Mercados financeiros em pânico.
Indústria de automóveis parada. Cidades sem trabalho. Aos poucos, pandemia
transtorna normalidade opressora do capitalismo, expõe suas entranhas e mostra:
outras formas de estar no mundo são necessárias
Slavoj Žižek | Outras Palavras | Tradução: Simone
Paz
A disseminação contínua da epidemia
do coronavírus acabou desencadeando, também, certas epidemias de vírus
ideológicos que estavam adormecidos em nossas sociedades: fake news,
teorias da conspiração paranoicas e explosões de racismo.
A quarentena, devidamente
fundamentada em evidências médicas, encontrou um eco na pressão ideológica por
estabelecer fronteiras estritas e isolar os inimigos que representam uma ameaça
à nossa identidade.
Mas, talvez, outro vírus muito
mais benéfico também se espalhe e, se tivermos sorte, irá nos infectar: o vírus
do pensar em uma sociedade alternativa, uma sociedade para além dos
Estados-nação, uma sociedade que se atualiza nas formas de solidariedade e
cooperação global.
Especula-se que o coronavírus
pode levar à queda do regime comunista chinês, do mesmo jeito que a catástrofe
de Chernobyl foi a gota d’água que levou ao fim o comunismo soviético (como o
próprio Gorbachev admitiu). Mas existe um paradoxo nesta situação: o coronavírus
também nos levará a reinventar o comunismo, com base na confiança nas pessoas e
na ciência.