A forma como a UE dos monopólios
vem lidando com a pandemia e com o que virá a seguir é inteiramente elucidativa
do que dali há a esperar: defesa dos interesses das potências centrais à custa
de uma ainda maior vulnerabilização de países periféricos (sejam eles maiores
ou menores). É isso a “solidariedade” UE. E também um ainda maior alinhamento
com o imperialismo EUA e a NATO.
João
Ferreira* | opinião
A estafada retórica da
«solidariedade europeia», a cada novo sobressalto, volta irremediavelmente a
tropeçar, uma e outra vez, na realidade do cada-um-por-si, marca de água da
integração capitalista europeia.
Depois da péssima impressão
deixada com a resposta inicial ao surto da COVID-19, quando a Itália se viu a
braços com a falta de material e equipamento médico, que alguns «parceiros»
retinham nas respectivas fronteiras, de súbito reerguidas; depois de aterrarem
em solo italiano aviões oriundos da China, trazendo algum do equipamento que os
«parceiros europeus» retinham arbitrariamente, mas também de Cuba, com pessoal
médico, e da Rússia, com equipas de apoio a ações de desinfecção; depois de
tudo isto, a Comissão Europeia veio assegurar, com solenidade, que a
«descoordenação» inicial (assim lhe chamaram) era coisa do passado, sendo que o
presente e o futuro seriam pautados pela acção coordenada dos 27 em todos os
domínios de resposta ao surto e às suas consequências.
Até que chegou o desconfinamento
e a hora de abrir fronteiras. A «coordenação», que nos juravam ir sobre carris,
deu lugar, não tanto à descoordenação, que disso não se tratou, mas à pura
perfídia de quem procura obter ganho próprio com o mal intencionalmente
infligido ao outro, isto no dizer do insuspeito ministro Santos Silva, que
acusou alguns dos países que fecharam portas ao restabelecimento das ligações
aéreas com Portugal (foram oito no total, enquanto outros nove introduziram
outro tipo de limitações) de quererem desviar fluxos turísticos em proveito
próprio, num tempo em que estes consabidamente escasseiam.
Tão pouco habitual e desabrida
acusação teve como fundamento a disparidade de critérios para decidir a
reabertura de fronteiras, a par de decisões consideradas injustificadas, à luz
da elementar razoabilidade na leitura dos dados sobre a situação de saúde
pública.
Que viva, pois, a «solidariedade
europeia» e a coordenação que lhe é inerente.
Entretanto, que ninguém diga que
a Comissão Europeia nada aprende com Trump.
Na apresentação de uma
comunicação intitulada Combater a desinformação sobre a COVID-19: repor a verdade
dos factos, feita há dias, a comissária Jourová, responsável pela pasta
«valores e transparência», num acto sem precedente, veio acusar a China de
lançar campanhas de desinformação a respeito da COVID-19, «tanto na UE como na
sua vizinhança e a nível mundial, procurando minar o debate democrático e
exacerbar a polarização social». Jourová refere-se concretamente à «promoção
exagerada do apoio da China à UE, com muita propaganda que indica que os
Estados-Membros e as instituições democráticas europeias não foram capazes de
lidar com a crise».
A gravidade da acusação, as suas
possíveis consequências e as intenções que lhe subjazem não podem, em nenhum
momento, ser desvalorizadas.
De caminho, Jourová defendeu o
reforço da cooperação com a NATO, porque «a desinformação é uma ameaça híbrida
e, por isso, uma questão de segurança». E aludindo aos «inimigos internos», que
acusa de agirem ao serviço do «inimigo externo», deixou um aviso sibilino:
«temos de limpar a nossa própria casa».
* em O Diário.info
*Este artigo foi publicado no
“Avante!” nº 2430, 25.06.2020
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