A Bolívia, depois do golpe de
Estado com o apoio dos EUA e Brasil, que obrigou à renúncia de Evo Morales,
corre o risco de caminhar para uma ditadura com a conivência das Forças Armadas
e da extrema direita.
Evo Morales, presidente da
Bolívia antes do golpe de estado, foi obrigado a renunciar por pressão das
chefias militares, na medida em que foi o general Williams Kaliman a
“solicitar” que Morales, sob o pretexto de haver violência, renunciasse para se
resolver o “impasse na crise política” provocado após a sua vitória nestas
eleições presidenciais com mais de 40% dos votos.
Extrema direita manipulou vários
sectores sociais com informações distorcidas
A ajuda ao golpe militar na
Bolívia que derrubou o presidente Evo Morales, na opinião de Luís Arce, antigo
ministro, segundo declarações prestadas à BBC News, teve apoio de empresários.
De facto, ainda esta madrugada
tive oportunidade de ouvir depoimentos de analistas, tais como Aumauri
Chamorro, localizado em Bruxelas, e Daniel Cara, cientista político no Brasil,
e a opinião generalizada é a de que os elementos de extrema direita instalados
na Bolívia souberam explorar sectores da classe média, principalmente da
Província de Sta. Cruz, e de alguns movimentos universitários menos avisados.
Por informações distorcidas
alguns sectores universitários aderiram ao golpe de estado, totalmente
manipulados pela ultra direita do país. Esta é a verdade que não se conta, quer
a renúncia de Morales não ser devidamente explicada, quer a saída de parte da
população à rua, nomeadamente os tais movimentos universitários que “queriam” a
saída de Morales, terem sido manobrados por Fernando Camacho, como se sabe,
líder evangélico de extrema direita e altamente envolvido no golpe militar.
Esta forma de actuar que
antecedem golpes de Estado no sentido mais tradicional, verificada em outros
contextos, era previsível. Efectivamente, como também está a ser amplamente
divulgado em meios de comunicação social, no caso da Bolívia, houve apoio do
exterior, em particular dos sectores conservadores dos EUA e do Brasil, havendo
mesmo relatos de contactos directos entre Jair Bolsonaro e Fernando Camacho.
Sabe-se que o líder da oposição
boliviana, Fernando Camacho, conotado com a extrema direita, considerado agora
o Bolsonaro da Bolívia pelas suas posições religiosas, é o homem que tem
o apoio dos golpistas, com o auxílio formal da ala conservadora das
Forças Armadas bolivianas.
Na verdade, os golpistas terem
apoio da extrema direita não causa espanto a ninguém porque Fernando Camacho,
empresário, é filho de um dos homens que trabalhou com o ex-ditador Hugo Banzer
Suárez, general boliviano que foi presidente por duas vezes em contexto de ditadura
militar.
Evo Morales parte para o México
após renúncia forçada e ameaças de morte
A situação na Bolívia após o
golpe de estado provocou o caos. Muitas casas de dirigentes ligados a Morales
foram incendiadas e diz-se que a casa da irmã também foi saqueada. Familiares
de governadores, deputados e dirigentes do MAS (Movimento para o
Socialismo) foram ameaçados e vários ministros e o presidente da Câmara dos
Deputados foram obrigados a renunciar pelas Forças Armadas.
Neste cenário, o presidente
eleito da Bolívia com mais de 40% dos votos, em virtude de estar a sofrer
sérias ameaças e de correr risco de vida, após a sua residência ter sido
saqueada por apoiantes golpistas, de haver casas incendiadas e de diversos
sequestros de militantes do MAS, aceitou asilo político no México.
Ao abandonar a Bolívia, o
presidente boliviano deposto demonstrou a sua revolta, tendo afirmado que
iria “abandonar o país por razões políticas..” e que “voltaria com mais força e
energia”. Na minha opinião o presidente Evo Morales demonstrou um grande
sentido de Estado em defesa do seu povo, tudo para tentar evitar uma guerra
civil sangrenta.
O México foi um dos primeiros
países a denunciar o golpe de Estado ocorrido na Bolívia. O seu presidente
defendeu que deve haver novas eleições o mais rapidamente possível, tendo
criticado fortemente o golpe, afirmando que “os golpes militares nunca
trouxeram nada de positivo” porque “suspendem a vida democrática, as liberdades
e os direitos das pessoas..”.
Situação social e política na
Bolívia é grave e pode originar guerra civil
O que se está a passar na Bolívia
é muito preocupante. Sabendo-se que Morales é o homem forte da Bolívia, há
notícias de que os líderes do MAS estão a ser perseguidos e torturados por
milícias com o claro intuito de se criar pânico junto dos apoiantes de Morales
para estes não participarem em próximas eleições, que serão inevitáveis.
Por outro lado, é preciso ter em
atenção, há neste momento um movimento crescente de contestação social contra o
golpe militar, uma forte reacção popular dos movimentos sociais e de indígenas
que descem da cidade mais alta em direcção a La Paz, receando-se o pior, com
possíveis confrontos que poderão originar uma guerra civil na Bolívia.
*M. AZANCOT DE
MENEZES - PhD em Educação / Universidade de Lisboa
Publicado em Jornal Tornado - 12 de Novembro de 2019 | Imagens em Google
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a situação na Bolívia
“O advogado direitista boliviano
é testa de uma oposição que não esconde o que fará quando governar. Camacho
citou publicamente Pablo Escobar como sinónimo do que deveria ser feito na
Bolívia – sugeriu que escrevesse traidores no estilo dos narco-traficantes”.
Este artigo, publicado na edição
de junho de 2006 da revista Princípios, explica bem as causas do golpe atual na
Bolívia. Evo Morales acabara de tomar posse como presidente, o primeiro de
origem indígena. A riqueza de detalhes do autor permite uma visão histórica da
quantidade de golpes naquele país, todos com as características do atual.
O ministro das Relações
Exteriores brasileiro tornou público que o Brasil reconhece Jeanine Añez como
“nova presidente” da Bolívia. Enquanto isso, a violação dos direitos humanos
com espancamentos e detenções acontece um pouco por toda a parte.
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