Menos de uma semana após 13 homens serem presos por conspiração para raptar e matar a governadora de Michigan e incitar uma guerra civil na véspera das eleições presidenciais americanas, o assunto foi em grande parte varrido para debaixo do tapete pela mídia e pelo Partido Democrata.
Os democratas, apavorados com qualquer coisa que possa provocar um movimento social nas bases, estão encobrindo o significado mais amplo da trama e sua conexão com a estratégia política do governo Trump para fomentar a violência fascista no período que antecede as eleições. Para isso eles têm o auxílio da federação sindical AFL-CIO e vários sindicatos, que não estão fazendo nada para alertar, quanto mais mobilizar, os trabalhadores que seriam os principais alvos dos esforços de Trump para derrubar a Constituição dos EUA e impor uma ditadura presidencial.
Os Teamsters [sindicato que
abrange diferentes setores, como transporte e alimentação], a Federação
Americana de Professores, a Associação Nacional da Educação e a maioria dos
sindicatos permaneceram em silêncio sobre o golpe tramado
O presidente da UAW, Rory Gamble, emitiu uma breve declaração observando que o que foi descoberto foi uma "trama muito real para desestabilizar o governo em Michigan e para fomentar uma guerra civil extremista em nosso país". No entanto, ele não propôs que os trabalhadores fizessem nada a respeito e concentrou grande parte do seu comentário em agradecer ao FBI e "nossos homens e mulheres de farda" por terem "salvo nossa democracia".
Historicamente, a luta contra a influência da extrema direita sempre esteve centrada na luta do movimento trabalhista para unir os trabalhadores como classe contra os demagogos fascistas e seus financiadores capitalistas, que tentam enfraquecer e dividir os trabalhadores com sua agitação antissemita, racista e nacionalista. O UAW e outros sindicatos industriais foram estabelecidos na década de 1930 através da luta de trabalhadores com ideias socialistas para desenvolver a consciência de classe e imunizar politicamente os trabalhadores contra o veneno fascista espalhado por aqueles como a Ku Klux Klan (KKK), o padre Coughlin em Michigan e o apoiador nazista Henry Ford.
Mas o que restava do "movimento trabalhista" nos Estados Unidos morreu há muito tempo. O UAW, em particular, nada mais é do que um sindicato corporativista, que teve grande parte dos diretores indiciados por receber subornos das empresas e roubar o dinheiro das contribuições dos trabalhadores. O início do fim foi a subordinação política dos sindicatos ao Partido Democrata e, através dos democratas, ao sistema capitalista. Isto incluiu as perseguições anticomunistas do final dos anos 1940 e 1950, lideradas pelo presidente do UAW, Walter Reuther, e a capitulação ao imperialismo americano, que esteve no centro da fusão da AFL com a CIO em 1955.
Nos anos 1980, com o giro da classe dominante americana para uma política de guerra de classes em resposta à perda de sua posição dominante no mundo, o UAW e outros sindicatos adotaram a perspectiva corporativista de parceria entre capital e trabalho e colaboraram com a derrota de greves, reduções salariais e o fechamento de fábricas e cortes massivos de empregos. Isto foi acompanhado pela promoção do chauvinismo "Compre dos EUA" e campanha racista contra os trabalhadores do Japão e outros países acusando-os de "roubar empregos americanos".
Não é desculpa para os elementos fascistas envolvidos no golpe de Estado de Michigan constatar que a devastação econômica neste estado e em outros centros industriais dos Estados Unidos, supervisionada pelos sindicatos, criou as condições para a extrema direita recrutar membros e conseguir apoio.
Os perfis dos 13 homens que planejavam o golpe revelam que vários eram pequenos empresários, ex-soldados ou funcionários mal pagos que viviam em pequenas cidades e áreas suburbanas na periferia de cidades economicamente devastadas. A maioria passou por privações econômicas e sociais significativas, incluindo a perda de emprego e renda e pressão para pagar dívidas de impostos.
O movimento das milícias em Michigan começou nos anos 1990, quando a desindustrialização, realizada com o conluio do UAW, levou ao fechamento de centenas de fábricas em cidades como Detroit, Flint, Pontiac, Grand Rapids e outras áreas. Entre 1999 e 2009, outros 460.000 empregos fabris foram exterminados em Michigan, de acordo com o Bureau de Estatísticas do Trabalho. O salário médio para um trabalhador de fábrica de Michigan hoje é de 16,03 dólares por hora, um terço a menos que os 24 dólares por hora em moeda corrigida pela inflação que um mesmo trabalhador ganhava em 1972.
No ano passado, a renda em Michigan finalmente superou seus níveis anteriores à Grande Depressão após quase 12 anos, antes do início pandemia, que os fez despencar novamente. Quase 26% dos residentes do estado relataram que as chances de enfrentarem o despejo ou execução da hipoteca nos próximos dois meses é muito ou relativamente provável, de acordo com uma pesquisa semanal do Departamento do Censo dos EUA no final de agosto.
As atividades de grupos
milicianos em Michigan, Pensilvânia e outros estados industriais duramente
atingidos estreitaram-se após o ataque a bomba de abril de 1995
As milícias, porém, ganharam nova vida com a devastação econômica provocada durante os oito anos do governo Obama, que supervisionou a contínua destruição dos empregos e do padrão de vida dos trabalhadores após o resgate de Wall Street em 2008-2009.
A vitória de Trump em Michigan, Pensilvânia e Wisconsin em 2016 não foi produto do "racismo" dos trabalhadores brancos, como a campanha de Hillary Clinton e outros apologistas do Partido Democrata afirmaram. Ao invés disso, foi uma migração de um setor de eleitores da classe trabalhadora, incluindo muitos que haviam votado em Obama, para Trump ou outros partidos, ou à abstenção, levando à derrota de Clinton, que não fez segredo de seu desprezo pela classe trabalhadora.
As alegações do presidente da AFL-CIO Trumka de que o perigo da violência fascista desaparecerá milagrosamente se Biden conseguir ingressar na Casa Branca são evidentemente falsas. Ao contrário, se Biden ganhar as eleições e for amparado por setores dos militares, como esperam os democratas, ele estará comprometido com um implacável programa de austeridade para pagar o resgate de 4 trilhões de dólares aprovado pela Lei CARES e com um militarismo mais agressivo. Isto só vai alimentar o crescimento dos fascistas.
Tendo criado as condições para a ascensão da extrema-direita através de suas políticas corporativistas e nacionalistas e sua subordinação da classe trabalhadora ao Partido Democrata, os sindicatos não estão fazendo nada para mobilizar os trabalhadores contra a política homicida da elite dominante em resposta à pandemia. As lutas dos trabalhadores que irromperam – inclusive as greves dos operários automotivos em março durante o primeiro pico da pandemia – foram organizadas independentemente e em oposição a estas organizações anti-operárias.
Os grupos fascistas por trás da trama de Michigan ainda não têm um apoio de massas. Entretanto, o caos econômico causado pela pandemia – desemprego em massa, despejos, falência e fechamento de pequenos negócios e o consumo das poupanças – pode alimentar o crescimento da extrema-direita se não for combatido com um movimento da classe trabalhadora, mobilizando atrás dela setores mais amplos da classe média.
Isto exige a formação de comitês de base em fábricas, locais de trabalho e bairros, independentes dos sindicatos e de ambos os partidos controlados pelo capital, para unificar os trabalhadores de todas as raças e etnias em defesa do emprego, saúde, segurança e direitos sociais e democráticos.
Medidas para combater a pandemia devem ser combinadas com políticas para garantir a subsistência e os interesses de todos aqueles afetados por ela. Isto só pode ser feito através de uma luta contra o capitalismo e uma redistribuição radical da riqueza acumulada pelos bilionários para os trabalhadores que a produzem.
O que aconteceu em Michigan é um aviso. Aconteça o que acontecer nas eleições, a classe dominante está caminhando para formas autoritárias e ditatoriais de governo. A luta contra o perigo do fascismo deve ser travada através da organização da classe trabalhadora em um movimento político contra o capitalismo e pelo socialismo.
Imagem: Na foto de 15 de abril, manifestantes portam armam em frente à sede do governo em Lansing, Michigan. (AP Photo/Paul Sancya File)
*World Socialist Web Site
Publicado originalmente em 12 de outubro de 2020
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