estilo dos narco-traficantes”.

Este artigo, publicado na edição de junho de 2006 da revista Princípios, explica bem as causas do golpe atual na Bolívia. Evo Morales acabara de tomar posse como presidente, o primeiro de origem indígena. A riqueza de detalhes do autor permite uma visão histórica da quantidade de golpes naquele país, todos com as características do atual.

O ministro das Relações Exteriores brasileiro tornou público que o Brasil reconhece Jeanine Añez como “nova presidente” da Bolívia. Enquanto isso, a violação dos direitos humanos com espancamentos e detenções acontece um pouco por toda a parte.

Sem comentários:

Mais lidas da semana