Campanha
"Zero Comunicação" é convocada pelo Sindicato dos Jornalistas. Órgãos
de comunicação social em todo o país não vão emitir notícias, reportagens e
programas, contra denúncias de agressões, ameaças e intimidações.
Contra
"as ameaças à liberdade de imprensa e de expressão na Guiné-Bissau”, esta
quinta-feira (06.08) é "dia de silêncio” na comunicação social guineense.
A campanha "Zero Comunicação” é convocada pelo Sindicato dos Jornalistas e
Técnicos de Comunicação Social da Guiné-Bissau (SINJOTECS).
O
sindicato lembra que a comunidade internacional, as principais organizações da
sociedade civil da Guiné-Bissau e alguns partidos políticos na oposição falam
em "grandes retrocessos" nas conquistas alcançadas nos últimos 20
anos em relação às liberdades fundamentais no país. Os próprios jornalistas
recorrem às redes sociais para denunciar constantes agressões e ataques por
parte do poder político.
Os
profissionais da comunicação social pretendem também exigir que se faça justiça
sobre o
ataque à rádio Capital, completamente vandalizada no passado dia 26 de
julho por um grupo de homens armados e com uniformes da polícia guineense. Após
reuniões com as entidades competentes sem que se vislumbre uma solução, e tendo
em conta a deterioração da situação, os jornalistas decidem paralisar
completamente os órgãos de comunicação social em protesto. O
secretário-geral do SINJOTECS, Diamantino Domingos Lopes, falou com a DW África
sobre esta ação.
DW
ÁFRICA: O que se pretende com o dia de silêncio e a campanha Zero Comunicação?
Diamantino
Lopes (DL): O nosso objetivo é repudiar as ameaças que se estão a
verificar à liberdade de imprensa e de expressão na Guiné-Bissau. Tudo isso
agravou-se com o assalto à rádio Capital, no dia 26 de julho. Por isso,
decidimos mobilizar os órgãos de comunicação social do país para se manterem em
silêncio esta quinta-feira para repudiar o que consideramos uma ameaça aos
jornalistas e profissionais da comunicação social. Repare que não é só a rádio
Capital que está em causa, está em causa a liberdade de imprensa, a liberdade
de expressão, a democracia e o Estado de Direito na Guiné-Bissau. Pretendemos
com esse ato pressionar o Governo, através do Ministério da Justiça, que tem a
tutela administrativa da Polícia Judiciária, para concluir o mais rapidamente
possível o processo da investigação sobre o ataque à rádio Capital. Queremos
conhecer os autores, sejam morais ou materiais destes atos que se configuram um
atentado a liberdades fundamentais.
DW
África: O que vão fazer esta quinta-feira (6)?
DL: Vamos
ter uma vigília ao largo da rádio Capital. Depois, tornar pública uma carta
aberta que enviaremos aos titulares dos órgãos da soberania, também ao
Ministério Público e às organizações da sociedade civil da Guiné-Bissau.
Queremos dar um sinal claro contra atropelos às liberdades fundamentais.
DW
África: Esta iniciativa vai envolver todos os órgãos de comunicação social do
país?
DL: Em
princípio, sim. Os órgãos de comunicação social públicos dependem do Governo.
Falamos com os diretores, que dizem estão dependentes do secretário de Estado
da Comunicação Social e este, por sua vez, diz que tudo vai depender do
primeiro-ministro [Nuno Gomes Nabiam]. E em função da conversa que vai ter com
o chefe do Governo dará uma resposta. Até então, não temos uma reposta do
secretário do Estado relativamente ao posicionamento dos órgãos públicos.
Portanto, estamos a contar com os órgãos privados e também as rádios e
televisões comunitárias do país.
DW
África: Que tipo de ameaças que jornalistas recebem? Pode citar alguns casos
concretos, além do ataque à rádio Capital?
DL: Não
se vê claramente ameaças aos profissionais da comunicação social no seu todo.
Mas existem sinais que vêm das estruturas políticas contra os trabalhos dos
órgãos de comunicação social que posicionam claramente face aos últimos
acontecimentos políticos no país. Há uma clara advertência contra os
profissionais de comunicação social desde os acontecimentos de fevereiro, que
culminam com a posse simbólica do Presidente da República e do Governo, que
não observaram os princípios constitucionais. Os órgãos e os profissionais de
comunicação social estão, de certo modo, intimidados e obrigados a reconhecer,
a legitimar as estruturas instaladas no poder. Quem comunicar numa perspetiva
diferente sofre essas ameaças. Não só pelas estruturas políticas, mas também
pelos grupos criados nas redes sociais e alguns jornalistas, até dos órgãos
tradicionais, atacam os colegas que tentam cumprir os princípios
constitucionais que determinam, por exemplo, a posse de um Presidente da
República, a formação de um Governo constitucional, por aí fora.
Nas
conferências de imprensa dessas formações políticas [atualmente no poder], os
jornalistas têm muitas limitações em termos de colocação de perguntas. Caso
faça perguntas que não convêm ao partido, aos militantes que são convocados
para assistir à conferência de imprensa, o jornalista é vaiado, insultado,
ameaçado verbal e até fisicamente - já aconteceu com dois colegas. Ultimamente,
os jornalistas vão às conferências de imprensa sem fazerem questões para evitar
essa situação. Portanto, estamos num momento, de certo modo, complexo para o
exercício jornalístico no país.
DW
África: Tudo isso acontece numa altura em que a sociedade civil, a comunidade
internacional, os próprios jornalistas e até os Estados Unidos de América
denunciaram perseguições e ameaças contra os jornalistas nos últimos meses. O
que é que o sindicato fez para pôr cobro à situação?
DL: O
nosso principal parceiro é o Governo. Com o atual secretário de Estado da Comunicação
Social, [Conco Turé], já reunimos mais de quatro vezes para discutir a
situação. Já reunimos com o Estado Maior das Forças Armadas, após agressão física
ao nosso colega Serifo Tawel Camará, jornalista da rádio Capital. Reunimos com
o secretário de Estado da Ordem Pública, Mário Sambé, sobre o mesmo assunto.
Mas tudo sem sucesso ou progresso. Mas não falta a advocacia e nem os contatos
com as autoridades do país para trabalharem no sentido de garantir a segurança
e o exercício livre da imprensa e da liberdade de expressão. Até já reunimos
com os organismos internacionais, nomeadamente com a União Africana (UA),
Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), Gabinete
Integrado das Nações Unidas para a Consolidação da Paz na Guiné-Bissau (UNIOGBIS),
um parceiro com quem trabalhamos juntos nesta situação. Este é um problema com
a dimensão do país, por isso, é necessário a mobilização de toda a força viva
da nação para intervir nesta situação.
Braima
Darame | Deutsche Welle
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