O ativista e professor
universitário angolano Domingos da Cruz, um dos entrevistados pelo Consórcio
Internacional de Jornalismo de Investigação, realça que o que Isabel dos Santos
e o pai fizeram em Angola “tem envolvimento da comunidade internacional, de governos
e outras personalidades em diferentes partes do mundo”.
O ativista e professor
universitário angolano Domingos da Cruz considera que as revelações sobre a
empresária Isabel dos Santos mostram que "existe uma teia de corrupção
internacional" que vai muito para além das investigações em Angola.
"Não é surpresa nenhuma a
participação de governos ocidentais naquilo que se acusa ser corrupção de
Isabel dos Santos, a família e os amigos, todos membros do antigo regime, isto
é uma teia de corrupção internacional, não é uma questão meramente interna de
Angola", disse o ativista em declarações à Lusa.
"Isto não significa que
Isabel dos Santos e família não sejam responsáveis, eles têm toda a
responsabilidade, mas é preciso que fique clara a hipocrisia do mundo
ocidental", vincou o autor da tradução do livro "From dictatorship to
Democracy: A Conceptual Framework for Liberation", escrita por Gene Sharp,
pela qual foi condenado a uma pena de prisão.
Comentando à Lusa as revelações
feitas no domingo pelo Consórcio Internacional de Jornalismo de Investigação (ICIJ),
Domingos da Cruz disse: "Os dados mostram claramente que o que Isabel dos
Santos e o pai fizeram em relação a Angola tem envolvimento da comunidade
internacional, de governos e outras personalidades em diferentes partes do
mundo, da Europa até aos Estados Unidos da América".
Questionado sobre quais os países
e quais as personalidades, respondeu: "Os jornalistas envolvidos nessa
investigação começaram a lançar os primeiros dados e há outros que hão de vir e
mostram claramente o envolvimento dos governos em várias partes do mundo".
Na resposta, acrescentou que
"há várias empresas do sector privado dos EUA que contribuíram
consideravelmente para que o povo angolano estivesse no nível de miséria em que
está hoje" e escusou-se a apontar nomes: "Não gostaria de avançar
mais nada, o trabalho está em curso e haverá mais revelações a caminho",
concluiu.
QUESTÕES LEGAIS E POLÍTICAS
Domingos da Cruz, que foi um dos
entrevistados pela equipa de jornalistas do ICIJ na preparação dos relatórios
disponibilizados no domingo ao final da tarde, diz que não foi surpreendido
pela divulgação dos dados e lembra que repetidas vezes tem dito o mesmo.
"Sempre dissemos que o país
estava a saque e nem sequer éramos ouvidos pela comunidade internacional, pelo
contrário, havia cumplicidade, neste sentido; as pessoas envolvidas são tão
ladras e corruptas quanto a Isabel e isso é uma lição para os africanos em
geral, porque quando os tempos e os interesses mudam, mudam também as vontades,
e temos de aprender a estar virados para dentro e para os nossos
interesses", defendeu.
O ativista, de resto, insere esta
divulgação da investigação num contexto mais amplo da luta política
geoestratégia, e diz que "não é um jogo desinteressado, não há intenção de
ajudar o povo angolano, pelo contrário, há um reposicionamento estratégico no
xadrez geopolítico internacional com vista a manterem os seus interesses em
Angola, uma vez que o poder mudou de mãos".
Na entrevista à Lusa, Domingos da
Cruz argumentou que "Angola não é uma democracia, nem um Estado
democrático, e o que é razoável esperar é que a Justiça faça o seu caminho, e
que Isabel dos Santos, enquanto mulher que está no centro das investigação,
trilhe o caminho necessário de acordo com as regras, com direito a defesa, tem
recursos para os melhores advogados", apontou.
Questionado sobre as possíveis
consequências do caso conhecido como Luanda Leaks, o entrevistado respondeu:
"As consequências serão sobretudo do ponto de vista legal, mas como Isabel
dos Santos conseguiu acumular toda essa riqueza mediante o favorecimento do
pai, a riqueza tem então origem política e uma solução para o problema passaria
por uma questão política, porque o problema não é só jurídico".
O Consórcio Internacional de
Jornalismo de Investigação (ICIJ) revelou no domingo mais de 715 mil ficheiros,
sob o nome de Luanda Leaks, que detalham esquemas financeiros de Isabel dos
Santos e do marido, Sindika Dokolo, que terão permitido retirar dinheiro do
erário público angolano, utilizando paraísos fiscais.
Isabel dos Santos disse estar a
ser vítima de um ataque político orquestrado para a neutralizar e sustentou que
as alegações feitas contra si são "completamente infundadas",
prometendo "lutar nos tribunais internacionais" para "repor a
verdade".
Expresso | Lusa
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