quarta-feira, 5 de agosto de 2020

Angola | SÓ A COERÊNCIA SOCORRE O RUMO

Martinho Júnior, Luanda   

BREVE APONTAMENTO SOBRE A CORRENTE HISTÓRICA DA LIBERTAÇÃO EM ÁFRICA

Para os jovens de hoje, cuja existência coincide com o início da IVª República de Angola, há que reafirmar o rumo da Pátria de Agostinho Neto, acima da suspeita de qualquer política, por que as largas décadas do movimento de libertação em África não terminaram, ainda que haja a sórdida tentativa neoliberal de anestesiar todo o continente e em anestesia baralhar, confundir, iludir, dividir e dar de novo!

Aqueles que assumiram a Proclamação das FAPLA que perfez no dia 1 de Agosto 46 anos e a Proclamação da República Popular de Angola, mantêm a coerência da lógica com sentido de vida, honrando o passado e a nossa história, por que o parto da independência foi uma prova de vida, à prova de subversão, à prova de qualquer anestesia e todavia pronta a se reequacionar, a renascer e a manter-se de pé hoje e sempre!

Só a coerência histórica pode ser socorro para qualquer etapa, qualquer que seja o turno em vida dessa etapa e por isso, perder esse tesouro filosófico intemporal, é perder um pouco o fulgor do rumo e não corresponder à mais profunda e legítima dignidade do projecto patriótico da pátria pela qual gerações e gerações de angolanos se empenharam a fundo, para lançar os alicerces do resgate imenso que está longe determinar!

De Artur Queirós recebi este escrito em anexo que ouso juntar como um contributo para que haja a oportunidade à reflexão filosófica acima de qualquer política, por que a lógica com sentido de vida é uma temperança substantiva que não se esgotou, nem algum dia se pode esgotar, mesmo que haja alguns lapsos, ou algumas imprecisões, ou alguns descompassos com que nos queiram situar e fixar!...

Martinho Júnior -- Luanda, 3 de Agosto de 2020.

Imagens: Dois monumentos que marcam o imenso salto histórico do sul transatlântico: o monumento à Escrava Carlota, em Cuba e o Monumento à batalha de Quifangondo, em Angola.

RECORDAÇÕES DE UM MARCIANO

Acta da Derrota e Constituição da República Popular

Artur Queiroz

O Presidente da África do Sul do regime de apartheid, PW Botha, convocou para o dia 28 de Agosto de 1988 (há 22 anos) uma reunião classificada como ultra secreta para tomar decisões de Estado sobre a derrota das forças de defesa e segurança no Triângulo do Tumpo. Estavam presentes os mais altos dirigentes sul-africanos e tomaram uma decisão dolorosa: acabar com o regime de apartheid e acatar a Resolução 435 da ONU sobre a Independência da Namíbia. Os turistas da Jamba acabavam de perder os negócios do tráfico de droga, marfim e diamantes.

Na reunião de alto nível estiveram presentes além do Presidente PW Botha, o ministro da Defesa, general Magnus Malan, o ministro das Relações Exteriores, Pik Rudolf Botha, o general Jannie Geldenhuys, o major general Neil Van Tonder e o major general Kat Liebenberg, principais chefes militares.

O secretário da reunião escreveu na acta que o Presidente da República, usando os seus poderes constitucionais decidiu “desmobilizar a 82ª Brigada e o 61º Batalhão Mecanizado, que foram formados para a Batalha do Tumpo”. Mas o momento mais importante da reunião estava para vir. A acta refere taxativamente: “O ministro da Defesa (general Magnus Malan) e o general Geldenhuys assumem aqui a total responsabilidade da derrota”.

A acta da reunião datada de 28 de Agosto de 1988 revela um detalhe fundamental para se compreender o alcance político da vitória das FAPLA na Batalha do Cuito Cuanavale. O Presidente PW Botha, mais uma vez invocando os seus poderes constitucionais “delegou no Dr. Neil Barnard, Chefe da Inteligência Nacional, para preparar negociações com Nelson Mandela e providenciar a sua libertação”.

O primeiro presidente da África do Sul após a queda do regime de apartheid já tinha sido libertado da ilha de Robben e estava em regime de prisão domiciliária na província do Cabo. Esta situação causou mal-estar e sérias divisões no seio do ANC. Depois da “acta da derrota”, Nelson Mandela passou a frequentar os corredores do poder em Pretória, negociando a transição. Não sem antes ser feita uma encenação mediática da sua libertação do cárcere.

As alas mais radicais do ANC criticaram-no duramente. Ficou em perigo a unidade no seio da organização que liderou a luta contra o regime de apartheid. A Comissão da Verdade e Reconciliação na África do Sul serviu para silenciar essas vozes onde pontificava Winnie Mandela (Nomzamo Winifred Zanyiwe Madikizela).

Os comissionistas da “verdade” não estiveram com meias medidas, acusaram-na de ter executado um “bufo”. Como foi pouco, ainda arranjaram mais 43 crimes de fraude e 25 de roubo. Os juízes absolveram-na de todos os crimes de roubo, mas entre os 43 de fraude lá arranjaram dois ou três que lhe valeram três anos e meio de prisão, pena suspensa. A Mamã da luta anti-apartheid foi banida do ANC. Mais tarde Nelson Mandela, magnânimo, acabou por aceitar a sua reintegração no partido.

Nada se sabe das negociações entre Mandela e Neil Barnard em Pretória, porque as reuniões eram secretas. Mas o líder do ANC, nas suas memórias, descreve um encontro com o presidente nazi e racista, P W Botha. Revela que tomaram chá e viu nele uma pessoa encantadora.

A Comissão Verdade e Reconciliação na África do Sul teve duas faces. Uma está retratada e dela podem falar os dirigentes e militantes do ANC reprimidos e saneados. A outra acabo de revelar os primeiros traços. Serviu às mil maravilhas para desonerar os próceres do regime de apartheid de todos os seus crimes. Ficou tudo limpo, bem colorido em arco-íris e reconciliado no esmagamento de quem, no seio do ANC, manifestou as suas discordâncias.

O ministro Francisco Queiroz arranjou uma comissão que está a servir para lançar os cães de palha contra os libertadores de Angola, os líderes do regime revolucionário, os Heróis que derrotaram tudo o que lhes apareceu pela frente, inclusive os membros do golpe militar de 27 de Maio de 1977. Dizem que os dirigentes políticos e militares do golpe não tiveram direito a julgamento. Falso. Foram julgados em Tribunal Marcial ou em Tribunais Populares.

Agostinho Neto e seus camaradas sim, não têm direito a julgamento e estão a ser condenados pelo latifundiário dos Media Angolanos. Querem saber quem é? Olhem para o que aconteceu com o Grupo Medianova e têm a resposta. Vejam de quem são os órgãos de comunicação social que publicam diariamente mentiras e calúnias contra o Fundador da Nação Angolana e seus companheiros de luta.

Como têm pouco jeito para a propaganda, mesmo a mais barata e rasteira, esquecem pormenores fundamentais. Por exemplo, concentram todo o seu ódio em Agostinho Neto, acusando-o de ter executado inocentes que ainda por cima eram “putos”. Senhor ministro Francisco Queiroz, por favor mande tomar nota.

Constituição da República Popular de Angola, Artigo 1º diz que Angola “é um Estado cujo primeiro objectivo é a total libertação do Povo Angolano dos vestígios do colonialismo e da dominação e agressão do imperialismo”. Combater os mentores do golpe militar de 27 de Maio de 1977 fez todo o sentido ao abrigo deste artigo.

Artigo 6º da Lei Fundamental da República Popular de Angola: “As Forças Armadas Populares de Libertação de Angola - FAPLA - braço armado do Povo, sob a direcção do M.P.L.A. e tendo como Comandante em Chefe o seu Presidente, são institucionalizadas como exército nacional da República Popular de Angola, cabendo-lhes a defesa da integridade territorial da Pátria”. Senhor ministro da Defesa, senhores Chefes Militares, ontem foi o aniversário da fundação das forças armadas da República Popular de Angola. Um pouco mais de respeito, por favor.

Já agora leiam o Artigo 16°: “A República Popular de Angola não adere a qualquer organização militar internacional, nem permite a instalação de bases militares estrangeiras em território nacional”. Vejo muita correria para Washington e condecorações a agentes secretos dos EUA. Não ousem capitular ante os Trump que são a vergonha da Humanidade.

Esta parte é que interessa particularmente ao senhor ministro da Justiça e dos Direitos Humanos. Entramos no Capítulo III da Lei Fundamental da República Popular de Angola e tem a ver com o Conselho da Revolução. Artigo 35º: “Enquanto não se verificar a total libertação do território nacional e não estiverem preenchidas as condições para a instituição da Assembleia do Povo, o órgão supremo do poder do Estado é o Conselho da Revolução”.  Na data do golpe militar derrotado em 27 de Maio de 1977, Angola não estava totalmente libertada e os angolanos viviam em guerra. O que agrava as responsabilidades dos golpistas.

Os membros do órgão supremo estão descritos no Artigo 36º e são muitos: “O Conselho da Revolução é constituído a) Pelos membros do Bureau Político do M.P.L.A.; b) Pelos membros do Estado-Maior Geral das F.A.P.L.A.; c) Pelos membros do Governo designados para o efeito pelo M.P.L.A.; d) Pelos Comissários Provinciais; e) Pelos Chefes dos Estados-Maiores e Comissários Políticos das Frentes Militares”.

Senhor ministro, aponte um só destes membros do Conselho da Revolução que tenha considerado um erro político, o combate ao golpe de estado militar ocorrido em 27 de Maio de 1977. Um deles, Lopo do Nascimento, diz que não soube de nada. Aproveito para fazer uma confissão: Sou marciano, mas vivi muito tempo em Plutão, por isso nada sei do que se passa na Terra.

Só mais um passo. Aa atribuições do Conselho da Revolução estão plasmadas no Artigo 38º: “O Conselho da Revolução tem as seguintes atribuições a) Exercer a função legislativa, que poderá delegar no Governo; b) Definir e orientar a política interna e externa do país; c) Aprovar o Orçamento Geral do Estado e o Plano Económico elaborado pelo Governo; d) Nomear e exonerar o Primeiro-Ministro e os restantes membros do Governo, sob a indicação do M.P.L.A.; e) Nomear e exonerar os Comissários Provinciais, sob a indicação do M.P.L.A.; f) Autorizar o Presidente da República a declarar a guerra e a fazer a paz; g) Decretar o estado de sítio ou o estado de emergência; h) Decretar amnistias”.

Senhor ministro Francisco Queiroz, sabia que o órgão máximo do poder em Angola, quando ocorreu o golpe de estado militar em 27 de Maio de 1977 era o Conselho da Revolução? Então porque concentram todo o vosso ódio em Agostinho Neto? Espero que os actuais titulares dos órgãos de soberania não estejam a vingar-se das retumbantes vitórias do Povo Angolano sob a liderança do MPLA e de Agostinho Neto.

Sem comentários:

Mais lidas da semana