António Rodrigues | Público |
opinião
Umaro Sissoco Embaló desafiou a
CEDEAO, deixou de ser parceiro do diálogo, para assumir que o poder é seu.
Resta saber se a comunidade internacional aceita que se possa chegar ao poder
através da “anarquia”, como classificou as acções do autoproclamado Presidente.
Quando tem bico de pato, penas de
pato, pés de pato e grasna como um pato, o mais provável é ser um pato. Quando
um candidato se autoproclama Presidente, marca a sua própria tomada de posse,
usa soldados para ocupar ministérios e instituições públicas e hostilizar
ministros, corta a transmissão da televisão e rádio públicas e se nega a
receber uma missão internacional, o mais provável é ser um golpe de Estado.
Se até Baciro Djá –
ex-primeiro-ministro que obteve apenas 1,28% nas eleições presidenciais e
lidera um partido, a Frente Patriótica de Salvação Nacional (Frepasna) que
juntou quase 14 mil votos, mas nem a ele conseguiu eleger deputado – se permite
desafiar o autoproclamado Presidente, percebemos que esse autoproclamado
Presidente exagerou tanto nas acções que os seus dias parecem contados.
Chamar-lhe general de pacotilha e
declarar com bazófia que se Sissoco Embaló não se demitir até 27 de Março, vai
ele mesmo retirá-lo do palácio presidencial, é um sinal de que Djá acredita no
fim breve do pato e que não se verá obrigado a cumprir a palavra dada. Embora,
tudo indique que o “marechal”, título que deu a si mesmo para troçar da
identificação de Embaló como general, se tivesse deixado levar pela bravata
retórica.
O comunicado do Governo de Nuno
Nabiam, nomeado pelo autoproclamado Presidente, sobre a missão da CEDEAO, que
acabaria por ser cancelada, é um gesto de desafio à comunidade internacional
que parece uma manobra desesperada. Assumindo uma força que, dadas as circunstâncias,
realmente não tem, mas esperando que o gesto seja percebido com a solidez de um
facto consumado.
“Esta missão não é bem-vinda e
não permitiremos nenhuma delegação sem que antes tenha havido uma concertação
prévia com o Governo liderado por Nuno Gomes Nabiam”, dizia o comunicado.
O que é um contra-senso, porque
uma missão que chega com o objectivo de “ajudar a uma resolução rápida do
contencioso eleitoral nascido da proclamação dos resultados da segunda volta
das eleições presidenciais”, não pode considerar como de jure um governo que a
CEDEAO condena, porque atenta contra a ordem constitucional e foi constituído
através de “acções que são contrárias aos valores e princípios democráticos
partilhados” pela organização.
Sissoco Embaló pode até nem ser general,
mas as suas tácticas têm resultado. Enquanto o PAIGC gritava fraude eleitoral e
intentava no Supremo Tribunal reverter aquilo que a Comissão Nacional de
Eleições continuava a assumir como resultados válidos, o candidato deu um passo
em frente e ocupou o cargo, demitiu o Governo, nomeou outro e esperou que o
facto consumado acabasse por calar as críticas internacionais.
Parecia o final de uma boa
estratégia. Só que a CEDEAO, por pressão das Nações Unidas, viu-se obrigada a
mudar o tom de vazio protesto do comunicado de 28 de Fevereiro, para uma
assertiva condenação das acções de Embaló no de 1 de Março. Ao mesmo tempo que
decidia enviar uma missão de alto nível que marcou uma reunião com Aristides
Gomes, reconhecendo-o como primeiro-ministro legítimo.
Sem o reconhecimento
internacional dos seus decretos presidenciais, Embaló, ciente de que, como
afirmava Sun Tzu, “a arte da guerra se baseia no engano”, assumiu uma posição
de força, esperando que o gesto engane os inimigos internacionais.
Só que, assumindo o desafio,
deixa de ser parte do diálogo na resolução da crise política, enfraquece a sua
posição internacional e mostra que as penas de coruja disfarçavam apenas o pato
de um golpe de Estado. E a comunidade internacional até pode ser tolerante para
reformas constitucionais que são de facto golpes legais, mas se se calar agora
estará a legitimar a “anarquia”, como a CEDEAO chamou às acções de Embaló.
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