Economia está desmoronando.
Inexiste plano para conter pandemia e a crise ameaça tombar governo. Mas Guedes
e Bolsonaro tentam disfarçar incompetência com barbárie – um, de olho em 2022;
outro em privatizar o que sobrar do Estado
#Escrito em português do Brasil
Paulo Kliass | Outras Palavras
A cada novo dia que passa
amplia-se a percepção em nossa sociedade a respeito do tremendo equívoco que
representou a eleição de Jair Bolsonaro para a Presidência da República em
outubro de 2018. Percebe-se uma generalização do movimento contra esse governo,
inclusive da parte de setores que o haviam apoiado no segundo turno contra a
candidatura de Fernando Haddad.
A consolidação de uma Frente
Ampla contra as pretensões golpistas e autoritárias do ex-capitão vem se somar
ao aumento do apoio popular ao impeachment contra o ocupante do Palácio do
Planalto. As mais recentes denúncias e escândalos envolvendo sua família e a
forma destrambelhada que foi encontrada para “exilar” sob as asas de Trump o
pior Ministro da Educação de nossa História marcam a crise de isolamento
político crescente do chefe de governo no momento atual.
Talvez o que mais impressiona nesse
xadrez é própria insistência de Bolsonaro com sua estratégia genocida. Para
ele, pouco importa se o Brasil passou a ocupar o vergonhoso e trágico posto de
vice-líder mundial no número de casos de covid-19, tendo superado a marca de 50
mil óbitos. Afinal, trata-se de mera gripezinha e as mortes viriam de uma forma
ou outra, táoquei? E daí? O Exército está produzindo cloroquina em volumes
impressionantes e ela será a mais nova panaceia para nos livrar de todo esse
mal.
Bolsonaro denuncia a imprensa, a
oposição, os médicos, os governadores e os prefeitos por toda a crise. Acuado,
ele sabe muito bem que seus índices de popularidade já estão em queda, por mais
que o núcleo mais ideológico continue oferecendo a ele seu apoio sob qualquer
circunstância. Do ponto de vista do crescimento da economia, 2019 foi um ano
perdido e a culpa é da enganação promovida por Paulo Guedes. O pibinho dos
primeiros doze meses de governo divulgado pelo IBGE revelou o fracasso da
agenda austericida. Considerando que as eleições previstas para esse ano estão
perdidas e não interessa a ele conferir nenhum conteúdo plebiscitário no
pleito, tudo se volta para a tentativa de reeleição em 2022.
A pior dupla possível
Com essa estratégia, Bolsonaro
procura colar nos chefes dos executivos estaduais e municipais a
responsabilidade por toda a tragédia que, na verdade, foi por ele criada e potencializada.
Dia sim e outro também ele sai às ruas sem proteção alguma contra a doença e
estimula retomada irresponsável das atividades econômicas. Com isso, fica a
mensagem de que a crise, o desemprego e as mortes estariam aí por conta de quem
não quer deixar o povo trabalhar e ele governar. O genocídio que sua conduta
irresponsável está causando na população mais desassistida de nosso país vem a
reboque de sua pretensão política e eleitoral.
O superministro da economia busca
se adequar ao discurso do chefe. Mantém o repeteco da mesma lengalenga de
sempre: reformas e privatização. No entanto, sabe que será cobrado pelo
fracasso de sua gestão à frente do monstrengão que fundiu Fazenda,
Desenvolvimento e Indústria, Planejamento e Trabalho. Guedes não entregou nada
do que prometeu ao então candidato. Sua única possibilidade de permanecer na
equipe é buscando o reforço do apoio do povo do financismo. Com isso, ele se
volta novamente para sua agenda de desmonte das políticas públicas e de
destruição do Estado brasileiro. Restabelece a oportunidade para que os
representantes do capital financeiro possam continuar a fazer a festa às custas
da administração pública. Alguém aí falou em crise? Que crise? Sempre apoiada
pelo governo de plantão, dificuldade é uma palavra desconhecida pela banca
tupiniquim.
Guedes procura fugir da discussão
das dificuldades atuais e de sua revelada incompetência em apresentar soluções
para a grande maioria da população desassistida e para as micro, pequenas e
médias empresas que não contam com recursos próprios para atravessar o período
de confinamento. Assim, desde março ele se mantém agarrado à narrativa do
pós-pandemia. Não discute o presente, apenas o futuro. Mas não pelo fato de que
esse debate é mesmo importante. Simplesmente ele usa esse recurso para tirar o
foco da enormidade da crise atual e da falta de respostas de sua equipe. Aliás,
quem tem um mínimo de senso de oportunismo na cabeça, já começa a cair fora,
como foi o caso do ex-Secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida.
Guedes: desespero bate à porta
Ocorre que nem sempre se consegue
escapar da realidade com evasivas. Os números oficiais divulgados por órgãos do
próprio governo são catastróficos. E aí o old chicago boy começa dar
sinais de desespero. Para tentar explicar o inexplicável inventa sandices como
a separação desonesta e equivocada do PIB em dimensões estanques do setor
público e do setor privado. Era uma tentativa a mais de dizer que o produto do
governo foi pior do que o do privado – caiu em tamanho ridículo que não deve
mais repetir a dose. A calhordice mais recente foi na “inovação” no método de
apuração da carga tributária em relação ao PIB. Para tornar os números mais
assustadores, Guedes resolveu somar ao volume de tributos arrecadados o próprio
déficit fiscal. Mais uma loucura escandalosa, na busca tresloucada por
argumentos para reforçar a ideia de falência do Estado e da necessidade de
avançar na privatização para solucionar o problema fiscal.
Tudo se passa como se Guedes não
tivesse tirado nenhuma lição da crise atual. Para ele, o pós-pandemia deve se
limitar ao receituário de antes e de sempre. Avançar nas reformas de destruição
das conquistas inseridas na Constituição de 1988 e generalizar a transferência
do patrimônio público ao capital privado por meio da retomada dos processos de
privatização das empresas estatais. Essa é cabeça obtusa de quem esteve sempre
acostumado a amealhar fortunas privadas às custas da privatização das finanças
públicas.
Povo nenhum merecia uma duplinha
tão terrível no comando de seu país. E muito menos em um momento tão crítico
como esse que vivemos atualmente sob a égide da covid-19. Um presidente que
desconsidera as mortes de seus cidadãos em prol de sua ambição de poder e um
superministro que parece se inspirar nos jogos de destruição para orientar a
política econômica.
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