domingo, 9 de maio de 2021

Oposição na Alemanha de olho em Cabo Delgado

Partidos alemães da oposição apelam ao Governo federal e à UE que se empenhem mais na busca de uma solução duradoura para Cabo Delgado, que tenha em mente os interesses dos mais vulneráveis.

"O Governo da Alemanha tem ficado demasiado calado perante o desastre em Cabo Delgado, e isso é perigoso", avalia Alexander Graf Lambsdorft, deputado ao Bundestag, Parlamento federal alemão, e membro do partido liberal (FDP).

O segundo maior partido da oposição no país, com 80 deputados, acompanha com grande preocupação o escalar da violência no norte de Moçambique e apela à Alemanha e à União Europeia que se envolvam mais e melhor no assunto.

Alexander Graf Lambsdorff, que entre 2004 e 2017 liderou o seu partido no Parlamento Europeu, defende que "o Governo federal alemão tem que tomar medidas concretas". E recorda que "os terroristas avançam a passos largos, porque uma grande parte da sociedade não beneficia das riquezas e dos grandes investimentos na região".

O Executivo moçambicano "deve ser confrontado com esse facto", defende o parlamentar.

Lambsdorff sublinha que "a Alemanha é um dos principais doadores de Moçambique e, assim sendo, cabe ao Governo alemão exigir que o Governo moçambicano cumpra as regras e os princípios a que se obrigou nos acordos que assinou a nível bilateral e multilateral".

Apoio de Portugal não é estratégia de longo prazo

Que princípios são esses, concretamente, que Maputo deve agora respeitar?

"O Governo de Moçambique aceitou, por exemplo, iniciar um processo de descentralização do país. E esse processo tem que ser cumprido", responde o deputado liberal. "É necessário descentralizar o país, garantir uma melhor participação de todos os grupos da sociedade, assim como uma melhor distribuição das riquezas. Só assim se poderá assegurar uma paz duradoura em Moçambique".

Lambsdorff realça: "A Alemanha, em conjunto com os seus parceiros da União Europeia, terá que apoiar ativamente esse processo".

Neste contexto caberia a Portugal, que neste primeiro semestre de 2021 detém a presidência da União Europeia, um papel importante, visto que é membro da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e tem laços históricos, culturais e políticos privilegiados com Moçambique, segundo Alexander Graf Lambsdorff.

"Portugal anunciou uma iniciativa que visa dar formação militar a soldados moçambicanos. Mas isso é apenas um primeiro passo e não constitui uma estratégia consistente e de longo prazo", considera. 

Lambsdorff  defende que "o Governo federal alemão - em conjunto com Portugal - tem que exigir a Moçambique que encete reformas políticas, económicas, sociais e também tem que exigir que deixe de haver no país qualquer tipo de marginalização religiosa".

Berlim acusado de fazer pouco

Sevim Dağdelen, uma dos 69 deputados do partido "Die Linke" (A Esquerda), sucessor do partido Socialista Unitário da extinta Alemanha de Leste comunista, também se mostra preocupada com a situação em Cabo Delgado.

"Moçambique precisa urgentemente de apoio internacional, urge fazer face a uma possível crise alimentar e a uma catástrofe humanitária", afirma a especialista em política externa do terceiro maior partido da oposição da Alemanha.

"Mas Moçambique não precisa de maneira nenhuma tropas vindas da antiga potência colonial ou de países que estão a explorar gás natural junto à costa moçambicana. Com cada soldado ou mercenário que se envia para Cabo Delgado, a situação fica pior!" 

Recorde-se que também o partido ecologista os Verdes observa atentamente a situação em Cabo Delgado, tendo avançado, no início do ano, com um pedido oficial de explicações ao Governo alemão, acusando o Executivo, liderado por Angela Merkel, de "fazer muito pouco para evitar que o conflito em Cabo Delgado alastre."

A última resposta de Berlim

A resposta do Governo alemão, na altura, foi vaga: "O Governo federal-alemão observa a situação humanitária em Cabo Delgado e está em comunicação constante com todas as suas organizações parceiras locais", pode ler-se no documento do Parlamento Federal a que a DW teve acesso.

Os Verdes dispõem de 67 deputados no Bundestag e são o quarto maior partido da oposição. Atualmente lideram os rankings de intenção de votos na maior parte das sondagens na Alemanha e poderão vir a liderar o Governo alemão, depois das eleições gerais de setembro.

Este partido tem uma abordagem muito crítica relativamente à exploração do gás natural e de outros recursos naturais em Cabo Delgado e vê no negócio das indústrias extrativas um dos motivos para o agravamento do conflito.

António Cascais | Deutsche Welle

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